Blog do Mario Magalhaes

Arquivo : setembro 2013

F+F: dois sujeitos decentes
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Mário Magalhães

Fábio Seixas (esq.) e Flavio Gomes – Foto Stephan de Penasse/ Site Grande Prêmio

 

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Duvido muito que o mapa estivesse tão bem feito assim, e ainda mais que o _como diria o ministro Marco Aurélio Mello_ novato tenha chegado tão fácil, de primeira. Mas vale a leitura, tanto pela verve da dupla quanto pela integridade de caráter que as crônicas expressam.

O texto do Fábio Seixas saiu na “Folha”, como se lê clicando aqui.

A reposta do Flavio Gomes está no blog dele, neste link.

*

O mapa

Por Fábio Seixas

Na gaveta esquerda da minha antiga escrivaninha, na casa dos meus pais, repousa uma folha de papel cuidadosamente dobrada.

Papel de fax, quase ilegível. Afinal lá se vão 15 anos.

Um mapa. Ensinando minuciosamente o caminho desde o aeroporto de Frankfurt até a cidadezinha de Berg, ao lado de Nurburgring. Mapa que me guiou com perfeição, naquele 1998 sem celular nem GPS.

Dirigindo sozinho, de madrugada, na minha primeira vez na Alemanha, cheguei sem errar à casa em que se hospedava boa parte da imprensa brasileira que cobria a F-1.

Missão cumprida, trajeto feito, eu poderia ter amassado e jogado fora aquela folha de fax. Não sou de guardar coisas. Mas guardei o tal mapa. Memorabilia, peça do meu museu pessoal, a primeira vez numa corrida de F-1 fora do país –sei lá, achava que poderia ser a única.

Hoje percebo que a guardei por metáfora.

Porque aquele foi só o primeiro de um monte de mapas que recebi nos anos seguintes, generosidade rara e que parecia grande demais vinda de um sujeito tão tampinha. Eu mal sabia que era só o começo.

Foi o único mapa redigido, é verdade. Todos os outros foram transmitidos por meio de risadas, xingamentos, provocações, brincadeiras. Por conversas das mais rasas às mais profundas em viagens intermináveis mundo afora. Em carros, balsas, trens e corredores de aviões. E por trabalho duro, pesado, exaustivo.

Como quando da primeira vitória do Barrichello. Fomos os últimos jornalistas a sair do autódromo. As folhas de papel sobre a mesa estavam úmidas com um frio que só percebemos quando enviamos os últimos textos para nossos jornais.

Como no dia do acidente de Burti em Spa. Quando deixamos a pista, já não havia onde comer. Depois de muito procurar, encontramos um velho pote de Nutella no armário da casa onde estávamos. Cada um pegou sua colher e ali jantamos. Ah, o charme da F-1…

Como nas decisões de título. Como nos momentos de agito no mercado. Como nos dias absolutamente sem notícia.

Nós e os repórteres japoneses, quase sempre os últimos a sair da sala de imprensa.

(Isso para não falar nas peripécias que armávamos para levar o som ambiente das pistas para o rádio do Brasil.)

Procurei seguir cada um daqueles mapas. Tentar falar com naturalidade no rádio, tentar escrever sem amarras, tentar zombar e ser amigo de todos na sala de imprensa, tentar ser melhor jornalista, tentar ser melhor pessoa.

Um ídolo que virou amigo, professor, irmão.

Não, hoje não vou escrever de Raikkonen, Massa, Alonso, Nasr. Não. O assunto é mais importante.

Porque se você sabe quem são esses pilotos, se você ainda acompanha F-1, saiba que deve bastante a ele. Concorde ou não com suas posições sempre firmes.

O sujeito dos meus mapas.

O Jornalista, com J maiúsculo, que inaugurou este espaço na Folha, há 20 anos.

Obrigado, Flavio Gomes.

*

Sobre um certo mapa

Por Flavio Gomes

Coincidentemente, ontem a TV estava ligada quando o cara apareceu para comentar a contratação do Raikkonen, ou a demissão do Massa. Olha lá o cara na TV. Quando ele fez aquele primeiro boletim para a rádio, em Melbourne, eu trabalhando na outra emissora, pensei: essa merda não vai dar muito certo.

No terceiro ou quarto boletim, já tinha dado certo.

Foi quando? 1999? Três anos depois éramos os dois a rodar o mundo pela mesma rádio, a cada corrida um levava a mala de equipamento, aquele estorvo dos infernos, e eu sempre com o saco de cabos que, às quintas-feiras, deixavam as pessoas nas salas de imprensa malucas. Sobe na mesa, sobe na cadeira, estica um cabo aqui, conecta na TV lá, passa por cima da posição do sueco, prende com fita crepe, testa a porra toda, aumenta o volume, conecta direito, seu bosta, aperta o botão certo, seu merda, qual o número a cobrar daqui? 0800 08000 55. Esse é da Alemanha, imbecil. 0800 10 055. Esse é da Bélgica. Onde estamos, caralho? Áustria, anta. 0800 200 255.

Muitas vezes a gente não sabia direito mesmo onde estava. Ou, talvez, eu não soubesse, porque ele se guiava por um remoto mapa que recebeu por faxem 1998 e, surpreendentemente, dadas suas limitações, funcionou para que saísse da Vila Mariana e chegasse a Nürburgring, para nos encontrar numa pensão no meio do mato.

É bem provável que o tal mapa começasse mesmo na Vila Mariana, para que ele não errasse de aeroporto, o que já seria um bom começo. Pois esse mapa que o tempo está apagando era para chegar a Nürburgring, mas fez com que ele descobrisse o mundo inteiro.

Bem, só mesmo um completo retardado para escrever no maior jornal do país sobre um mapa na semana em que Massa sai da Ferrari. Para ele, eu sair da ESPN foi mais importante. Não vou falar aqui sobre minha saída do canal, é problema meu e não quero aborrecer ninguém com essa história.

Hoje, quando fazia o que faço todos os dias, o café, um iogurte grego (estou encantado com os iogurtes gregos, mas me disseram que não são novidade nenhuma, que existem desde os tempos de Platão, mas para mim são uma novidade completa, um programa de ajuda internacional à Grécia, a quem pagamos royalties para salvá-los da merda em que se meteram) e o jornal de papel estendido no balcão da cozinha, leio o texto do cara.

Eu e o Seixas temos dez anos de diferença. Eu poderia usar aqui aquelas coisas meio clichê como é o irmão mais novo que eu não tive, ou é como meu filho blá-blá-blá.

Mas seria mesmo um clichê.


Antes do Rock in Rio, Bruce Springsteen faz homenagem a vítimas de Pinochet e canta ‘Manifesto’, de Victor Jara
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Mário Magalhães

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Na quarta-feira, o golpe de Estado que levou o general Augusto Pinochet ao poder no Chile completou 40 anos. No dia seguinte, o norte-americano Bruce Springsteen se apresentou em Santiago. Voltou sozinho para o bis. Em castelhano, homenageou as vítimas da ditadura e cantou o clássico “Manifesto”, de Victor Jara.

Cantor e compositor chileno, Jara foi executado com 44 tiros em setembro de 1973, em seguida à deposição do presidente socialista Salvador Allende.

Bruce tocará sábado que vem no Rock in Rio.

“Manifesto”, por Bruce Springsteen, em Santiago:

A interpretação original de Victor Jara:


PM obrigou mulher a culpar traficante no caso Amarildo, denunciam testemunhas
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Mário Magalhães

 

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Duas pessoas afirmaram quinta-feira à Polícia Civil que uma delas foi coagida pelo ex-comandante da UPP da Rocinha a prestar falso depoimento na investigação sobre o desaparecimento de Amarildo de Souza, cujo sumiço completa dois meses hoje.

De acordo com as testemunhas, o major Edson Santos teria obrigado uma mulher a dizer ao Ministério Público que o traficante de drogas Catatau teria matado ou ordenado a morte de Amarildo. Por ordem do oficial, ela também teria inventado que o pedreiro era vinculado ao tráfico.

A notícia saiu neste sábado em “O Globo”, na coluna de Ancelmo Gois, e como manchete de “O Dia”, numa reportagem de Adriana Cruz e Vania Cunha. A matéria das repórteres pode ser lida clicando aqui.

A Divisão de Homicídios informa investigar duas possibilidades: Amarildo teria sido assassinado por PMs da UPP, possivelmente sob tortura, ou por traficantes.

Na última vez em que foi visto, Amarildo estava sob custódia do Estado. Policiais militares o detiveram e levaram para a sede da UPP na Rocinha, então comandada pelo major Edson Santos. Os PMs asseguram que liberaram o pedreiro, mas não há uma única testemunha na favela que o tenha visto depois de supostamente ter deixado a unidade.


Uma vela para Deus, outra para o diabo: Comissão da Verdade investiga como as igrejas ajudaram ou perseguiram militantes caçados pela ditadura
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Mário Magalhães

Dom Hélder Câmara (1909-99), um cearense que encarou a ditadura – Foto reprodução

 

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Na semana que vem, terça e quarta-feiras, as Comissões da Verdade nacional e do Rio promoverão uma audiência conjunta sobre a atuação de diferentes denominações religiosas no período 1964-85. A comissão federal instalou um grupo de trabalho dedicado ao tema “Papel das igrejas durante a ditadura”. Haverá transmissão ao vivo pela internet.

Como é sabido, hierarcas de diversas igrejas atuaram intensamente tanto contra quanto a favor dos governos do ciclo inaugurado com o golpe de Estado que depôs João Goulart.

O comunicado da assessoria de comunicação da Comissão Nacional da Verdade está abaixo.

*

Em uma iniciativa conjunta, a Comissão Nacional da Verdade e a Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro promovem audiência pública, nos dias 17 e 18 de setembro, no Auditório da CAARJ, no centro do Rio. O evento faz parte do Grupo de Trabalho “Papel das igrejas durante a ditadura” e terá transmissão ao vivo na internet pela CNV.

Haverá a coleta pública de vários depoimentos, com destaque para a participação de Dom Waldyr Calheiros, bispo emérito da diocese de Volta Redonda, líder religioso que deu abrigo e facilitou a fuga de diversos perseguidos políticos para outros países. Aos 90 anos, o testemunho de Dom Waldyr será exibido em vídeo pré-gravado pela CNV em parceria com a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em virtude de suas condições de saúde.

Outro destaque será o depoimento do professor e bispo emérito da Igreja Metodista do Rio de Janeiro, Paulo Ayres Mattos, líder ecumênico, presidente da Koinonia – Presença Ecumênica e Serviço. Mattos deu abrigo aos refugiados do Cone Sul que procuraram o Brasil nos anos 70 após os golpes militares no Chile, Uruguai e Argentina.

Também prestarão seus depoimentos as ex-presas políticas Jessie Jane e Letícia Contrim; e os ex-presos Marcos Arruda e Zwinglio Motta Dias, cujo irmão, Ivan Motta Dias, é um desaparecido político. Pastor presbiteriano, Zwinglio foi expulso do Seminário Presbiteriano de Campinas, em 1962, devido ao discurso teológico que adotava de salvação das almas, mas que passava pela ética e a preocupação social.

No dia 18 à tarde, haverá uma homenagem póstuma ao advogado de presos políticos Lysâneas Maciel, ex- deputado federal, que teve seu mandato cassado pela ditadura, e a Herbert de Souza, o Betinho, ex-líder da Juventude Universitária Católica e da Ação Popular durante a ditadura, que se tornou um líder pelos direitos humanos após seu retorno ao Brasil.

O grupo de trabalho papel das igrejas durante a ditadura examina a postura política de instituições religiosas e seus integrantes em relação ao regime ditatorial. Busca esclarecer a participação de instituições religiosas cristãs e/ou de suas lideranças clérigas ou leigas, tanto no apoio a movimentos de resistência à ditadura, quanto na contribuição à repressão, analisando os fatos e as circunstâncias de graves violações de direitos humanos correlatos ao seu tema.

Audiência Pública do GT Igrejas no Rio de Janeiro
Quando
: 17 e 18 de setembro
Horário: dia 17, das 9h30 às 17h e dia 18, das 9h00 às 17h
Onde: Auditório da CAARJ
Endereço: Av. Marechal Câmara 210, Castelo, Centro – Rio de Janeiro.
Transmissão ao vivo: http://www.twitcasting.tv/CNV_Brasil


‘Intelectuais pela liberdade’, por Ruy Castro
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Mário Magalhães

Carmem Miranda, a biografada, e Ruy Castro, o biógrafo – Foto Divulgação

 

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Ruy Castro, em sua coluna na “Folha”, quarta-feira:

“Se o Brasil conhece hoje a sua história no século 19, devemos isso aos biógrafos que se debruçaram sobre a vida dos homens que nos governaram por mais de 80 anos naquele período. Alguns desses estudiosos foram Oliveira Lima, autor de “D. João 6º no Brasil” (1908); Octavio Tarquínio de Sousa, de “A Vida de d. Pedro 1º” (1952); e Heitor Lyra, de “História de d. Pedro 2º” (1938-40)”.

“Sem entender a vida de nossos monarcas, não entenderemos o país –porque este refletia o que se passava sob as coroas dos dois primeiros e a cartola do último. Aliás, graças aos biógrafos, sabemos que foi Pedro 2º quem trocou a coroa pela cartola –mais civil, moderna e democrática. Suponha agora que alguém da família Orleans e Bragança (ainda com representantes de peso no Rio e em São Paulo, Petrópolis, Paraty e Paris) considere tal informação desprimorosa para com o seu ilustre. Sob o artigo 20 do Código Civil, ele pode tirar essa biografia de circulação ou até impedir que seja publicada.”

“O mesmo está ao alcance dos herdeiros de Joaquim Nabuco, Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha, Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves, Carlos Lacerda, Celso Furtado ou de qualquer homem público. Mas esses nunca fariam isso, porque são pessoas esclarecidas e sabem da importância de seu parente para a história –inclusive no que, possivelmente, ele cometeu de errado.”

Para ler na íntegra, basta clicar aqui.


O duelo entre Yoko Ono e Maria Bonita
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Mário Magalhães

 

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Como, aqui em casa, o 11 de setembro não evoca só tragédias, saí anteontem à noite para celebrar o aniversário do meu irmão. Acabei ganhando do aniversariante um presente, trazido de Aracaju, o cordel “O arranca-rabo de Yoko Ono com Maria Bonita ou a desanventura de John Lennon e Lampião”.

O autor é Sávio Pinheiro, médico e poeta cearense, consagrado cordelista. Entre suas obras mais conhecidas estão “A peleja do fígado valente com Manel Cachacinha” e “O homem que foi preso porque peidou na igreja”.

O embate das viúvas é engraçado, com uma jogando na cara da outra os podres dos falecidos.

Uma palinha:

Yoko – Virgem fica sem espaço

Nas andanças do teu bando

Pois o grupo em algazarra

Pela mata ia estuprando

As donzelas mais bonitas:

Era assim, de quando em quando.

Maria – Já que queres me lembrar

De pendenga sexual

No bando de Liverpool

Tinha um rapaz genial

Que traçava gente moça

Mesmo intelectual.

Yoko – Não compare o bem com o mal

Catitinha do sertão

O John Lennon tinha estampa

Era um tipo bonitão

Tinha os seus cabelos longos

E artefato na visão.

Maria – Parece é com Lampião

A sua descrição veemente

Pois Virgulino ostentava

Sua fama de valente

Com uns óculos redondinhos

E cabeleira decente.

(…)

Yoko – Você nunca terá paz

Com amargura tamanha.

Mesmo você bem trajada

E com toda essa artimanha

Nesse modelo esquisito

Até parece uma estranha.

Maria – A minha grande façanha

No sertão ou na cidade

É trabalhar bem o couro

Com enorme variedade

Bordar, cozer e cerzir

Dá-me enorme vaidade.

Yoko – Com toda cumplicidade

Quero aqui me permitir

Dizer que o John Lennon tinha

Nobre gosto no vestir

E sendo ele bem vaidoso

Sempre soube construir.

Maria – Eu venho aqui garantir

Que o Virgulino disputa:

Em moda, ele é mais esperto

Que qualquer filho da puta,

Desculpe o atrevimento

Mas você não me recruta.


Sonho sonhado: e se Joaquim Barbosa disser para Celso de Mello que renuncia ao Supremo em caso de derrota?
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Mário Magalhães

Ministro Joaquim Barbosa, presidente do STF – Foto Carlos Humberto/3.9.2012/STF

 

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Eu, que nem sei direito o que significa o palavrão em voga, os tais dos embargos infringentes, despertei sobressaltado com o sonho ou pesadelo, a depender da cachola do freguês. Antes que me interpelem, enfatizo que foi sonho sonhado.

Não, não acordei metamorfoseado numa barata, nem era ainda de manhã. Passou-se o seguinte no enredo da madrugada: contrariado com a iminência de redução de penas e prescrição de crimes no processo do mensalão, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, deixou o colega Celso de Mello numa sinuca de bico. Disse-lhe, num tête-à-tête: se o decano do tribunal desempatar para 6 a 5 a favor dos recursos, Joaquim renuncia na hora, atira a toga ao chão e denuncia que “a impunidade triunfou”.

Se, em seguida, o único ministro negro no Supremo lança a sua candidatura à Presidência da República, eu não sei, porque o sonho ou pesadelo veio sem esse capítulo.

Bem como ignoro qual foi a reação de Celso de Mello ao ouvir do colega a ameaça de abrir uma crise constitucional capaz de conflagrar o país.

É claro que isso jamais ocorreria _nem um se prestaria a chantagear, nem o outro aceitaria ser chantageado. Só se passou, como contraponto, nos delírios de quem foi dormir feliz com a vitória do Flamengo e embalou o sono nas nuvens de um honesto sauvignon blanc. E não tem ideia de como Celso de Mello decidirá o jogo renhido do tribunal.