Sabáticas: Sons do Natal
Mário Magalhães
Todas as manhãs, de segunda a sexta e às vezes no sábado, eu rejeito a escada rolante e subo 33 degraus, na saída do metrô, antes de caminhar mais uns 12 passos e entrar no edifício meio neoclássico, meio art déco onde trabalho na Cinelândia. Embico para a escada estática porque, como me aboleto boa parte do dia diante do computador, ao menos faço um exerciciozinho a mais.
Enquanto avanço degrau por degrau, um relógio monumental, no alto de um prédio da rua do Passeio, vai ficando mais próximo e domina o horizonte. Com mais de meio século, a geringonça ainda funciona. Os cariocas a chamam de relógio da Mesbla.
Como sabe quem não nasceu ontem ou anteontem, a Mesbla foi uma rede de magazines que marcou época. Ao vislumbrar seu relógio, volta e meia cantarolo: “Na Mesbla, na Mesbla/ O maior Natal do Brasil/ Compre agora sem entrada/ E só comece a pagar em abril”.
A Mesbla se foi, mas seu jingle apregoando as compras de fim de ano aninhou-se na memória. Como o da Varig, cujo final era assim: “Papai Noel voando a jato pelo céu/ Trazendo um Natal de felicidade/ E um ano novo cheio de prosperidade”.
Corais infantis embalavam o do Banco Nacional, alvo de malícia da turma da galhofa: “Quero ver você não chorar/ Não olhar pra trás/ Nem se arrepender do que faz”. Encerrava: “Que o Natal existe/ Que ninguém é triste/ Que no mundo há sempre amor/ Bom Natal, um feliz Natal/ Muito amor e paz pra você”.
Nenhuma canção natalina me comoveu como a que o John Lennon e a Yoko Ono lançaram em 1971, com letra deles e melodia de uma velha balada inglesa: em Happy Xmas, mais do que a voz do antigo beatle, ecoava o coro pujante de crianças do Harlem, com a mensagem de que a guerra do Vietnã acabaria se cada um quisesse. O mundo adotou a música, as armas silenciaram dali a poucos anos, e Happy Xmas continua acalentando os sonhos das novas gerações.
Bom Natal, um feliz Natal.
(Publicado originalmente na revista Azul Magazine, dezembro de 2014)