Blog do Mario Magalhaes

Arquivo : maio 2014

‘Trabalho sujo’, por Patrícia Campos Mello
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Mário Magalhães

blog - trabalho sujo

‘Catadora de cocô Sudhira limpa fezes na Índia – Foto de Patrícia Campos Mello/Folhapress

 

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Compartilho uma leitura impressionante.

A reportagem de Patrícia Campos Mello publicada no domingo conta que mais de 1 milhão e 300 mil indianos ainda sobrevivem de coletar excrementos, atividade que na história do Brasil está associada ao trabalho escravo.

A matéria ilustra com carne, suor, humilhação e osso as estatísticas divulgadas em livro pelo economista francês Thomas Piketty, que esmiuçou de modo inédito a desigualdade de renda e riqueza no planeta.

Piketty, brilhante no diagnóstico, fraquinho na receita, mas isso são outros quinhentos.

Eis a ótima reportagem veiculada pela “Folha”:

* * *

Trabalho sujo

Índia ainda tem 1,3 milhão de catadores de excrementos, responsáveis por limpar as fezes de 15 milhões de pessoas

Por Patrícia Campos Mello

Enviada especial a Farrukh Nagar (Índia)

Quando completou 13 anos, a indiana Sudhira, 60, se casou em seu vilarejo. De sua sogra, recebeu uma “herança” em vida: uma cesta de bambu, uma pá, uma vassoura e 60 casas para limpar. A partir daquele momento, o emprego de Sudhira seria limpar o excremento das pessoas do vilarejo, todos os dias. “Da primeira vez que tive de tirar o cocô com a mãos, o cheiro era tão horrível, que eu vomitei”, contou à Folha.

Quarenta e sete anos depois, Sudhira continua limpando excrementos. Acorda às 7h e começa sua ronda. Na primeira casa, vai até o fundo do terreno, onde fica o “banheiro” –um buraco raso no chão, cercado por uma parede baixa de tijolos.

Cheira muito mal. Em meio a uma nuvem de moscas, Sudhira se agacha, retira os excrementos com uma pá, que segura na mão sem luva. Junta um pouco de folhas, terra e cinzas e põe em cima das fezes. Recolhe esse bolo de excrementos com a pá e põe na cesta que leva sobre a cabeça. Às vezes, escorre.

Sudhira recebe 20 rúpias (US$ 0,30) e um pão roti de cada casa. Limpa quatro latrinas por dia e, em outras 10 casas, retira o lixo e os excrementos de animais. Ninguém encosta em Sudhira, porque ela é considerada “poluída”.

Há 1,3 milhão de pessoas na Índia que são “catadores de excrementos” como Sudhira. Elas pertencem a uma casta de intocáveis.

Neste país que é uma potência e já mandou um foguete para Marte, cerca de 600 milhões de pessoas fazem suas necessidades ao ar livre, no mato. Outras 15 milhões usam as chamadas “latrinas secas”, que nada mais são do que buracos no chão usados por toda a família para fazer suas necessidades. São limpos por pessoas da casta dos intocáveis, os dalits. As mulheres são 98% dos catadores de excrementos.

(Leia a íntegra clicando aqui.)


Futebol: pesquisadores lançam livro sobre hooligans e hooliganismo
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Mário Magalhães

blog - hooliganismo

 

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Os professores universitários Bernardo Borges Buarque de Hollanda e Heloisa Helena Baldy dos Reis, organizadores do livro, lançam na próxima terça-feira (27 de maio) “Hooliganismo e Copa de 2014” (editora 7Letras).

A partir das 18h30, o lançamento será na Fundação Getulio Vargas, no Rio, onde o rubro-negro Bernardo é pesquisador do CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil).

Antes, à tarde, haverá duas mesas do evento “Brasil-França: intercâmbios acadêmicos nos estudos do futebol”. A programação pode ser conhecida clicando aqui.

Entrada franca.


Teatro: antes e durante a Copa, peça ‘Nunca nade sozinho’ é encenada no Rio
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Mário Magalhães

blog - nunca nade sozinho

 

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É programa para antes da Copa e durante parte dela: a peça “Nunca nade sozinho” está em cartaz às quartas e quintas-feiras no Rio, no teatro do Centro Cultural Justiça Federal.

Hoje tem, a partir das 19h!

A temporada vai até 26 de junho (não haverá sessão no dia 12, abertura do Mundial).

Ainda não assisti ao espetáculo, mas sei que conta com ao menos dois trunfos: a autoria do dramaturgo canadense Daniel MacIvor e a direção, bem como presença no elenco, de Nadja Turenkko.

Abaixo, o blog reproduz o serviço veiculado no site do centro cultural (aqui).

* * *

Nunca Nade Sozinho / peça

Até onde dois homens rivais são capazes de ir para vencer um embate? Esse é o mote do espetáculo Nunca Nade Sozinho, texto inédito no Brasil do canadense Daniel MacIvor (de In on It, A Primeira Vista e Cine Monstro, todos dirigidos por Enrique Diaz). Indicado ao Prêmio Braskem de Teatro 2014 e após uma temporada de sucesso em Salvador, a peça, que se estrutura em 13 rounds e é mediada por uma juíza, fala de como as relações humanas podem ser belas e destrutivas ao mesmo tempo. E mais: quando a compaixão dá lugar à competição, as consequências podem ser desastrosas. Ao mesclar real e imaginário, a encenação, em curta temporada no CCJF, desloca essa trama para um não-lugar metafórico, investigando uma alternativa à lógica da competição extrema. Semanalmente, após as sessões de quarta-feira, haverá bate-papo com o elenco e convidados.

Texto: Daniel Maclvor

Direção: Nadja Turenkko

Elenco: Ciro Sales, Kadu Veiga e Nadja Turenkko

Até 26/06 (Não haverá espetáculo no dia 12/06)

Quartas e quintas

19h 

R$ 30 e R$15 (meia)

75 min


Na marcação, Pato e Ganso parecem jogador ‘café com leite’ de pelada
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Mário Magalhães

blog - fluminense walter

Deram mole, e Walter marcou dois no São Paulo – Foto Agência Photocamera

 

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Se culpar apenas o arranjo tático ou exclusivamente os erros individuais pelo fiasco desta quarta-feira no Maracanã, o São Paulo perderá a chance de promover uma reviravolta indispensável para não sofrer novas goleadas como a aplicada pelo Fluminense.

Começo pelo, ao menos na aparência, mais simples de observar. Dos cinco gols do time da casa, quatro tiveram a contribuição de falhas pontuais de jogadores do visitante.

Em dois, Rogério Ceni concedeu rebotes camaradas, que poderiam ter sido evitados, segurando a bola ou espalmando mais para o lado.

Noutro, Lucão anotou contra.

O mais impressionante foi a postura de Reinaldo no segundo gol de Walter: em vez de encarar o barrigudo, no momento do chute o lateral virou-se de costas. A atitude de auto-defesa na iminência de uma bolada é humana, assim agimos em peladas e os jovens chegam aos clubes de futebol. Mas deveriam treiná-los. Se tivesse encarado o atacante e caminhado em sua direção, Reinaldo diminuiria a chance da conclusão milimetrada, no canto, que rendeu mais um gol.

Tropeços individuais se resolvem com treino, concentração, determinação, sabedoria e sorte. Problemas táticos podem ser menos complexos.

Não tenho condições de me pronunciar sobre a campanha do tricolor paulista no Campeonato Brasileiro, porque só assisti na íntegra a duas de suas partidas, as mais recentes: a vitória de 2 a 0 sobre o Flamengo, e a derrota de 5 a 2 para o Fluminense, ambos os jogos no Rio.

Muricy propõe um futebol vistoso, com uma linha ofensiva que combina a elegância de Ganso, a velocidade de Oswaldo, o oportunismo de Luís Fabiano e o talento de Pato.

Quando o oponente deixa jogar, como os amigões do Flamengo, maravilha. O São Paulo poderia ter vencido por muito mais.

Se aparece uma equipe bem amarrada, competitiva e repleta de bons jogadores, complica.

Complica porque os quatro titulares mais ofensivos do time do Morumbi têm dificuldades para marcar. Ontem, os volantes Souza e Maicon penaram de solidão, com paupérrima ajuda.

Oswaldo ainda atrapalha um pouco os adversários, e Luís Fabiano é importante nos cruzamentos sobre a área são-paulina, pois cabeceia bem.

Mas Pato e Ganso não marcam, mal cercam quem deveriam marcar. Parecem jogador “café com leite” de partida de crianças, aqueles meninos que, por serem menores, não contam.

O massacre tricolor _o carioca_ no segundo tempo decorreu do fim do excessivo cuidado que o Flu se impusera antes. Como a marcação da equipe de Muricy era débil demais, a de Cristóvão encurralou-a, correndo poucos riscos.

O Fluminense cruzou bolas sobre a área sem que seus laterais e meias sofressem qualquer acosso. Seus meias chutaram de longe com um tempo enorme para dominar a bola, pensar, preparar o petardo e bater. Por melhores que sejam os defensores, o confronto se torna desigual.

Ainda mais que o Flu contava, já no papel, com mais gente no meio: Diguinho, Jean, Wagner e Conca. Além disso, o atacante Sóbis participa muito mais do jogo que os quatro avançados do São Paulo. O Fluminense atropelou na etapa derradeira porque aproveitou a supremacia territorial.

Para escalar três atacantes de ofício (Pato, Fabuloso e Oswaldo) mais um meia ofensivo como Ganso, Muricy precisa de uma participação que foge às características deles _reiterando, sobretudo Pato e Ganso.

Para jogar para a frente, não são necessários atacantes puro sangue _em 92 e 93, Telê (que saudade…) usou só um atacante de profissão, Muller. Os meias Raí e Palhinha jogavam muito no ataque (a posição básica de Raí no sistema era de atacante), mas se empenhavam na marcação.

Como sabe qualquer treinador aprendiz, um bom técnico adapta o sistema (disposição básica dos jogadores em campo) e a tática (organização para atacar e defender) aos jogadores do elenco, e não o contrário.

É estimulante ver que Muricy não quer deixar no banco nenhum dos quatro nomes mais ofensivos, como ontem.

No entanto, para que tal aposta venha a vingar diante de times fortes, os jogadores têm de mudar a postura, entendendo o trabalho de defender como coletivo, e não somente dos coitados que ficam atrás se matando de tanto esforço.

Imagino que Muricy esteja apanhando muito. Pois eu acho que ele hoje combate o bom combate, pelo futebol ofensivo e bonito. Mas, para disputar o título, precisa de uma reviravolta, que pode até nem passar por mudança de escalação, mas de comportamento.

Os problemas do São Paulo não apagam o fundamental de ontem, a sublime atuação coletiva do Flu, que nem teve Fred e Cavallieri.

O que será que o Renato Gaúcho, antecessor de Cristóvão, pensa ao ver o antigo bando sob seu comando transformado em time de verdade?

Como se sentem os jogadores do Flamengo, que no domingo permitiram reverencialmente que Ganso jogasse, ao saber que diante do Flu o antigo parceiro de Neymar mal viu a bola?


Telegrama comprova que Roberto Carlos já apoiou abertamente a censura
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Mário Magalhães

dukebiografias

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“Cumprimento Vossa Excelência por impedir a exibição do filme Je Vous Salue Marie, que não é obra de arte ou expressão cultural que mereça a liberdade de atingir a tradição religiosa de nosso povo e o sentimento cristão da humanidade. Deus abençoe Vossa Excelência. Roberto Carlos Braga.”

O remetente deste telegrama, como informa a assinatura, foi o compositor e cantor Roberto Carlos.

O destinatário, o então presidente da República, José Sarney.

A data, o comecinho de 1986 (o Palácio do Planalto divulgou-o em 7 de fevereiro daquele ano).

O motivo, a decisão do governo, implementada por meio da Divisão de Censura do Departamento de Polícia Federal, de proibir a exibição do filme “Je Vous Salue Marie”, do cineasta franco-suíço Jean-Luc Godard.

O primeiro governo pós-ditadura, ainda impregnado pelos valores autoritários que haviam presidido o país por 21 anos (1964-1985), alegou que o obra de Godard blasfemava contra a Virgem Maria. Formalmente, o Estado era, e ainda é, separado da Igreja.

Contudo, a Maria do filme, personagem contemporânea, engravida mesmo sendo virgem. O dogma não é contestado. Mesmo se fosse, tratava-se de obra de arte que a administração Sarney impediu ser assistida nos cinemas.

Em artigo sobre “Je Vous Salue Marie”, publicado na “Folha de S. Paulo” em 2 de março de 1986, Caetano Veloso mencionou a “burrice de Roberto” e escreveu que “o telegrama de Roberto Carlos a Sarney, congratulando-se com este pelo veto a ‘Je Vous Salue Marie’, envergonha nossa classe”.

Mais Caetano: “o veto é uma violência cultural e uma vergonha política”; “vamos manter uma atitude de repúdio ao veto e de desprezo aos hipócritas e pusilânimes que o apoiam”.

A mensagem de Roberto Carlos 28 anos atrás não constitui fetiche arqueológico. Ela contribuiu para iluminar o presente.

O brilhante artista, o mais popular do Brasil, recorreu com sucesso à Justiça e proibiu a biografia “Roberto Carlos em detalhes”, de autoria do jornalista, historiador e professor Paulo Cesar de Araújo.

O livro, como sabem aqueles que o leram, é muito simpático ao biografado, de quem o excelente biógrafo é fã confesso.

Desde 2013, com o incremento do debate público acerca da norma legal _artigos 20 e 21 do Código Civil_ que permite impor censura prévia a biografias e outras produções culturais, acadêmicas e jornalísticas, Roberto Carlos oscila nos seus pronunciamentos. Diz que é contra a censura, mas batalha no Supremo Tribunal Federal para manter a legislação como está. O Brasil é a única grande democracia do planeta a autorizar censura prévia a biografias que não sejam chapa-branca.

Paulo Cesar de Araújo acaba de lançar seu relato sobre o imbroglio que resultou na decisão judicial de proibir a circulação da biografia. O novo livro se intitula “O réu e o rei: Minha história com Roberto Carlos, em detalhes”, é editado pela Companhia das Letras e representa um documento histórico sobre um tempo em que o direito à liberdade de expressão ainda sofre golpes.

Hoje, as manifestações públicas de Roberto Carlos sobre um tema caro à democracia e aos cidadãos variam de acordo com a conjuntura e as marés.

O telegrama a Sarney evidencia, sem eufemismos, que o artista considera legítimo e chancela o controle do Estado sobre o acesso dos brasileiros à arte e à cultura. Trocando em miúdos, Roberto Carlos é amigo da censura.


No Brasil e no exterior, Flamengo não pode mais aceitar xepa do futebol
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Mário Magalhães

Quem botava as mãos na cabeça eram os torcedores do Fla – Foto Alexandre Loureiro/LANCE!Press

 

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Jogadores não são hortaliças, mercado do futebol não é feira, feirante não detém direitos sobre boleiros, nem seus fregueses são clubes.

Mas a metáfora é esta mesmo: se o Flamengo de fato pretende se reforçar, precisa dizer adeus à xepa.

Recomenda-se madrugar para buscar jogadores de qualidade, à altura do manto, e sepultar a política mesquinha e suicida de escolher entre as sobras.

A atual diretoria foi fruto de eleição que por sorte liquidou a lamentável era Patrícia Amorim _a cartola, não a nadadora. Nunca houve, porém, aceno eleitoral de manter elenco capaz de colher vexames como os atuais. Prometeram moralizar o caixa, muito bem, antes tarde do que nunca. Mas jamais falaram que os sacrifícios no futebol seriam tamanhos que adubariam humilhações.

O rubro-negro tem trazido restos do interior paulista _se fossem bons jogadores, alguém duvida que Corinthians, São Paulo, Palmeiras ou Santos se adiantariam? Ou reservas de agremiações menores. Tudo em nome da poupança.

A política tacanha que fere o esporte mais popular do clube combina-se com gestão precária e apostas fracassadas. Até a grama da Gávea e do Ninho do Urubu sabia que Carlos Eduardo, bichado, não era mais o jovem promissor do Grêmio, mas o trouxeram da Rússia. Ele embolsou milhões, marcou um mísero golzinho em quase 50 partidas e não deu pinta de que se constrangesse com o fiasco.

Típico chinelinho, pouco empenho e muita indolência, Carlos Eduardo não é culpado. Culpados por torrar dinheiro do clube são os dirigentes e executivos que o acolheram. Bem como os que trouxeram o decadente André Santos, lateral rechonchudo em cima de quem qualquer perna-de-pau se cria. Ou Elano, ex-ótimo volante ou meia que há muito já deu o que tinha que dar, a despeito de brilhos bissextos.

Ney Franco é um bom técnico. Não pode ser colocada em sua conta a derrota de ontem para o São Paulo no Maracanã. Ney até deu sorte, porque sem ela o Flamengo teria levado um chocolate, muito mais que os 2 a 0. Por causa da  incrível capacidade de Luís Fabiano, Ganso e Pato de desperdiçar chances, a goleada só se insinuou.

Assim como ocorria com Jayme, cuja demissão teve requintes de maldade ofensivos à generosa tradição rubro-negra, Ney necessita de reforços para evitar danos maiores. Seja no Brasil ou no exterior, o clube tem de olhar para qualidade, e não esperar a xepa. Para começar, um lateral-esquerdo, um meia e um atacante.

Coragem também ajudaria o treinador. Para barrar quem até anteontem era jogador de seleção, André Santos. E um goleiro, Felipe, cuja negligência excede os limites toleráveis.

A opção por dois centroavantes contra o tricolor paulista não foi feliz, mas Ney Franco viu-se obrigado a experimentar, para dar um passo adiante _e justificar sua chegada, pois escalar os mesmos que o antecessor desmoralizaria sua contratação. Hernane, enquanto esteve em campo, e Alecsandro juntos não deram certo.

Apesar do elenco fraquinho, há alternativa para André Santos: Éverton, recuado na lateral esquerda.

Para o gol, Paulo Victor.

Para errar menos passes na saída de bola, Cáceres.

Nenhuma revolução, reconheço. Para isso, é preciso ousar nos reforços.


Rio $urreal: copinho de salada de frutas a R$ 19
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Mário Magalhães

blog - salada de frutas

 

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Manhã de sábado, gente saindo pelo ladrão no primeiro dia de funcionamento da Deli Delícia, nova e portentosa delicatéssen em Botafogo. Na São Clemente, passando a Bambina, ponto promissor. A casa tem _quase_ tudo para dar certo.

O problema, para os fregueses, são certos preços pré-Copa e pré-Olimpíada, aberrações que se disseminam no Rio.

Vejam os copinhos de salada de frutas acima. R$ 19,08 a unidade. Se quiser mais barato, há por R$ 18,72 e, pechincha, R$ 17,82. O quilo está na casa dos quarenta reais.

Não há mesa, guardanapo, garçom, pessoal na cozinha para lavar o copo plástico. É pegá-lo, pagá-lo e levá-lo.

É por essas e outras que o pessoal apelidou a moeda daqui de $urreal.

Com o que pediram pela saladinha de frutas, dava para comprar 150 gramas de presunto cru espanhol. Foi o que eu fiz.

A Deli Delícia adota o slogan “É bem melhor viver assim”. Com e$$e apetite, deve ser mesmo.


Caso Pelé-Unicef: making of de uma investigação jornalística
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Mário Magalhães

Ex-jogador acredita que clube paulista seria ideal para moldar base do time de Felipão

Pelé, craque genial. Ou Edson Arantes do Nascimento, empresário – Foto Shin Shikuma/UOL

 

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Eis uma das infinitas definições de jornalismo: serviço público cuja atividade consiste em coletar, processar e difundir informações.

O gênero mais valioso do jornalismo é a reportagem.

Em 2010, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo publicou pela Record “11 gols de placa”, coletânea organizada pelo botafoguense Fernando Molica. O livro reúne reportagens sobre temas e personagens do futebol.

Antes da reprodução de cada uma delas, os autores contaram como trabalharam. O rubro-negro Sérgio Rangel e eu reconstituímos a coleta, o processamento e a difusão de informações sobre o episódio que acabou conhecido como Caso Pelé-Unicef.

O blog reproduz abaixo o making of editado em “11 gols de placa”.

O melhor seria narrar na primeira pessoa do plural, mas essa opção impediria que escrevêssemos qual dos dois fez o quê. Portanto, escolhemos a terceira pessoa. Não fomos originais: Woodward e Bernstein haviam procedido assim em “Todos os homens do presidente”.

* * *

Rascunho premiado

Por Sérgio Rangel e Mário Magalhães

O porteiro não encarou o visitante que ele anunciava pelo interfone, tal a fixação com que olhava a fumaceira em Nova York, mostrada pela TV de parcas polegadas, no canto da mesa da recepção. Era o dia 11 de setembro de 2001, e as duas torres do World Trade Center acabavam de ser abatidas por aviões no mais destruidor ataque terrorista já ousado nos Estados Unidos.

Ainda não se sabia bem o que se passava, e Mário Magalhães lembrou-se de que naquela manhã seu pai desembarcaria no aeroporto novaiorquino John Fitzgerald Kennedy. O repórter afligiu-se, telefonou em busca de notícias, não as obteve, subiu pelo elevador e se sentou na sala para esperar o anfitrião com o qual nunca estivera _o pai, são e salvo, testemunhara ao vivo o impacto do Boeing contra a segunda torre.

O encontro em um bairro da zona sul carioca era para ter ocorrido com outro jornalista e meses antes, quando o homem que Magalhães aguardava pediu ajuda a um conhecido para conversar com alguém da sucursal da Folha de S. Paulo no Rio. Seu interlocutor não teve dúvidas: o nome certo era o repórter de esportes Sérgio Rangel.

O celular de Rangel tocou em Teresópolis, onde ele cobria os primeiros treinos da seleção brasileira sob o comando de um novo técnico, Luiz Felipe Scolari, que enfrentaria em poucas semanas o desafio da Copa América.  No começo de um dia de junho, o time descansava na Granja Comary, e Rangel ainda não deixara a pousada em estilo suíço na qual se hospedava. Ele agradeceu o recado, transmitido por quem oito anos depois ainda optaria pelo anonimato. Em seguida, discou para a pessoa que o procurava.

Apesar da barulheira vinda do quarto vizinho, ocupado por um repórter que trombeteava o boletim radiofônico como se anunciasse o fim dos tempos, Rangel ouviu com nitidez o interlocutor. A dica era quente, em contraste com o frio que se insinuava na serra fluminense às vésperas do inverno: numa contenda trabalhista, figurava uma empresa de Pelé. Talvez houvesse informações de interesse jornalístico acerca do mais notável jogador de futebol da história e ministro dos Esportes de 1995 a 98.

Contudo, a pauta teria de hibernar, alertou o repórter. Ele viajaria à Colômbia para acompanhar o torneio inaugural da era Felipão e só tocaria a investigação na volta. A seleção veio a fracassar, eliminada por boleiros hondurenhos que de tão rechonchudos se assemelhavam mais a massagistas que a atletas.

Sérgio Rangel retornou ao Brasil, embrenhou-se num sem-número de reportagens, e sua fonte apelou a outro jornalista da sucursal da Folha: Mário Magalhães, antigo encarregado do noticiário esportivo que passara a cuidar também de outros temas. Ao saber que o colega fora informado antes, Magalhães ligou para se orientar.

Sobrecarregado de pautas, Rangel tabelou: fariam a matéria juntos, e que Magalhães se encontrasse com o informante _ainda em agosto a dupla assuntou algumas fontes. Não seria a primeira investigação conjunta. Desde outubro de 1997 eles trabalhavam em dobradinha. Enquanto no 11 de setembro o homem discorria sobre o imbróglio judicial, Magalhães constatou que havia mesmo novidades. No entanto, teve a impressão de que o dono da casa não se dera conta do tamanho da notícia.

* * *

Fontes sempre têm motivação.  Do cidadão escrupuloso que zela pelo Estado de Direito ao crápula com propósitos sombrios, elas fornecem informações. A relevância jornalística do que contam se mede pelo interesse público e pela veracidade. O caminho mais curto para a derrota do jornalista é considerar que um “garganta profunda” seja a apuração, e não o que é: o começo, o primeiro passo de investigação autônoma na qual cada versão será checada para compor o relato cujo responsável é o repórter.

Fonte auxilia o trabalho do jornalista, não o substitui. Fontes têm causas diversas; a causa do jornalista é prestar um serviço público, o de informar. O ceticismo em relação a fontes não acarreta danos colaterais.

Rangel e Magalhães jamais escutaram de sua fonte original um só resmungo contra o negócio que seria objeto de suas reportagens. Apenas foram avisados de que, em virtude de um projeto beneficente na Argentina, o empresário Roberto Seabra recorria à Justiça do Trabalho contra a Pelé Sports & Marketing Ltda., companhia cujos sócios eram Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, detentor de 60% das cotas, e Hélio Viana, de 40%.

Os três se associaram para promover um evento em favor da seção argentina do Unicef, o Fundo das Nações Unidas Para a Infância. Em contratos paralelos, o que era altruísmo transfigurou-se em empreitada para gerar lucro privado. O Move the World (Movimente o Mundo) não se realizou, e os US$ 700 mil amealhados com a sua preparação, em nome do amparo às crianças pobres do país de Maradona, foram embolsados por uma firma denominada Pelé Sports & Marketing Inc. Seabra reivindicou uma fatia.

A fonte dos repórteres, cuja identidade não seria revelada, sugeria o foco na ação trabalhista. Para eles, o mais importante seria jogar luz sobre um lance atrevido do trio: invocar solidariedade e, na contramão, permitir que a PS&M Inc. se apropriasse dos recursos.

No Tribunal Regional do Trabalho, a poucas centenas de metros do prédio da sucursal da Folha no Centro do Rio, Rangel e Magalhães tiveram claro o que constituíra o empreendimento que se viria a conhecer como Caso Pelé-Unicef. Eles se dedicaram à análise compulsiva das 1.501 folhas dos sete volumes do processo 1.526, instaurado em 1997 na 18ª Vara.

Na reta derradeira de esquadrinhamento dos autos, aos quais é assegurado acesso público, um funcionário graduado do TRT advertiu Rangel: se pretendiam citar o que leram, haveriam de possuir cópia, já que seria habitual o sumiço de documentos. O autor do alerta foi além: permitiu que os jornalistas não ficassem desprotegidos diante de eventuais desmentidos _e mais do que isso não se pode, nem é preciso explicar.

O processo descortinava a triangulação de empresas cujo resultado foram os US$ 700 mil, todavia estava longe de elucidar toda a trama. Graças às regras de transparência do Estado da Flórida, cujos registros de corporações podem ser consultados na internet, os repórteres descobriram ser falsa a data do principal contrato para a promoção do evento do Unicef: o acordo incluía a Sports Vision Corp., firma americana que só foi fundada meses depois.

Proposital ou não, a troca de data escondia que, já ministro, Pelé continuava a operar no setor em que respondia pelo governo FHC. A teia empresarial exposta pelos papéis contradizia outras versões, e o cotejo de dados documentados com relatos dos envolvidos tomou mais tempo.

* * *

A primeira reportagem saiu em uma página e meia nos 495.725 exemplares do domingo 18 de novembro de 2001. Na capa do caderno Esporte, com o título “Empresa ligada a Pelé arma evento beneficente e fica com o dinheiro”. Dentro, “O amigo das criancinhas”. Em poucas semanas, a repercussão se espalhou por dezenas de países de todos os continentes. O ombudsman do jornal elogiou. A série conquistaria o Prêmio Folha de Reportagem. O episódio com Pelé e seus associados foi um dos pilares de matéria de capa da revista Veja sobre bastidores do futebol.

O que nunca se soube é que o texto principal veiculado era na verdade um rascunho, transmitido à Redação em São Paulo mais de uma semana antes do fechamento.  Por engano, editou-se o esboço, e não a reportagem encaminhada na sexta-feira, antevéspera da circulação. Como o raio não caiu duas vezes no mesmo lugar, restou um sopro de sorte: o “primeiro tratamento” não continha números ou afirmações fake _era jornalisticamente correto. Escapou-se da catástrofe, mas os leitores perderam clareza: muitas passagens estavam longe da síntese que facilitava a compreensão e que acabou por ser impressa somente nas edições dos dias seguintes.

Uma das características das reportagens foi oferecer oportunidades ilimitadas de manifestação a Pelé, Viana e Seabra. Os dois últimos alternaram pronunciamentos lacônicos com o silêncio. O ex-ministro de início negou os fatos, e a seguir escudou-se no argumento de que ignorava o que ocorrera. Atacou o sócio Viana, com quem rompera. Existiam duas empresas Pelé Sports & Marketing: a Ltda., sediada no Rio, e a Inc., no paraíso fiscal das Ilhas Virgens Britânicas. Pelé dizia desconhecer a segunda.

Havia um trunfo particular da cobertura: a maioria dos documentos que a fundamentaram foi anexada ao processo 1.526 pelos três empresários _uma parte os repórteres garimparam com fontes protegidas por sigilo. Nenhum papel foi questionado. Ou seja, todos reconheceram a autenticidade. Como consequência, a cada negativa, sobrevinha uma nova reportagem esclarecendo os fatos, com base em papéis fidedignos.

Com o tempo, tornou-se uma espécie de jogo de gato e rato.

Pelé disse que nunca cobrou por evento beneficente; reportagem exibiu contrato assinado por ele, Viana e Seabra prevendo lucro com o Move the World.

Pelé e Viana contestaram manter relação com a PS&M Inc.; a Folha revelou procuração daquela companhia para a homônima brasileira.

Pelé reafirmou nada saber de negócio em paraíso fiscal; novos furos trouxeram documentos com sua assinatura como “diretor-presidente” da firma das Ilhas Virgens Britânicas, não declarada ao Fisco.

Ele insistiu que não o haviam informado acerca do recebimento dos R$ 700 mil; um memorando evidenciou que o antigo jogador foi avisado sobre o dinheiro por seu advogado de confiança, o mesmo a declarar em carta que a PS&M Inc. pertencia a Pelé.

O ex-ministro especulou que haviam falsificado suas assinaturas; mas elas constavam dos papéis que ele mesmo apresentou à Justiça para se defender no processo trabalhista.

E assim por diante.

Em 2003, Rangel e Magalhães produziram outras matérias sobre negócios ocultos de Pelé e Hélio Viana em paraísos fiscais.

Ainda em 2001, a Receita multou a PS&M Ltda. devido a problemas anteriores à série da Folha. Pelé, Viana e Seabra jamais responderam criminalmente pela operação com o Unicef _a rigor, as reportagens tratavam de ética, não do Código Penal. A despeito da vigorosa repercussão midiática, um segmento do jornalismo não disfarçou o constrangimento em noticiar as jogadas de um herói nacional como Pelé, ainda que ele as tenha desenvolvido quando ocupava a função de ministro de Estado.

No calor da publicação, Pelé prometeu que, se confirmado o depósito de US$ 700 mil em uma empresa sua, ressarciria o Unicef.  À época, Mário Magalhães tinha 37 anos e Sérgio Rangel, 30. Em 2009, os cabelos do primeiro haviam embranquecido e os do segundo, rareado. As transações do Caso Pelé-Unicef haviam sido exaustivamente comprovadas. Até então não se tinha notícia da devolução de um só centavo ao fundo da ONU.


Shana: ‘Não vendo ilusão, dou solução’
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Mário Magalhães

 

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Numa esquina da avenida Corrientes, em Buenos Aires, pertinho do teatro onde Ricardo Darín encena uma peça, a placa alardeia o remédio para todos os males: Shana.

Não é o que os turistas brasileiros mais salientes podem pensar. Shana é uma “vidente natural” que oferece seus  serviços.

Sua especialidade é unir casais, tratar de problemas de trabalho e de família, tudo com “máxima discrição”.

“Não vendo ilusão, dou solução”, promete Shana.


Em Buenos Aires, ‘el jugador del pueblo’
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Mário Magalhães

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Tévez comemora gol pela Juventus – Foto Matteo Bazzi/EFE/EPA

 

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Abril de 2014, Buenos Aires, na doce vida de comparar ojos de bife e bifes de chorizo de restaurantes diversos, Malbecs de Mendoza e Pinot Noirs da Patagônia, doces de leite de procedências ao gosto do freguês, o encanto com a coleção permanente do Malba e o desencanto com a mostra, de fotografias insossas de Mario Testino, instalada naquele museu.

No táxi, contudo, nada variava na conversa com os motoristas, como bem observou uma jovem acompanhante minha. Nem no assunto que eu puxava, mais por cacoete de repórter do que por prazer, nem nas assertivas dos taxistas: todos vituperavam o treinador Alejandro Sabella por ter mantido Carlos Tévez longe da seleção argentina.

Não queriam saber das minhas ponderações sobre a eficiência do quarteto Agüero, Higuaín, Messi e Di Maria. Ou da evidência de que os jogadores não topam o encrenqueiro Tévez.

Os taxistas, todos, argumentavam com a estupenda fase de Carlitos na Juventus e sobretudo com a sua personalidade, a cara dos argentinos, pelo menos dos mais pobres. “El jugador del pueblo”, bradou um motorista, empregando o título de um documentário sobre o antigo atacante corintiano.

Como todo mundo sabe, Tévez nasceu num bairro pobre e barra pesada da periferia de Buenos Aires, o Fuerte Apache. Comeu o pão que o diabo amassou e triunfou no futebol, sem dar as costas àqueles com quem conviveu na época de vacas magras.

Em contraste com o temperamento forte de Tévez, Messi é tímido e partiu para a Catalunha antes da adolescência. Os dois não se bicam, mas a rejeição a Tévez é generalizada na seleção, como informa (em castelhano) reportagem de Cristian Grosso (leia aqui).

Na escala social, eu chutaria que os taxistas com quem conversei formam na classe média-baixa ou média-média portenha. É impressionante, e traduz o caráter marcante dos argentinos, que prefiram um jogador inferior, mas identificado com seu povo, a craques incontestáveis, porém com outras trajetórias e perfis.

Não estavam, meus interlocutores, entusiasmados com a Copa (com a proximidade da estreia, talvez o sentimento mude). Mostravam-se bronqueados, pois para eles Tévez não é um pavio-curto que atrapalha times, e sim o artilheiro que orgulha seu povo _e não jogará o Mundial.