Blog do Mario Magalhaes

História: De Castello a Temer, por que presidentes ‘dispensam’ popularidade

Mário Magalhães

Resultado de imagem para folha marechal presidente castello branco

Em traje civil, o marechal Castello Branco, o primeiro ditador da ditadura – Foto Folha Imagem

 

Em um café da manhã com jornalistas, Michel Temer pontificou: ''Um governo com popularidade extraordinária não poderia tomar medidas impopulares […] Estou aproveitando a suposta impopularidade para tomar medidas impopulares''.

O ''suposta'' fica por conta de insinceridade ou fantasia. De acordo com o Datafolha, somente 10% dos brasileiros consideram bom ou ótimo o governo Temer. Os que o avaliam ruim ou péssimo são 51%. Logo, inexiste suposição.

Temer, para quem enxerga perto, acata a sugestão dada em novembro pelo publicitário Nizan Guanaes: ''Já que o governo não tem índices de popularidade altos, aproveite presidente. A popularidade é uma jaula. Ninguém faz coisas contundentes com altos níveis de popularidade. Então, aproveite que o senhor ainda não tem altos índices de popularidade e faça coisas impopulares que serão necessárias e irão desenhar esse governo para os próximos anos. Aproveite sua impopularidade, tome medidas amargas, aliás este é o grande desafio das democracias do mundo''.

Quem vê longe no retrovisor sabe que a inspiração de Temer não é o publicitário da excêntrica lição ''ninguém faz coisas contundentes com altos níveis de popularidade''.

Há meio século, o marechal Humberto de Alencar Castello Branco também se jactava do que presumia ser sabedoria: como já era impopular, impunha medidas impopulares em série aos trabalhadores e aos cidadãos mais pobres.

Castello foi o primeiro presidente da ditadura que vigorou de 1964 a 1985. Governou até 1967, sem ter recebido um só voto do povo, depois da deposição do presidente constitucional João Goulart. Foi ''eleito'' pelo Congresso sem mandato para proclamar presidente. A eleição direta para o Planalto estava prevista para 1965. Primeiro, a ditadura adiou-a para 1966. Em seguida, extinguiu-a (só viria a acontecer em 1989).

Durante sua administração, Castello castigou os brasileiros com medidas que hoje caberiam no receituário do ''ajuste''. Constituíam um tremendo arrocho, com a imposição de perdas salariais perversas e baques nas condições de vida.

Luís Viana Filho, seu ministro do Gabinete Civil, recapitularia, orgulhoso: o marechal ''não vacilara ante a impopularidade''.

O jornal ''Diário de Notícias'' adulou Castello: ''O fantasma da impopularidade, se o atormenta, não o intimida''.

Castello disse a um antigo aliado com quem viria a romper: ''O senhor sabe que a Revolução está tomando medidas de caráter impopular''. Os golpistas tratavam como ''Revolução'' o regime nascido do golpe de Estado de 1964.

A um general norte-americano, seu amigo desde a década de 1940, Castello afirmou em agosto de 1966 estar ''bem ciente de como seu governo é impopular devido às suas medidas de austeridade anti-inflacionárias''.

Trocando em miúdos, Castello Branco governava secundarizando a aprovação dos eleitores. Não a dispensava, mas ela não era determinante. Por motivo singelo: o governante não dependia da vontade dos governados para se manter no cargo ou fazer o sucessor. Não dependera deles para empalmar o poder.

Num contexto histórico diferente, é também o que ocorre com Michel Temer. O presidente não chegou lá por meio do sufrágio popular (foi eleito para vice, e no tapetão se beneficiou da derrubada da presidente contra a qual conspirou). Tem pouca ou nenhuma possibilidade de vencer a eleição direta prevista para 2018 (só um doidão muito doido especula vitória nas urnas de um correligionário de Renan Calheiros, Eduardo Cunha e Romero Jucá).

Esta é uma das razões pelas quais a democracia faz bem: como é escolhido pelo voto do povo, o governante não pode _ou não deveria_ ignorar seus eleitores ao governar.

Temer bebe no ditador Castello, que deixou o governo muitíssimo impopular, como até as pesquisas de opinião da época demonstraram.

(O blog está no Facebook e no Twitter )