Blog do Mario Magalhaes

Arquivo : julho 2015

51 anos após última libertação, Marighella é nome de conjunto residencial
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Mário Magalhães

Marighella no dia em que deixou a prisão, 31 de julho de 1964 - Foto Brás Bezerra/JB

31 de julho de 1964: Marighella sai da prisão e denuncia brutalidade policial – Foto Brás Bezerra/JB

31 de julho de 2015: Marighella e Carlos Alberto Soares de Freitas dão nome a conjuntos residenciais

31 de julho de 2015: Marighella e companheiro dão nome a conjuntos habitacionais – Foto divulgação

 

Passeemos pela história.

No dia 31 de julho de 1964, o revolucionário baiano Carlos Marighella foi solto no Rio depois de a Justiça conceder habeas corpus pedido pelo advogado Sobral Pinto. Foi a última libertação do ex-deputado constituinte, que já havia conhecido a alegria de se despedir do cárcere em 1932, 1937 e 1945. Nunca mais iria em cana. Em 4 de novembro de 1969, desarmado, foi morto a tiros por agentes da ditadura que poderiam, se quisessem, prendê-lo.

Cinquenta e um anos mais tarde, neste 31 de julho de 2015, Marighella tornou-se nome de um conjunto residencial em Maricá (RJ), iniciativa do programa Minha Casa, Minha Vida. Foram inaugurados os residenciais Carlos Marighella e Carlos Alberto Soares de Freitas. Somam 2.932 unidades habitacionais. Também guerrilheiro, Carlos Alberto foi assassinado pela ditadura e seu corpo nunca foi entregue à família. Há um ótimo livro sobre ele, de autoria de Cristina Chacel, “Seu amigo esteve aqui” (Zahar).

Antes da sua derradeira saída da prisão, Marighella tinha sido baleado por tiras da polícia política, num cinema carioca repleto de crianças. Naquele fim da tarde de 9 de maio de 1964, o cinquentão resistiu, lutou capoeira, jorrou sangue, quase morreu. Ao deixar o prédio do Dops em julho, fez um périplo por jornais, como documenta a foto lá no alto. Denunciou a brutalidade policial que colocou crianças em risco e por pouco não tirou a vida dele. Em seguida, passou para a clandestinidade.

Na cerimônia de hoje em Maricá, a presidente Dilma Rousseff se referiu a Marighella como “um grande lutador, um grande guerreiro”. O então presidente Lula afirmou em 2008 que as novas gerações precisam conhecer o guerrilheiro que incendiou o mundo: “Marighella não morreu por ser bandido. Morreu porque acreditava numa causa”. Em 1996, um colegiado instituído no governo Fernando Henrique Cardoso _a Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos_ concluiu que a polícia poderia ter rendido Marighella em 1969, sem matá-lo.

Esquinas do tempo: em 1947, o deputado Marighella havia batalhado na Câmara, assim contei, “pelo direito de seiscentas famílias permanecerem no terreno ocupado na localidade soteropolitana do Corta-Braço _o governo declarou a área de utilidade pública, indenizou o proprietário e manteve os moradores”. Agora, batiza moradias que representam mais conforto para milhares de brasileiros, ainda que faltem acabamentos e estrutura que, tomara, logo virão.

Anos depois da morte de Marighella, o escritor Jorge Amado disse que havia uma “maldição do silêncio” contra seu amigo.

Aos trancos e barrancos, vai ficando para trás o obscurantismo maldito de eliminar personagens da história _gostemos ou não deles e de quem lhes presta homenagem.

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PMs do Rio treinavam antiguerrilha contra ‘Alozirb’, ‘Brizola’ ao contrário
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Mário Magalhães

Leonel de Moura Brizola, depois do exílio – Foto reprodução blog do Memorial do RS

 

Em 1978, o engenheiro Leonel de Moura Brizola, ex-governador do Rio Grande do Sul e deputado federal cassado em 1964, amargava o exílio. Perseguido pela ditadura nascente, deixara o país em seguida ao golpe de Estado contra seu cunhado João Goulart. Regressaria em 1979, ao abrigo da anistia. Em 1982 e 1990, elegeu-se governador do Rio de Janeiro. Entre um e outro triunfo, foi um dos líderes da Campanha das Diretas, em 1984, e quase passou ao segundo turno no pleito presidencial de 1989. Morreu em 2004.

Com o assassinato de Carlos Marighella em 1969, a ditadura abatera o guerrilheiro que o governo qualificara como “inimigo público número 1”. Ao matar o capitão Carlos Lamarca, em 1971, as Forças Armadas eliminaram o revolucionário que, devido à origem na caserna, mais odiavam. Em 1978, ninguém era alvo de tanto ódio dos partidários da ditadura quanto Brizola.

Entre outras batalhas do gaúcho, ele comandara a resistência vitoriosa contra os golpistas que tentaram rasgar a Constituição em 1961. Propôs ao presidente Jango, sem sucesso, ir de novo à luta em 1964. Nos anos seguintes, até 1967, incentivou, do Uruguai, guerrilhas contra a ditadura. Desistiu da luta armada, manteve a militância oposicionista e acabou indo morar nos Estados Unidos.

No mesmo 1978, quando a anistia se aproximava, o jovem Ubiratan Angelo, de 21 anos, fazia treinamento antiguerrilha num curso da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. O futuro coronel Ubiratan seria o comandante-geral da PM de janeiro de 2007 a janeiro de 2008. Hoje na reserva, é o coordenador de Segurança Humana do Viva Rio.

O treinamento se chamava estágio básico de guerrilha e contraguerrilha. Os policiais aprendiam sobrevivência na selva, patrulha, incursão. No teatro de operações, encenavam o combate a uma força guerrilheira empenhada na tomada do poder.

Quem era o líder dos guerrilheiros fake?

“O general Alozirb”, contou-me o coronel Ubiratan hoje de manhã.

E o que é Alozirb? “Brizola ao contrário”, esclareceu o oficial.

O coronel afirma que só conhece o treinamento de sua turma, mas supõe que grupos anteriores já tivessem enfrentado o tal Alozirb.

É curioso que Alozirb, o inimigo, fosse um general. O posto indica um exército guerrilheiro, muito numeroso, e não organizações bem mais diminutas.

Mais de dez anos depois de abandonar o projeto da luta armada e sem jamais ter participado de ação guerrilheira, Brizola era o adversário que os jovens PMs eram ensinados a confrontar e matar.

Alozirb mostra o tamanho histórico de Leonel Brizola e a cultura de ódio à qual ele se opunha.

Em 1983, Brizola assumiu o governo e, mesmo com tropeços de gestão, aplicou uma política se segurança pública que considerava que a Polícia Militar deveria zelar pelos cidadãos.

E não tomar favelas e outras comunidades para achacar os pobres, esculachar os pobres, bater nos pobres, torturar os pobres, matar os pobres, sumir com os cadáveres dos pobres.

Muita gente que advoga orientação civilizatória e cidadã para a segurança, como o coronel Ubiratan, ecoa à sua maneira ideias do Brizola.

No livro “Elite da Tropa”, Luiz Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel revelaram que integrantes do Bope planejaram matar o governador Brizola. O desvario não prosperou.

O velho Briza já era o alvo desde muito antes, no treinamento…

O que o espelho de Alozirb acharia do Brasil em transe de 2015?

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Novo candidato à Fifa me prometeu carro se Coreia não perdesse para Brasil
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Mário Magalhães

Chung Mong-joon durante entrevista

Chung Mong-joon: o bilionário joga pesado – Foto Kim Hong-Ji/Reuters

 

Não estão claras quais são as chances de sucesso do sul-coreano Chung Mong-joon, que hoje anunciou sua candidatura à presidência da Fifa.

A atitude mais temerária que seus concorrentes podem ter é subestimar a capacidade de o cartola asiático fazer amigos e influenciar pessoas.

Foi esse o comportamento do Japão na disputa para sediar a Copa de 2002. Fez pouco do vizinho, que acabou arrancando o Mundial compartilhado pelos dois países. A decisão foi encarada como triunfo pelos coreanos e malogro pelos japoneses.

Chung tem muito dinheiro, muita ambição e joga muito duro.

No atacado, que são os bambambãs da Fifa, e no varejo, com aqueles que supõe terem o poder de fazer cabeças, puxando a brasa para sardinhas lá ou cá.

Já contei certa vez e reproduzo agora a ousadia de Chung, 20 anos atrás:

No dia 12 de agosto de 1995, o dirigente número um do futebol sul-coreano, Chung Mong-joon, recepcionou por volta de dez jornalistas brasileiros em um almoço num hotel cinco estrelas de Seul. Brasil e Coreia jogariam poucas horas mais tarde na vizinha cidade de Suwon.

Enquanto não serviam a comida, e garrafas de uísque de boa procedência eram enxugadas, Chung entusiasmou-se e anunciou em inglês: “Se a Coreia vencer hoje, cada um de vocês vai ganhar de presente um Accent.”

Trata-se de um modelo da Hyundai, a gigante automobilística que tem em Chung um dos controladores e herdeiros. Houve constrangimento de uns poucos repórteres mais escrupulosos, que recusariam o jabá, e excitação da maioria.

Durante a refeição, acompanhada de honestos vinhos franceses, o anfitrião _também deputado, vice-presidente da Fifa, à época lobista-chefe na disputa contra o Japão para sediar a Copa-2002 e hoje cotado para concorrer à Presidência da República_ radicalizou: “Darei o carro mesmo se houver empate.”

Quando um petardo do Dunga selou a vantagem brasileira por 1 a 0, em raro gol do volante pela seleção, um radialista traiu a ira desferindo um soco na mesa da tribuna do estádio. Adeus, Accent.

Eu era um dos comensais a quem Chung ofereceu o automóvel. Não o aceitaria, é evidente, devido ao mais evidente ainda conflito de interesses.

O bilionário _a “Forbes” confirma tal condição em 2015_ era então parceiro do presidente da CBF, Ricardo Teixeira, nos confrontos intestinos da Fifa.

Falavam que ele bebia como gente grande. No almoço relembrado acima, notei que era verdade.

Se o Platini esperava um passeio, talvez tenha surpresa, caso a candidatura Chung não seja mero exercício de vaidade e jogo de cena.

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Banda All the Postcards lança música inspirada na biografia ‘Marighella’
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Mário Magalhães

Capa do álbum, criação de Vitor Teixeira

 

Tudo bem, você pode considerar Carlos Marighella (1911-1969) herói ou vilão, gigante ou anão da história, amá-lo ou odiá-lo, conhecer muito ou pouco sobre o revolucionário baiano, achar o que lhe der na telha _hoje em dia, salve, salve, sem o risco de acabar no pau-de-arara ou ter os livros queimados na fogueira da intolerância.

Mas pense na alegria do autor de uma biografia que consumiu nove anos de ralação ao saber que uma banda punk de Angra dos Reis _na verdade, aprendi, punk/hardcore melódico_, com um montão de fãs e oito anos de estrada lançou uma música inspirada no livro que você escreveu.

É isso aí: All The Postcards acaba de lançar o álbum “Fearless”, cuja décima e derradeira faixa é intitulada “Marighella”. Seus autores são os guitarristas Caio Marcelo e Vitor Soares, este também vocalista.

Caio havia lido, presente da namorada, a biografia “Marighella: O guerrilheiro que incendiou o mundo” (Companhia das Letras). O baterista Berg, também. Junto com Caio, Berg e Vitor, o baixista Marcelo integra a banda.

Coincidência, o segundo capítulo do livro, “Uma prova em versos”, conta:

O que fazia a escola reparar em Marighella não era o desempenho de bom aluno, mas, na expressão dos professores, o “comportamento”. Iracema espantou-se quando o colega apareceu com o cabelo cortado de um lado só. Ele também raspava um círculo no alto da cabeça, como tonsura eclesiástica. Se uma máquina do tempo o transportasse ao futuro, talvez o convidassem para um concerto punk. Gostava de calçar sandálias, porém o colégio não permitia. Para implicar, recortou o bico dos sapatos e deixou os dedos à mostra. Perguntou em casa: “Se Jesus Cristo andou de sandália, por que me proibir?”

Pois não é que o Marighella viajou na máquina do tempo?

O Caio Marcelo me disse: “A gente estava finalizando as músicas que entrariam no CD, e eu cheguei no ensaio com o riff inicial da música. Ali durante o ensaio a gente praticamente desenvolveu a musica toda, depois o Vitor me sugeriu que a letra poderia ser sobre o Marighella, eu como moro em outra cidade mandei a letra por email, o Vitor elaborou o refrão e assim finalizamos a letra da música”.

Para ouvir, de graça!, o álbum inteiro, é só clicar aqui.

Se preferir ir direto em “Marighella”, com letra em inglês e o personagem-título discursando no fim, o link é o mesmo, e basta clicar na faixa número 10.

A ilustração da capa, reconstituindo célebre foto de Marighella denunciando em 1964 o tiro que levou no cinema, é de Vitor Teixeira.

O nome do álbum, que sairá em CD, “Fearless”, é citação do refrão de “Marighella”. A lápide do túmulo do guerrilheiro em Salvador, obra de Oscar Niemeyer, leva a inscrição “Não tive tempo para ter medo”.

Carlos Marighella já tinha sido cantado em canção, “Um comunista” (ouça aqui), do Caetano Veloso.

Em rap, do Mano Brown, com os Racionais MC’s, “Mil faces de um homem leal” (aqui).

Agora, ganhou sua versão punk melódico.

Só fera.

Em tradução livre, eis a íntegra da letra de “Marighella”, com All the Postcards:

 

O homem que incendiou o mundo

Sempre guiado por seus sonhos

E não importa se tem que ser clandestino

 

Vivendo sob a vigilância do Estado

Nunca parou de lutar pela liberdade

Daquele que não merecia o sofrimento

 

Sem medo!

Nenhuma porra de prisão poderia aprisionar seu amor

Sem medo!

E nenhuma batalha feroz fez este homem parar

Sem medo!

Mesmo sabendo o que aconteceu naquela noite

Ele continua nos inspirando pra luta

 

Entre lutas, palavras e amor

O homem sem medo simplesmente não poderia parar de mostrar

Que precisamos continuar (nós precisamos seguir em frente)

Nós precisamos da liberdade

 

Que a luta não terá fim

Se nós fugirmos da raia

 

Sem medo!

Nenhuma porra de prisão poderia aprisionar seu amor

Sem medo!

E nenhuma batalha feroz fez este homem parar

Sem medo!

Mesmo sabendo o que aconteceu naquela noite

Ele continua nos inspirando pra luta

 

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Zico, não esquenta, pois a Fifa não te merece
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Mário Magalhães

Se querem brigar, briguem com os números - Foto reprodução

Zico jogava mais e é mais íntegro que Platini – Foto reprodução

 

O noticiário informa que o Zico mandou uma carta à CBF pedindo endosso à candidatura dele à presidência da Fifa. Para concorrer, o Galinho precisa do patrocínio de ao menos uma confederação nacional e do apoio de outras cinco. Por enquanto, a CBF nem respondeu.

Esta quarta-feira traz outra novidade: Michel Platini tornou oficial o que era segredo de polichinelo, sua pretensão de disputar o mesmo cargo pretendido pelo Zico. O capo da Uefa, afiançado por boa parte dos cartolas europeus com direito a voto, é concorrente com imensas chances de êxito.

Mesmo que a CBF venha, em gesto diplomático, a assinar o registro do Zico, as chances do hoje técnico de clube indiano são mínimas.

Com o perdão do craque eterno, melhor para ele.

Zico jogou mais do que Platini.

E ostenta a integridade que falta ao antigo craque francês, cujas transações para a escolha do Catar como sede da Copa de 2022 se combinaram com a ascensão empresarial de um filho do antigo jogador.

Zico, em contraste, saiu de mãos limpas do governo Collor, quando exerceu o posto de secretário nacional de Esportes.

Isso mesmo: mãos limpas no governo Collor. Não é para qualquer um.

O brasileiro seria um corpo estranho no antro que é a Fifa.

Como gestor com a experiência de futebol-futebol, e não somente de futebol-negócio.

Com a decência de administrar conforme os interesses do esporte, e não dos aproveitadores do esporte.

Com a determinação de livrar o futebol dos estorvos que o castigam.

Ou seja, o Zico não teria como vencer uma eleição para a Fifa _nem para a CBF.

Porque os que mandam não querem alguém como ele para atrapalhar as armações.

Se vencesse, num cenário inverossímil, não o deixariam governar.

É muito melhor para o Zico manter distância desse pessoal.

A Fifa, pensando com otimismo no que ela poderia ser, perde.

Ao não se misturar com quem não se deve misturar, o Zico só tem a ganhar.

Ei, Galinho, não há motivo para se entristecer com os caminhos fechados: a Fifa não te merece.

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Editora rebate Eduardo Paes, que chamou de ‘asneira’ livro sobre remoções
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Mário Magalhães

Pichação na favela Metrô-Mangueira - Foto Luiz Baltar/Divulgação Mórula

Pichação na favela Metrô-Mangueira – Foto Luiz Baltar/Divulgação Mórula

 

Lançado neste ano pela Mórula Editorial, o livro “SMH 2016: remoções no Rio de Janeiro Olímpico” foi qualificado pelo prefeito Eduardo Paes como “conjunto de asneiras” e “panfleto de oposição”.

As afirmações do prefeito do Rio foram feitas na semana passada, em sabatina promovida pelo UOL e pela “Folha de S. Paulo” (a íntegra da entrevista pode ser assistida clicando aqui).

O livro conta que mais cariocas foram removidos compulsoriamente de suas residências no governo Eduardo Paes do que nas administrações de dois célebres governantes da cidade, Pereira Passos (1902-1906) e Carlos Lacerda (1960-1965, este na condição de governador da Guanabara).

Os autores da obra sobre remoções forçadas são Lucas Faulhaber e Lena Azevedo. O prefácio é assinado pela arquiteta e urbanista Raquel Rolnik, professora da USP.

Paes disse na sabatina, sem citar data, que em breve a prefeitura colocará no ar “um site contestando esse livro e outras mentiras”.

Em resposta ao prefeito, a Mórula Editorial enviou ao blog o texto reproduzido abaixo. O artigo sustenta que “ainda há muito a se debater sobre os mais de 65 mil removidos no Rio de Janeiro Olímpico. Não temos dúvida de que as marcas de um processo tão violento marcarão nossa história por bastante tempo – e não apenas as das famílias removidas”.

O blog está, é evidente, aberto à manifestação do prefeito.

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Resposta da Mórula Editorial ao prefeito Eduardo Paes

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, foi entrevistado na última quarta-feira (22) em sabatina promovida pelo jornal Folha de S. Paulo e pelo portal UOL. Na ocasião, os jornalistas Mônica Bergamo e Mário Magalhães questionaram o prefeito sobre o elevado número de remoções forçadas realizadas durante seu governo, tendo por base dados do livro “SMH 2016: remoções no Rio de Janeiro Olímpico”, de Lucas Faulhaber e Lena Azevedo.

Nós, da editora responsável pela publicação do livro, bem como os autores, recebemos com espanto as respostas do alcaide. Eduardo Paes não contesta nenhum dado da publicação, toda baseada em cuidadosa pesquisa a partir de informações da própria prefeitura. Pelo contrário, o prefeito concentra-se em classificar o livro como “panfleto da oposição” e “conjunto de asneiras”. Não vale a pena deter-se nesses argumentos, mas não podemos deixar de ressaltar que “SMH 2016: remoções no Rio de Janeiro Olímpico” foi recebido com entusiasmo tanto pelo público especializado (pesquisadores, jornalistas e militantes do direito à moradia), como pela população em geral do Rio de Janeiro. Isso porque, como ressalta a urbanista Raquel Rolnik no prefácio, “um dos pontos mais fortes do estudo é trazer informações precisas e – por serem muito difíceis de encontrar e sistematizar – preciosas sobre as remoções dos pobres urbanos no Rio de Janeiro”.

Por essa razão, parte da resposta do prefeito nos deixou com excelente expectativa. Ele garantiu que a prefeitura lançará em breve um portal com ampla informação sobre os removidos durante seu governo, dando acesso assim a dados até hoje obscuros, como: laudos técnicos, número de desapropriações, recursos gastos, panorama da realocação das famílias removidas etc.

Entretanto, com o intuito de levar adiante este debate que é tão importante para o conjunto da cidade, nos sentimos na obrigação de comentar algumas das questões levantadas por Eduardo Paes quando questionado sobre as remoções.

1) Favela Metrô-Mangueira: é importante ressaltar que os conjuntos Mangueira I e II, construídos do outro lado da linha do trem, a princípio, não foram planejados para atender qualquer reassentamento da favela Metrô-Mangueira e não receberam todos os moradores da comunidade, como pode parecer. Após muita resistência dos moradores é que grande parte dos apartamentos dali foi destinada para este fim. Em 2010, mais de 100 famílias foram levadas para Cosmos, a mais de 50 km de distância, e antes de concluir a segunda fase do conjunto, algumas dezenas de famílias foram levadas para morar em Triagem. Os detalhes da remoção da comunidade são bem explicados no depoimento de Francicleide da Costa Souza, na segunda parte do livro. Ela resume assim o período que permaneceu morando na localidade, até transferir-se para o novo conjunto: “Eles demoliam e deixavam os entulhos. (…) Eu tinha medo dos ratos, de tanto entulho que a prefeitura deixou. (…) A prefeitura faz a coisa que é pra maltratar quem resiste. Ela brinca muito com os nervos e o psicológico da gente.” Ainda sobre toda a violência que envolveu a remoção na área, recomendamos o depoimento de um jovem morador, Carlos, que foi ao lançamento do livro na UERJ pedir ajuda, após ter recebido a ordem de despejo da prefeitura (aqui: http://migre.me/qWfLe).

Finalmente, vale recordar por que Metrô-Mangueira foi removida, mesmo não cedendo espaço para nenhuma obra de mobilidade ou construção de equipamento esportivo. O Plano de Gestão da Sustentabilidade dos Jogos Rio 2016 (p. 35, 2013) explica: “Urbanização do entorno do Maracanã: A área é vizinha ao estádio do Maracanã e necessita de grande reestruturação urbana para o recebimento dos Jogos Rio 2016™. (…) O projeto abrange a relocação da favela do Metrô, situada à avenida Radial Oeste (728 domicílios e 119 comércios), com consequente reorganização do sistema viário na área remanescente e construção do centro comercial para fomento de atividades no local” (acesse aqui: http://migre.me/qWfPg).

2) Áreas de risco: quando o poder público declara que determinadas casas estão expostas a situação de risco, abrindo o precedente para a sua retirada, as famílias que não têm conhecimento técnico ou condições de arcar com algum acompanhamento profissional ficam sem condições de questionar essa motivação. Muitos moradores de áreas removidas garantem que a avaliação de risco, que aparentemente serve para salvar vidas, ultimamente está sendo utilizada no intuito de encobrir outros interesses. Em diversos casos onde a comunidade organizada conseguiu refutar a caracterização do risco geotécnico, surgiram imediatamente novas razões.

Os casos da Providência, Estradinha Botafogo, Laboriaux na Rocinha e pico do Santa Marta, todas favelas em zonas valorizadas da cidade, são exemplares nesta disputa. Desconfiados dos resultados apresentados pelos laudos oficiais, as comunidades pediram auxílio a outros técnicos, que elaboraram contralaudos, que por sua vez apontaram um número muito menor de remoções necessárias para viabilizar as intervenções que garantiriam uma condição segura para a permanência dos moradores.

O que ocorreu na Estradinha Botafogo é relatado também em detalhes no livro, a partir de entrevistas com Reinaldo Reis e Maria de Fátima Amorim. A comunidade existe desde 1952, sem registro de desabamentos. Em abril 2010, após chuvas que provocaram desmoronamento de encostas em diversos morros, a prefeitura contratou uma empresa para avaliar o risco e o laudo final recomendou a remoção de 25 casas na Estradinha. No entanto, a prefeitura deu início a um processo de remoção de todas as casas da comunidade. A situação absurda foi noticiada pelo Jornal do Brasil, em sua página na internet, com a seguinte manchete: “Prefeitura do Rio de Janeiro desembolsou R$ 10,7 milhões dos cofres públicos para remover moradores que estavam em área segura”. No livro ainda é possível conhecer processos similares na Indiana e na Providência.

Finalmente, vale enfatizar que, coincidentemente ou não, os assentamentos que apresentam o maior risco geotécnico e que também recebem obras de infraestrutura são exatamente aqueles que estão nas zonas de influência dos Jogos Olímpicos como mostra o mapa abaixo.

blog - remoções mapa

3) O discurso olímpico: os Jogos Olímpicos não removeram ninguém de fato, como afirma o prefeito. Ele são apenas mais um dos elementos que reforçam um certo projeto de cidade, servindo como justificativa para legitimar as ações do poder público. As remoções foram frequentes na história do Rio de Janeiro para liberação dos espaços para incorporação fundiária e imobiliária, e são as empresas destes setores, com grande ativismo do Estado, que têm o papel central nesse processo. Coincidência ou não, Odebrecht, OAS, Carioca Engenharia, Cyrela, MPH, Multiplan, Brookfield, Carvalho Hosken, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa dentre outras companhias figuram entre as maiores financiadoras de campanhas eleitorais e são as principais contratadas de obras públicas e PPPs.

Ainda há muito a se debater sobre os mais de 65 mil removidos no Rio de Janeiro Olímpico. Não temos dúvida de que as marcas de um processo tão violento marcarão nossa história por bastante tempo – e não apenas as das famílias removidas. Eduardo Paes talvez entre para a história da cidade como mais um prefeito que levou adiante uma ampla reforma urbana. No entanto, já não há como se desvencilhar de uma marca indelével: em números brutos, foi o alcaide que mais removeu moradores da cidade do Rio de Janeiro. Já temos um vergonhoso recorde olímpico antes mesmo da abertura dos Jogos.


Contrato de técnicos com o Flamengo os obriga a escalar três volantes?
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Mário Magalhães

Cristóvão Borges: a mesma ladainha defensiva de Luxemburgo - Foto Gilvan de Souza/Flamengo

Cristóvão Borges: a mesma ladainha defensiva de Luxemburgo – Foto Gilvan de Souza/Flamengo

 

Segunda-feira estranha essa, embora como a passada. É que os rubro-negros andávamos desacostumados: ninguém com ironia, sacaneadazinha, gozação para cima dos torcedores do Flamengo.

Tripudiar como? O time ganhou mais uma no Brasileiro, 1 a 0 no Goiás, deixou o espectro da queda para trás e já permite, aí, sim, gracejos como um de ontem: continuamos só 13 pontos atrás do líder. Te cuida, Galo…

O jogo mostrou mais uma vez o óbvio, a distinção que faz um jogador acima da média. A bola pouco chegou ao Guerrero, mas ele deu o passe camarada para o Marcelo Cirino marcar.

Em quatro partidas pelo novo clube, o peruano foi decisivo nos quatro triunfos.

Festa à parte, a equipe poderia ter perdido, não fossem as defesas do César. O goleiro que apareceu anos atrás na Copinha confirma o talento, mas precisa evoluir nas saídas de gol e na reposição de bola.

Só melhoramos quando, depois do sufoco no primeiro tempo, o Cristóvão Borges tirou o Canteros e colocou o Alan Patrick. Trocou, salve, um dos três volantes por um meia.

É impressionante como o técnico teima na escalação de três volantes.

Se cabe ao treinador explorar o que os jogadores têm de melhor, é compreensível contar com três meias defensivos, desde que ao menos um deles saiba armar.

Não é o que ocorre com Cáceres, Canteros e Márcio Araújo. Por isso, a bola custa a fluir, a alcançar os atacantes ou meias mais ofensivos.

O paredão também é uma ilusão. Como o time ataca com menos intensidade, oferece a bola para o adversário agredir.

Há treineiros que se enganam alardeando os três volantes alemães no 7 a 1. Não se dão conta de que Kroos, Khedira e Schweinsteiger, ainda que eventualmente possam ser classificados como volantes, e não meias, sabem, todos eles, organizar o jogo.

Vanderlei Luxemburgo insistia na maldição dos três volantes, abrindo mão de criatividade. Fracassou.

Na sua estreia, Cristóvão foi de dois volantes, mas logo recuou. Parece, só parece, que o clube exige dos seus técnicos tal pusilanimidade.

Sem mais talento no meio, Guerrero e, voltando de suspensão, Emerson Sheik ficarão muito isolados contra oponentes mais fortes.

É questão pragmática: para vencer, é necessário incrementar o meio.

Tomara que Ederson, o meia recém-contrato, entre no lugar de um volante.

E que o Cristóvão, gente boa, saia da retranca.

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Descoberta fórmula para o Flamengo ser campeão: eleições de 6 em 6 meses
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Mário Magalhães

No Brasileiro, sufoco; no clube, eleição: hora de contratar - Foto divulgação

No Brasileiro, sufoco; no clube, eleição: hora de contratar – Foto divulgação

 

Nos três jogos de Paolo Guerrero pelo Flamengo, três vitórias, com um gol do peruano em cada partida.

Guerrero chegou há pouco à Gávea e ao Ninho do Urubu.

Bem como Emerson Sheik, com quem já tabelara no ataque do Corinthians.

Agora, vem Ederson, da Lazio (será que todo mundo que dá pitaco sobre o meia conhece mesmo o seu futebol?).

Três contratações com padrão acima do que vigorou nos últimos tempos no clube.

Elas evidenciam o erro da cartolagem rubro-negra, que se iludiu e vendeu a ilusão de que o elenco era forte para encarar o Brasileiro com pretensões maiores que não cair.

Não era, como mostrou o perrengue do fantasma do rebaixamento.

Mas não foram somente os insucessos no Brasileiro que motivaram a decisão de apostar mais alto.

A proximidade da eleição de dezembro, também.

Daqui a poucos meses, poucos milhares de sócios elegerão o novo comando, com mandato de três anos.

Temeroso da concorrência, inclusive de aliados que romperam, o presidente Eduardo Bandeira de Mello resolveu, grande notícia, reforçar o time, prevenindo-se de vexames (quem sabe não ganhamos a Copa do Brasil?).

Já pensou se, em vez de renovar a direção de três em três anos, a troca fosse de seis em seis meses?

Haveria mais disposição para montar equipes competitivas, e não medianas.

E ninguém precisaria sacrificar as contas do clube.

Como se viu nas últimas semanas, Guerrero e Emerson renderam, além da evolução em campo, mais dinheiro: em bilheteria, camisas vendidas e novos sócios-torcedores.

Ninguém proporá um mandato mais curto?

De dois anos já seria um avanço, pelo menos para motivar os cartolas a contratar jogadores à altura do mais querido.

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Eduardo Paes estreita laços para encabeçar eventual chapa PMDB-PT em 2018
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Mário Magalhães

Eduardo Paes, na sabatina UOL/Folha no Rio

Eduardo Paes, na sabatina UOL/Folha no Rio

 

O cenário apresentado a seguir provavelmente não será comentado pelas partes envolvidas, talvez nem em conversas reservadas.

Mas a principal conclusão política da sabatina com Eduardo Paes, promovida ontem pelo UOL e pela “Folha”, é que o prefeito do Rio seria o nome com mais chances de concorrer ao Planalto em 2018 numa eventual chapa encabeçada pelo PMDB e coadjuvada pelo PT.

Se prevalecerem o calendário constitucional e a soberania dos votos que reelegeram Dilma Rousseff, o pleito ocorrerá daqui a pouco mais de três anos.

O candidato petista mais cotado hoje é Luiz Inácio Lula da Silva.

Contudo, no caso de a aprovação a Dilma permanecer no volume morto de um entre cada dez brasileiros, é difícil que o ex-presidente venha a arriscar seu prestígio histórico numa disputa com escassa chance de êxito.

Entre escalar Lula ou outro correligionário para cumprir tabela, o PT poderia aceitar, trocando a ordem da coligação PT-PMDB de 2010 e 2014, ceder o lugar principal e manter a aliança (as eleições municipais de 2016 devem retratar o expressivo impacto da política econômica recessiva e da Lava Jato no desempenho do partido nas urnas).

O vice Michel Temer, componente do governo impopular _se a impopularidade persistir_ seria candidato pouco indicado, tamanho o vínculo, de número 2, com a administração em curso.

Aí aparecem o peemedebista Eduardo Paes, suas ações e ambições.

Ao contrário do ex-governador Sérgio Cabral, que ainda hoje teme lugares públicos, o prefeito sobreviveu às Jornadas de Junho de 2013.

Terá muita exposição até a Olimpíada do ano que vem.

Costuma afirmar que sua “candidatura natural” em 2018 será a governador, mas já foi lançado à Presidência por partidários como Eduardo Cunha.

No inverno em que o presidente da Câmara e o governo se engalfinham, Paes se empenha em reforçar laços aqui e acolá.

Como faz no Rio, onde seu vice é um petista.

Sobre Dilma, o sabatinado reiterou que a julga íntegra e que inexiste motivo legal para afastá-la do cargo.

Embora divirja de Cunha sobre redução da maioridade penal e outros assuntos, elogiou-o sem se permitir ironias e gracejos como os habituais ao falar de José Serra, com quem se dá bem, e Cesar Maia, com quem não se dá.

Concedeu apenas um sorriso maroto ao ouvir a pergunta: Eduardo Cunha é coisa boa, coisa ruim ou nenhuma coisa nem outra para o Brasil?

Em sua época de PSDB, uma das cinco agremiações por que passou, Paes foi um dos deputados que mais bateram no PT na CPI dos Correios. Chamou o então presidente Lula de “psicótico” e “chefe de quadrilha”.

Ao se transferir para o PMDB, aproximou-se de Lula. Pediu desculpas por ter atacado, numa estocada que irritou a primeira-dama Marisa Letícia, um dos filhos do presidente.

Embora ex-membro do velho PFL, Paes tem exercitado discursos que o tornam mais amigável ao PT. Ao se referir à “elite demofóbica”. Ao se pronunciar contra o eixo do projeto de Estatuto da Família, que entre outros retrocessos impediria a adoção de crianças por casais do mesmo sexo. E ao condenar, como mencionado, a mudança da maioridade penal.

Nada que o impeça de ser denunciado por instituições como a Anistia Internacional como responsável por remoções compulsórias e dispensáveis de moradores de favelas, sob pretexto de abrir caminho para obras.

Na sabatina, Paes foi o primeiro a abordar a Operação Lava Jato, de início como se muitos dos suspeitos não fossem do seu PMDB.  Criticou a “dicotomia tucano-petista” como “tragédia para o Brasil”.

É candidatíssimo a presidente, com _suponho que ele prefira Lula ao seu lado_ ou sem o PT.

É muito mais provável que Eduardo Paes concorra ao Planalto em 2018 do que, por qualquer partido, José Serra.

Trata-se de um dos muitos cenários numa quadra nebulosa. Mas é verossímil.

Nessa hipótese, o PT, castigado pela(s) crise(s), pela primeira vez não teria postulante próprio à Presidência.

Para assistir ao vídeo com a íntegra da sabatina, basta clicar na imagem abaixo:

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