Blog do Mario Magalhaes

Os três calmantes de Rodrigo Maia, seu primeiro abraço e as crias de Cesar
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Mário Magalhães

BRASILIA, DF, BRASIL, 13-07-2016, 23h00: O dep. Rodrigo Maia vence a eleição para presidente da câmara dos deputados, no plenário da câmara dos deputados. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)

Rodrigo Maia vibra; à sua frente, Pauderney Avelino – Foto Pedro Ladeira/Folhapress

 

Das imagens da longa jornada noite adentro que elegeu Rodrigo Maia presidente da Câmara talvez a mais eloquente tenha sido a do primeiro abraço que o deputado trocou ao ser anunciado o triunfo. Foi com o líder do seu partido, Pauderney Avelino. Decadente, o DEM teve sua gênese na Arena, agremiação oficial da ditadura. Pauderney é o sujeito sobre quem Sérgio Machado, ex-mandachuva da Transpetro, sentenciou em gravação: ''Um cara mais corrupto que aquele não existe''. O interlocutor, Renan Calheiros, emendou: ''Pauderney Avelino, Mendoncinha''. O noticiário identificou Mendoncinha como Mendonça Filho, hoje ministro da Educação de Michel Temer. O DEM, de tantos próceres investigados pela Operação Lava Jato e com raízes sombrias, e o campeão Pauderney ilustram o que a Câmara é e continuará sendo. Sem surpresa, para quem assistiu ao despudor da sessão dominical de 17 de abril.

Outra impressão do comecinho da madrugada lembrou um episódio das andanças de Tancredo Neves, nos idos de 1984 e 1985, em suas articulações para a disputa no colégio eleitoral contra Paulo Maluf. Muito mais jovem que a simpática raposa mineira, o repórter Ricardo Kotscho desconfiava que o veterano se cansava menos. ''Eu sou movido a vitamina P, meu filho'', esclareceu Tancredo. P de política e poder. Se o poder rejuvenesce, Rodrigo Maia vai na contramão. Aos 46 anos, a despeito do rosto rechonchudo de menino, tem o cocuruto devastado pela calvície, perdeu o controle da balança, caminha com a camisa para fora da calça. Problema? Nenhum. Mas que é original é. Assim como sua revelação ao se sentar pela primeira vez na cadeira até outro dia ocupada por Eduardo Cunha: tomou três calmantes para suportar a refrega. Rodrigo humaniza a figura clichê dos políticos, que gostam de se exibir seguros, destemidos, inexpugnáveis. Curiosidade: se para o embate em que contava com ampla vantagem foram necessários três calmantes, quantos ele tomará em entreveros mais renhidos?

Rodrigo se emocionou ao mencionar seu pai, o vereador Cesar Maia. Houve um tempo em que o ex-prefeito apostava sobretudo na carreira de dois jovens. Seu filho e Eduardo Paes. Os calouros contrastavam. Enquanto desde cedo Paes demonstrou desembaraço e vocação para o proscênio, Rodrigo preferiu costuras discretas nas coxias. Sempre pareceu, aos sócios, um integrante deste nosso vasto clube dos tímidos. Houve um momento em que, para se arriscar em voos mais altos, Paes rompeu com Cesar e Rodrigo. Foi deputado de destaque, chegou a prefeito do Rio, sonha ir mais longe ainda. Quanto mais Eduardo subia, maior era o declínio do seu antigo padrinho. A aversão de Cesar por Eduardo era tamanha que se disseminou no Rio a lenda urbana segundo a qual o ex-brizolista se ressentiria porque seu apadrinhado teria desistido de se casar com Daniela Maia, irmã gêmea de Rodrigo. Indagado numa entrevista sobre o rumor, Cesar negou tudo, até que o namoro tenha existido. A conquista da presidência da Câmara por Rodrigo recoloca seu pai na condição de político que muitos procurarão e adularão. Cesar e Rodrigo acabaram se reaproximando de Eduardo, que se tornou a figura mais influente do poder carioca. Agora, não são apenas os Maia que precisam de Paes. Este precisará de Rodrigo.

Para além de todas as análises e consequências políticas da eleição na Câmara, Rodrigo Maia é um tremendo personagem. Goste-se ou não dele, de suas ações e suas ideias.

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Longe dos holofotes olímpicos, guerra do tráfico leva pânico à Baixada
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Mário Magalhães

Enquanto os holofotes focam os bairros cariocas onde haverá provas e jogos da Olimpíada, uma guerra entre traficantes leva pânico e morte à Baixada Fluminense.

Quem passou ontem à noite por Engenheiro Pedreira, no município de Japeri, viu o cadáver de um homem.

Ao passar pelo mesmo local hoje de manhã, observou que o cadáver continuava lá.

Trata-se de mais um traficante morto na guerra entre duas facções criminosas: o Comando Vermelho, que dominava o bairro, e Amigos dos Amigos, que vem ganhando território.

Dia sim, outro também, balas zunem e infernizam os moradores em trânsito ou em casa.

Em camionetes, traficantes circulam com fuzis, sem se preocupar em escondê-los.

Ontem houve outra morte, aparentemente por mal denominada bala perdida: a de uma senhora conhecida por vender cachorro-quente numa praça.

Essas dores não saem no jornal.

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Censura da TV a imagem de invasão de campo fere direito dos espectadores
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Mário Magalhães

Homem invadiu campo no jogo Canadá x México, em 2016 – Foto reprodução

 

Alguém invadiu o gramado do estádio de Saint-Denis na decisão da Eurocopa.

Outras invasões já haviam ocorrido na competição.

Idem na Copa América deste ano.

No domingo, não se soube se o intruso era um exibicionista desses que correm pelados.

Ou um mentecapto tentando agredir jogador.

Ou um fã exacerbado suplicando autógrafo do ídolo.

Ou um terrorista.

Não se soube porque, como se tornou padrão, a transmissão televisiva omitiu a cena.

Ignoro se o sem-noção atacou um boleiro, gesto que poderia desestabilizar um time.

Se os atletas defenderam o invasor de excessos dos seguranças.

Ou, isso eu nunca vi, se um jogador esticou a perna para derrubar o penetra.

Se o bobalhão driblou muitos guardas antes de ser agarrado.

Para ser considerada sobretudo jornalismo, e não somente entretenimento, a cobertura do futebol tem de reverenciar a informação.

Jornalismo é o serviço público que consiste essencialmente em informar.

A invasão de campo e os movimentos do invasor constituem informação.

Se o critério for jornalístico, há de informar, exibindo sem restrições.

Os donos do jogo _os detentores dos direitos comerciais de transmissão e quem transmite_ decretaram censura às imagens de invasão.

Parecem pensar mais no negócio: não querem desvalorizá-lo.

Será que invasão de gramado desvaloriza o futebol?

O pretexto é não incentivar maluquices de loucos por aparecer.

Pelo jeito, não está dando certo, tantas são as invasões.

É o mesmo argumento para omitir o nome de organizações criminosas do Rio e de São Paulo. Alegam que dar nome a elas seria glamorizá-las, estimulando a adesão de jovens.

Será? O efeito mais notório é sonegar informação relevante.

Houve um tempo em que a imprensa brasileira não noticiava suicídios, por temer que o noticiário levasse a novas mortes.

O argumento também parece frágil, embora nem toda informação disponível tenha de ser publicada.

Se um repórter soubesse antes a data e o local do desembarque na Normandia, deveria noticiá-los? É lógico que não.

Sou contra noticiar abandono de bebês, por ter observado que quando se conta que um recém-nascido foi abandonado sobrevêm outros casos.

Mas isso tudo é bem mais complexo que invasão de campo de futebol.

Assim que o invasor entra em ação, os mandachuvas da transmissão cortam para cena sem sentido, como a de jogadores parados conversando ou um técnico limpando o nariz.

É um direito do espectador assistir às invasões, pois elas influenciam o jogo, parando-o e eventualmente esfriando-o.

A censura fere tal direito.

Tratam os espectadores como bocós, incapazes de julgar por si próprios o panaca invasor.

Inclusive os assinantes de canais esportivos pagos.

Há coisa mais importante a tratar no futebol?

Certamente.

Mas nem só de coisas mais importantes se vive a vida.

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Lance da final da Euro mostra como recurso ao vídeo faria bem ao futebol
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Mário Magalhães

A bola pegou na mão de Éder, mas o árbitro pensou que foi Koscielny quem tocou – Foto reprodução

 

Manhã de domingo, decisão do Grand Prix, finalzinho do terceiro set. O Brasil vence os Estados Unidos por 24 a 23, e o árbitro dá ponto contra a equipe de Zé Roberto.

O técnico recorre ao direito de rever o lance em câmera lenta. Vê-se que a bola tocou num dedo de norte-americana, portanto ponto para as brasileiras, que fecham o set. Logo vencerão por 3 a 2, papando mais um título.

À tarde, na prorrogação do épico futebolístico em Saint-Denis, o apitador assinala mão de Koscielny. Falta perigosíssima.

Só que não foi na mão do francês que a bola bateu, e sim na do português Éder.

Para imensa sorte dos merecidos campeões da Eurocopa, eles não converteram a cobrança. O título de Portugal não foi tisnado por erro de arbitragem. Ninguém pode se derramar em chororô.

Os dois árbitros erraram. Mas no vôlei a falha pôde ser corrigida com ajuda da imagem.

Já está na hora de permitir no futebol, em casos limitados e específicos, a consulta ao videoteipe.

Não a todo momento, prejudicando o ritmo do jogo.

Mas em situações como a de ontem, que poderia ter definido a partida. Para evitar mancadas grosseiras.

Difícil que a mudança vingue. Em matéria de mentes, no futebol o tempo passa em slow motion.

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Triunfo português na Eurocopa consagra o pacto mais generoso do futebol
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Mário Magalhães

Legítimos, merecidos, valentes campeões da Euro – Foto divulgação

 

Futebol é pacto coletivo, e não a soma protocolar de indivíduos.

O time não é um mais um. Ao menos não com resultado dois. Um mais um tem de ser mais que dois.

É o compromisso generoso com o outro, que mais do que colega é companheiro.

Ainda que sejam diferentes, uns melhores, outros piores.

A ideia luminosa do futebol como exercício de conjunto engrandece.

Ao contrário da concepção narcísica do craque cujo horizonte não ultrapassa o próprio umbigo.

Garrincha já seria gênio pelo que jogava. Tornou-se legenda por jogar para o time, como na Copa de 62.

Os craques em campo e na vida perdem e ganham juntos. Mesmo sabendo que sobram na turma.

A conquista portuguesa ontem na França, contra a seleção da casa, enobrece o futebol.

Porque o pacto coletivo triunfou na Euro.

Ao perder seu único cracaço, Cristiano Ronaldo, no comecinho do jogo, os portugueses não esmoreceram.

Agigantaram-se.

Só coletivamente suportariam a pressão. Assim teriam chance de transformar sonho em caneco.

Diante do adversário mais time e da torcida frente à qual tantos sucumbiram, a seleção portuguesa perseverou.

Mostrou que o futebol é feito mosqueteiro de Dumas, um por todos, todos por um.

A façanha entra para a história das superações nos gramados.

Cara a cara com os Golias da vida, os Davis sempre terão Paris para se inspirar _ou Saint-Denis, nos arredores da capital francesa.

Um domingo para não esquecer.

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Sabáticas: A vingança do silêncio
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Mário Magalhães

 

Se alguém quiser me tirar do sério, basta contar um filme que ainda não vi e pretendo ver. Por isso, vou logo avisando, para me livrar de broncas merecidas: o que vem a seguir é puro spoiler. Entrego pormenores do enredo de dois filmes que compartilham ao menos três virtudes: são argentinos, têm _adivinhe_ Ricardo Darín no elenco e constituem obras-primas do cinema deste século.

Relatos Selvagens, dirigido por Damián Szifron, escrutina em seis episódios o limite de cada vivente antes da irrupção da ira santa ou profana. E trata de vingança, servida quente ou fria.

Acompanhamos o comissário que reúne os desafetos no mesmo voo, determinado a matá-los; a garçonete que se depara com o homem que levou o pai dela ao suicídio; os motoristas que saem no braço depois de um xingar o outro por barbeiragem; o engenheiro que se enfurece com o guincho viciado em recolher seu carro e contra-ataca armazenando explosivos no automóvel; o pai endinheirado que, para proteger o filho que atropelou uma grávida, paga ao caseiro para assumir a culpa; e a noiva em surto na festa de casamento, ao descobrir que o noivo convidara a outra.

Faltou, nesse sangrento catálogo de vendetas, a que encerra O Segredo dos Seus Olhos, de Juan José Campanella, Oscar de melhor filme estrangeiro.

Na história, um bancário dedica-se a investigar quem foi o sádico que matou sua mulher. Quando o réu confesso é condenado e não fica muito tempo no xilindró, o viúvo o sequestra. O vingador descarta enfiar uma bala na cabeça do assassino, pois se opõe à pena de morte, mas decide mantê-lo para sempre em cárcere privado. O castigo supremo é jamais dirigir uma só palavra ao prisioneiro. Para o matador, a dor das grades é menor que o desespero com a mudez perpétua do carcereiro.

A vida é mesmo assim: às vezes, a vingança do silêncio fere mais que faca bem afiada.

(MM, publicado originalmente na revista Azul Magazine, fevereiro de 2015)

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Fedeu
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Mário Magalhães

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