Gratidão & memória: Ranieri, Micale, Pimenta, Yunes e Temer
Mário Magalhães
Seis meses depois da conquista da medalha de ouro no futebol olímpico masculino, o técnico Rogério Micale foi para a rua. A CBF demitiu-o do comando da seleção sub-20, em seguida à campanha ruim no Sul-Americano. Não é a primeira vez, longe disso, que uma equipe de garotos vestindo a amarelinha malogra. O título de 2016, no entanto, foi inédito. Grandes treinadores não chegaram lá. Como Zagallo, medalha de bronze em 1996, com um elenco repleto de campeões da Copa de 94 e futuros vice-campeões em 98. A entidade com reputação manjada puniu o treinador pelo tropeço numa competição menor. Não prevaleceu a façanha nos Jogos. Alguém comparou o futebol a uma empresa: se a companhia vai mal, o executivo dança. Não sabem do que falam: reveses menores de um administrador saem na urina, se o balanço geral do desempenho é positivo. A ingratidão sobrepujou a gratidão. Em se tratando de CBF, sem surpresa.
Mais ingrato ainda é o cartão vermelho do Leicester City a Claudio Ranieri. O italiano levara o clube ao título inglês. No mês passado, sagrou-se o melhor treineiro de 2016 no planeta. O sábio que impulsionou o Leicester ao triunfo inimaginável não seria capaz de devolvê-lo às vitórias? Memória curta, no caso de Ranieri e Micale.
A memória também parece fraquejar em relação a José Eduardo Pimenta, candidato a presidente do São Paulo. Ele ocupou o cargo na primeira metade dos anos 1990. O cartola e Telê Santana não se bicavam. Telê se vinculava à direção de futebol. Pimenta era bom companheiro do presidente da federação paulista, Eduardo José Farah. Testemunhei essas intrigas. Do terceiro trimestre de 1992 a dezembro de 1993, fui o repórter setorista da ''Folha'' no clube. Com Pimenta, vieram glórias. Mas quando se tornaram públicos determinados episódios a torcida gritava no Morumbi: ''Pimenta, ladrão, São Paulo campeão!'' É surpreendente que o jornalismo rememore a trajetória de Pimenta à frente do tricolor e se esqueça _com ou sem aspas_ de mencionar como a torcida, certa ou errada, o tratava.
Enquanto no São Paulo há quem prefira a gratidão a Pimenta e sonegue ou relativize aspectos do seu passado, Michel Temer não tem por que se queixar de ingratidão do seu amigo José Yunes. Muitíssimo ligado a Temer, Yunes contou que recebeu de um doleiro sinistro um pacote fornido endereçado a José Padilha. Até agora, vai livrando o presidente do imbróglio. Acontece que um prócer da Odebrecht contou que quem pediu o dinheiro foi Temer. Yunes diz que foi mula de Padilha. E não de Temer? Do ex-vice, Yunes merece mesmo imensa gratidão.