Blog do Mario Magalhaes

Sabáticas: Falando sozinho
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Mário Magalhães

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Robert Durst: ''Matei todos eles, é claro'' – Foto Edmund D. Fountain/The New York Times/2015

 

Li numa entrevista um psicólogo bambambã identificando como muito bem resolvidas pessoas que falam sozinhas. Conheço uma que adorou o diagnóstico. Bom para elas, mas sei não. Se for por aí, estou longe de me resolver.

É o que também acha a gurizada do prédio de um conhecido meu, tipo excêntrico que anda no elevador em conversas exaltadas. Com o espelho, ignorando os vizinhos. Sai pela calçada, volta para casa, sempre confabulando com ele mesmo. As crianças o têm na conta de maluco.

Deve ter suas vantagens. Jamais encontra um argumento contrário, alguém para lhe dizer que está por fora. Ou encontra? Vai que se contrapõe: “Sabe de nada, inocente!” Daí principia a discussão. Está explicado o tom passional do meu conhecido. Ele bate boca com sua sombra.

Quem se deu mal foi Robert Durst, protagonista de um documentário da HBO nos Estados Unidos. O milionário havia escapado da suspeita de três homicídios: de sua mulher, desaparecida em 1982 e dada como morta; da senhora, abatida com um tiro na cabeça, que deporia na Justiça sobre o sumiço da mulher de Durst; e, alegando legítima defesa para escapar da condenação, de um homem cujo cadáver acabou esquartejado.

Ferrou-se por falar sozinho. No derradeiro episódio da série The Jinx, ele deu uma longa entrevista e correu ao banheiro. Pareceu esquecer que estava com um microfone sem fio. E o microfone estava ligado. Em meio a digressões solitárias durante o xixi, Durst esclareceu: “Que diabos eu fiz? Matei todos eles, é claro”. Foi em cana, encurralado por muitas provas.

Outro perigo é falar dormindo. No décimo sono, uma amiga caprichou no dengo: “Que loiro lindo”, sussurrou. Seu marido, de cabelos mais pretos que o velho papel-carbono, estava acordado e surtou. Ela contou que sonhava com um sobrinho bebê.

Se o peixe morre pela boca, melhor ficar de boca fechada.

(Publicado originalmente na revista Azul Magazine, maio de 2015)

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Crivella brinca de ‘pós-verdade’
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Mário Magalhães

Marcelo Crivella canta no programa do Silvio Santos, em 2015 – Reprodução/Folhapress

Marcelo Crivella canta no programa do Silvio Santos, em 2015 – Reprodução/Folhapress

 

A história é tão curta quanto eloquente.

A Companhia de Engenharia de Tráfego do Rio de Janeiro tinha novo titular, anunciado pelo governo Marcelo Crivella: Paulo Cezar Ribeiro, professor da Coppe/UFRJ.

Ao lado do vice-prefeito e secretário de Transportes, Fernando Mac Dowell, o professor deu entrevistas, foi à TV contar seus planos.

Na quarta-feira, o ''Diário Oficial'' do município, em vez de nomear Paulo Cezar Ribeiro presidente da CET-Rio, nomeou Virgínia Maria Salerno Soares.

Ribeiro, que não é leitor do ''Diário Oficial'', soube da novidade por um repórter do jornal ''O Globo''.

Crivella explicou anteontem, compungido, o motivo da mudança: ''Paulo Cezar, infelizmente, foi diagnosticado com uma doença grave. Ele pediu para se afastar e ser tratado''.

Ribeiro tomou um susto. Não havia sido diagnosticado com doença grave, muito menos pedira para se afastar.

Ontem, o prefeito emendou, dizendo que confundira Ribeiro com uma servidora da Rioluz. Atacou um ''repórter, talvez imaturo'', que o indagara sobre a Cet-Rio. ''Eu pedi a esse repórter, porque era uma questão pessoal, de foro íntimo, de caso grave, que ele não mencionasse. Mas, infelizmente, isso foi vencido por ambições pessoais que eu acho que não constroem o relacionamento nosso com a imprensa. A gente, quando fala de doenças graves, essas coisas são particulares.''

Como comprova o vídeo da quarta-feira, quem falou em doença grave, diante de numerosos repórteres, foi Crivella.

''Não houve mentira nenhuma. Houve uma pequena confusão'', afirmou mais tarde o prefeito.

Pelo visto, ele parece brincar de ''pós-verdade''. Uma coisa é o discurso, outra é o fato.

Sobre a troca, uma das versões informa que haveria problema para Ribeiro manter na CET-Rio o salário que recebe na universidade.

Fato: na terça-feira, a CET-Rio, onde Ribeiro já estava trabalhando informalmente, multou mais de 90 ônibus em torno da Central do Brasil.

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Trump, o desafio aos espiões e a lição do governo Collor
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Mário Magalhães

Fernando Collor, ainda presidente, em 1992 – Foto Lula Marques/Folhapress

Fernando Collor, ainda presidente, em 1992 – Foto Lula Marques/Folhapress

 

Os territórios e as circunstâncias são diferentes, mas há alguma semelhança entre o que acontece hoje nos Estados Unidos e o Brasil da virada da década de 1980 para a de 1990.

Desde a campanha o presidente eleito Donald Trump vem espinafrando as agências de informações do seu país.

Criticou-as pela conclusão de que a correspondência eletrônica do comitê de Hillary Clinton havia sido raqueada pela Rússia _anteontem voltou atrás e admitiu que tal espionagem ocorreu.

Malhou-as por terem avisado Barack Obama e o próprio Trump sobre um dossiê focado no presidente eleito.

Trump as enxovalha e, querendo ou não, provoca-as.

Voltemos no tempo, e ao Brasil.

Antes de vencer a eleição presidencial de 1989, Fernando Collor de Mello tentou conversar com o ministro-chefe do Serviço Nacional de Informações, Ivan de Souza Mendes. O general recusou-se a recebê-lo.

Collor queria tratar de documentos do SNI que haviam aparecido na imprensa e nos quais o ainda governador de Alagoas era descrito em termos pejorativos.

Humilhado, não deixou por menos: em seu primeiro dia no Planalto, março de 1990, acabou com o SNI.

O monstrengo criado pela ditadura em 1964 chegava ao fim com uma canetada, embora a estrutura e os conceitos que o embalaram por décadas permanecessem.

Sobreviveu, sobretudo, o pessoal, agora lotado no sucessor do ''serviço'': o Departamento de Inteligência da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

Seu propósito, ao menos no papel, seria coletar e analisar informações.

A extinção do SNI prejudicou os interesses de muitos dos seus servidores, em particular militares.

Funcionários ou não do Departamento de Inteligência, eles foram a campo por conta própria para ''coletar'' um tipo específico de informações, as daninhas ao governo Collor. Com o olhar mais atento para falcatruas.

Arapongas foram fontes sigilosas importantes de jornalistas até a agonia de Collor e, em dezembro de 1992, seu justo impeachment.

Eles se vingavam do presidente que os atacou. A importância desses agentes no desfecho da administração Collor está por ser contada plenamente.

Do ponto de vista legal, o controle sobre as agências de informações e inteligência são muito mais severos nos EUA do que no Brasil.

Mas CIA, NSA e outras siglas têm vasto histórico de burla às leis.

Trump pode ter problemas se os espiões, provocados e desafiados, resolverem ir à forra.

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O papelão dos repórteres diante de Trump
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Mário Magalhães

Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos - Foto Seth Wenig/AP

Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos – Foto Seth Wenig/AP

Na primeira entrevista coletiva na condição de presidente eleito, Donald Trump foi o de sempre. Quer dizer, agora com mais poder. Que será ainda maior a partir do dia 20, quando tomará posse.

Trump avacalhou as agências de inteligência; comemorou a construção de fábricas de automóveis nos Estados Unidos, e não no México; confirmou que erguerá um muro entre os dois países; reconheceu que os EUA são raqueados por todo mundo, inclusive Rússia e China; mencionou informações sobre a campanha eleitoral de Hillary Clinton obtidas por interceptação ilegal de correspondência eletrônica; negou conflito de interesses no modelo que definiu para tocar seus negócios particulares enquanto ocupar a Casa Branca; e reiterou que certas notícias divulgadas sobre ele são típicas da Alemanha nazista.

Escolheu a dedo, o indicador direito ou esquerdo, os repórteres que poderiam lhe fazer perguntas. Houve repórter que, em tom submisso, agradeceu por ter sido um dos eleitos.

Antes da entrevista, o futuro presidente fez uma preleção sobre jornalismo e liberdade de imprensa. Em seguida ironizou repórter, interrompeu pergunta.

Muito mais grave, proibiu que o repórter da CNN lhe dirigisse uma pergunta.

Trump acusou a emissora de veicular mentiras, por ter informado a existência de um alegado dossiê sobre Trump. A CNN silenciou sobre o conteúdo do suposto dossiê. Ao contrário do BuzzFeed, que publicou a tal papelada na íntegra.

''Você não'', disse Trump agressivamente a Jim Acosta, o repórter da CNN que tentava perguntar. ''Sua empresa é terrível''. Emendou: ''Vocês são notícias falsas''.

É prerrogativa de Donald Trump e de qualquer pessoa achar o que bem quiser da CNN, do BuzzFeed e do jornalismo em geral. Quando mais uma sociedade pensa, escrutina e discute o jornalismo, mais chances têm a sociedade e o jornalismo de serem melhores.

O jornalismo é um serviço público cuja essência é a difusão de informações. Mesmo se exercido por companhias privadas, é _ou deve ser_ um serviço público. Informar é contraditório com propagandear. A principal deficiência do jornalismo contemporâneo é o sufocamento da informação pela propaganda.

Nenhuma autoridade com mandato conferido pelos cidadãos tem o direito de escolher repórter e pergunta conforme as convicções e idiossincrasias do poder.

Até aí, Trump foi Trump.

Lamentável foi observar que os repórteres presentes, ao menos os que perguntaram depois da atitude contra o jornalista da CNN, continuaram como se nada tivesse acontecido.

Aceitaram como cordeiros que Trump proibisse pergunta.

Não se trata de solidariedade corporativa com Acosta, mas de consciência democrática e jornalística sobre uma aberração como a imposta por Trump.

O problema não foram as perguntas, todas jornalisticamente legítimas e a maioria com espírito crítico _ao contrário do que se vê em determinada bajulação cotidiana a Michel Temer.

Mas o papelão de submeter-se a um capricho antidemocrático.

Os repórteres participaram da coletiva representando empresas privadas e públicas. O vexame foi da imprensa.

Não interessa a opinião de cada um sobre Trump. A ideia vale para qualquer situação e qualquer político. Depois do veto do presidente eleito, os repórteres só deveriam perguntar depois de o jornalista da CNN fazer a sua pergunta.

Em 1999, o repórter Luiz Maklouf Carvalho foi convidado pelo programa ''Roda Viva'' para ser um dos entrevistadores de Luiz Inácio Lula da Silva. O futuro presidente barrou a presença de Maklouf. O ''Roda Viva'' e os demais entrevistadores aceitaram. Se eu fosse um deles, teria ido embora na hora _se soubesse antes, não teria comparecido. Quando entrevistado escala entrevistador, o espírito crítico cede lugar à camaradagem, e o jornalismo se descaracteriza.

Ontem, pior que Trump, foram os repórteres.

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Palavras malditas (21): inauguração
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Mário Magalhães

Máquina de escrever de meados dos anos 1960 – Reprodução “The New York Times''

 

Alguém se lembra da inauguração do Temer, da Dilma, do Lula, do FHC, do Itamar, do Collor, do Sarney?

Não digo inaugurar uma escola, uma estrada ou um hospital, mas tomar posse.

Em linguagem de gente, presidente toma posse, assume o cargo. Até os marechais Castello Branco e Costa e Silva tomaram posse, sabe-se bem como.

De quatro em quatro anos, falam em inauguração do presidente. O dos Estados Unidos.

O pessoal traduz sem cerimônia a palavra inglesa ''inauguration'' como inauguração. E tasca que a inauguração do Trump será no dia 20 de janeiro.

É claro como esta terça-feira ensolarada que tal tradução literal é um despropósito _como o Trump, cuja posse está próxima.

O que ele vai inaugurar (estabelecer) é um tempo ainda mais bicudo.

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Temer vai ao funeral de Mário Soares, mas faltou ao velório de dom Paulo
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Mário Magalhães

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Quando São Paulo está mais longe do que Lisboa – Foto Ueslei Marcelino/Reuters

 

Michel Temer chegou de madrugada a Lisboa, onde assistirá ao funeral de Mário Soares.

Muito justo, pelo tamanho histórico do estadista português e por suas relações calorosas com o Brasil.

Mas Temer faltou em dezembro ao velório de dom Paulo Evaristo Arns.

A despedida ao frade franciscano que se tornou cardeal foi em São Paulo.

Não se trata de comparar Mário Soares e dom Paulo.

E sim de sublinhar a desfaçatez de um ocupante da Presidência ao desprezar a homenagem a um brasileiro, como o grande português, também gigante das batalhas pela democracia.

O noticiário informou que Temer teve medo de ser hostilizado na catedral da Sé.

Outros figurões da República, de quase todos os matizes políticos, podem ter tido medo, mas não deixaram de comparecer.

Poucas vezes um presidente teve tanto pavor da praça pública, mesmo no tempo em que o cruzeiro era a moeda.

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Cacete de meio
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Mário Magalhães

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Pão francês ou, para os gaúchos, cacetinho – Foto Eduardo Knapp/Folhapress

 

Um monte de marmanjos desembarcou do avião, pegou as malas e caminhou para os micro-ônibus no aeroporto da cidade equatoriana de Cuenca. Iríamos para o hotel, às vésperas da estreia da seleção na Copa América de 1993. O jornalismo esportivo era um mundo ainda mais masculino do que hoje. Um repórter não entendeu a orientação e indagou pelo transporte. É só entrar na buseta, esclareceram.

Daí em diante, foram semanas de trocadilhos com o tamanho, a temperatura e o conforto do veículo cujo nome em castelhano se pronuncia com o som de cê no lugar de esse. Cada um mais infame que o outro. Como numa turma de colegiais em excursão.

Esse tipo de brincadeira ocorre _ou ocorria_ em viagens a outros países. Nos Estados Unidos, pergunta-se pelo dia de pagamento (payday) como quem confessa um pum. Na Alemanha, elogia-se o vigor da vaca (kuh). Na França, tentando conter o riso, anuncia-se a partida para um encontro (rendez-vous, que se fala “randevu”) e se louva o formoso pescoço (cou, com ó mudo) da Mona Lisa.

Para muita gente, são besteirolas insossas, pueris e preconceituosas. Mas que divertem alguns. Como brasileiros em Portugal, onde se pode chamar um garoto de puto sem contrariá-lo (pois a palavra significa garoto), camisa de jogador de futebol é camisola, e punheta de bacalhau dá água na boca.

Constrangedor é tropeçar na ignorância. Como a minha, quase três décadas atrás, mal chegado a Lisboa. Pedi um durex no escritório, e a Adelina me olhou com uma cara estranha. Insisti, e ela olhou com a cara muito mais estranha. Até que uma colega me socorreu: durex em Portugal é marca de camisinha.

Pior foi a moça que nos anos 1960 trocou a região da campanha do Rio Grande do Sul pelo posto 6 de Copacabana. Ela chegou à padaria carioca, abriu um sorriso e encheu a boca: “Um cacete de meio, por favor!”

O cabra no balcão se assombrou, e a (no futuro) minha mãe repetiu com gosto, enfatizando o “de meio”. Perante o homem atônito, a gaúcha apontou para uma bisnaga, que na terra dela atendia pela alcunha de cacete de meio (quilo).

A mãe aprendeu a lição e nunca pediu no Rio pães franceses nos termos em que se acostumara: cacetinhos.

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Sabáticas: Filme de verão
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Mário Magalhães

O cartaz, com Cláudia Magno e André de Biase – Reprodução clicRBS

O cartaz, com Cláudia Magno e André de Biase – Reprodução clicRBS

 

O filme tem o tempo de uma ou duas gerações: o carro da mocinha era um Fiat 147, aquele de câmbio duro, tinindo de novo; o pessoal entornava em canecas os garrafões do vinho deplorável que agora não produzem mais; assoviava-se Mania de Você, sucesso da Rita Lee lançado dois anos antes; bombava o rock’n’roll Perdidos na Selva, com o grupo Gang 90 e as Absurdettes.

Não seria surpresa se Menino do Rio, revisto hoje, se cobrisse do pó da velha época e se ressentisse do mofo das coisas antigas. Qual nada, como confirmei ao rever a obra de 1981. Dirigido por Antônio Calmon, o filme mantém o frescor.

Cativante, oferece a ilusão de que a ampulheta congelou e os cabelos do André de Biase, intérprete do protagonista Valente, não escassearam. E de que a Cláudia Magno, que vive Patrícia, paixão de Valente, não morreu em 1994, aos 35 anos.

Para quem no começo da década de 80 estivesse em missão à Lua ou tenha desembarcado mais tarde na Terra, eu lembro: Menino do Rio conta a história de amigos surfistas. Levou para o cinema pranchas, camisas floridas, água de coco, asa-delta e suco de mamão com cenoura. Ao assisti-lo, permanecem ainda hoje o gosto de sal na pele e o cheiro da maresia carioca.

Menino do Rio se tornou tão popular que o meu amigo Elmo, loiro e cabeludo como o Valente, passou a ser chamado pelo nome do personagem. Despretensioso feito tantos clássicos, eternizou-se como um deles. Um diálogo expressa a ingenuidade típica de filmes de verão, embora nesse roteiro a estação fosse permanente: “Não me chame de chuchu que eu não sou legume”.

Como todo clássico, Menino do Rio deixou heranças nos corações e na cultura, perenes como tatuagem de dragão no braço _entre elas, a canção-hino de juventude De Repente, Califórnia, parceria do Lulu Santos com o Nelson Motta (“Garota, eu vou pra Califórnia, viver a vida sobre as ondas…”).

Se no cinema americano nunca houve uma mulher como Gilda, as telas brasileiras talvez jamais tenham exibido atriz tão bonita quanto a Cláudia Magno.

O título do filme foi inspirado pela música homônima do Caetano Veloso, que homenageia um surfista de carne e osso, o Petit. Anos depois, o André de Biase brilharia no seriado televisivo Armação Ilimitada. Mas aí já é outra grande história.

(Publicado originalmente na revista Azul Magazine, fevereiro de 2014)

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História: Prefeito que entregou cidade a Deus atuou no DOI da ditadura
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Mário Magalhães

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O prefeito e coronel Josias Quintal – Foto reprodução YouTube

 

Um dos prefeitos que entregaram a Deus o futuro de suas cidades, Josias Quintal tem história.

Reeleito para governar Santo Antônio de Pádua (RJ), ele editou nesta semana o primeiro decreto do segundo mandato: ''Fica entregue a DEUS o destino do Governo deste Município no período de 1º de janeiro de 2017 a 31 de dezembro de 2020''. Não se esqueceu de revogar as disposições em contrário.

Quintal é coronel reformado da Polícia Militar. Foi secretário estadual de Segurança do Rio em dois períodos, nas administrações Rosinha e Anthony Garotinho.

Na década de 1970, oficial da PM, o hoje prefeito serviu numa das unidades do Destacamento de Operações de Informações espalhadas pelo país.

O DOI era o mais violento órgão de repressão política da ditadura que vigorou de 1964 a 1985.

Seus agentes sequestravam, torturavam, matavam e desapareciam com os corpos de opositores, ferindo até a legislação da ditadura.

Controlado pelo Exército, o DOI também agrupava agentes de outras corporações, como a PM.

Quando seu passado no DOI foi descoberto, o coronel confirmou-o, mas disse que jamais torturara. Contou que era analista de informações.

O Grupo Tortura Nunca Mais denunciou-o numa relação de torturadores. Quintal voltou a negar participação em atos violentos contra presos.

O tempo passou, e o coronel fez carreira política depois do fim da ditadura.

No decreto do dia 1º, Josias Quintal não esclareceu se os eleitores devem se queixar, em caso de frustração, ao prefeito ou a alguma entidade divina.

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O país dos acidentes
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Mário Magalhães

Por Benett, hoje na ''Folha''

 

A empresa que cuida _cuida?_ do Complexo Penitenciário Anísio Jobim se chama Umanizzare, humanizar em italiano.

A organização criminosa que naquele presídio amazonense chacinou 56 detentos se intitula Família do Norte. Isso mesmo, família. Deveria também se italianizar, no estilo mafioso: famiglia.

A tal família proclama em documento o propósito de ''busca pela paz''. Enquanto isso, decapita e esquarteja.

''Não tinha nenhum santo'' entre os mortos, disse o governador, crente que lhe conferiram poderes de canonização.

Outro governador, com o Estado quebrado, foi buscar o filho com o helicóptero bancado pelos cidadãos. ''Nada ilegal ou irregular'', alegou. E imoral?

Os governos e seus vassalos tratam o arrocho como ajuste.

Roubalheira é malfeito.

Ditadura, regime autoritário.

Tortura virou maus-tratos ou, mais cínico, método não ortodoxo de interrogatório.

Covardia contra os mais fracos é aclamada como coragem.

Promoveram perna-de-pau a jogador limitado.

Feio é simpático.

Canastrão, ator correto.

Massacre? Não: confronto.

Assassinato movido a ódio é amenizado como crime passional.

Bomba que pode ferir e matar é apresentada como de efeito moral.

Privatização é concessão.

Falta d'água, crise hídrica.

Para o presidente, ministra mulher é ''representante do mundo feminino''.

Ele bravateia ''coragem na ação'', mas ficou com medo de ir ao velório de dom Paulo.

Em abril de 2016, dissera, sem corar: ''Sabem todos que há mais de um mês eu me recolhi exata e precisamente para não aparentar que eu estaria cometendo algum ato, praticando algum gesto com vistas a ocupar o lugar da senhora presidente da República''.

Agora, refere-se à carnificina como ''acidente pavoroso que ocorreu no presídio de Manaus''.

De acidente em acidente, acabam de matar mais de 30 presos em Roraima.

A declaração de Michel Temer não foi somente infeliz. Foi asquerosa.

De acordo com o ''Michaelis'', acidente significa ''o que é casual, fortuito, imprevisto''.

Temer é um acidente.

Terra dos eufemismos e das patacoadas, o Brasil se transformou no país dos acidentes sinistros.

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