Blog do Mario Magalhaes

No Maracanã solar, o reencontro com a esperança

Mário Magalhães

O futuro da seleção deu as caras no Maracanã – Foto Leonhard Foeger/Reuters

 

Na saída do Maracanã, subindo a rampa rumo ao metrô, devotos de uma igreja distribuíam panfletos. Peguei um exemplar e li a pergunta:

''Há esperança para o ser humano?''

Enquanto matutava sobre a questão existencial, reparei no cartaz que um homem exibia, estimulando o apoio ao Brasil ''sempre'' e proclamando ''nunca'' para vaias ao adversário.

Tarde demais. No estádio que vaia até minuto de silêncio, conforme a tirada rodriguiana, os jogadores hondurenhos haviam sido apupados ao entrarem em campo para o aquecimento. Seu hino, contudo, foi ouvido em silêncio e aplaudido no fim da execução.

Matutei mais sobre o ser humano, e olhei para um camelô apregoando a bandeira do Brasil por R$ 10. Pensei: se tivéssemos perdido, não cobrariam mais de R$ 3, e o risco de encalhe seria grande. Lei da oferta e procura.

Antes de pegar o metrô, cujas catracas foram abertas sem exigência de pagamento, cheguei à conclusão sobre a esperança para o ser humano: pode ser que sim, pode ser que não, há controvérsia. Depende do dia. Isto é, nada concluí.

O chocolate de 6 a 0 da seleção brasileira sobre a hondurenha se descortinou pelo meio-dia e meia, quando o escrete dirigido por Rogério Micale batia bola, na preparação para a partida de uma da tarde.

Ao menos para quem acha que poucas coisas combinam tanto quanto o futebol e a música que o celebra.

Os DJs das arenas Rio 2016 andam inspirados. Na noite de anteontem, no Engenhão, os alto-falantes tocaram ''Singing In The Rain'' quando a chuvarada despencou. Clichê? Talvez. Mas um encanto.

Neymar e companhia aqueceram ao som de ''Fio Maravilha'', na voz de Jorge Ben.  E de ''É Uma Partida de Futebol'', do Skank.

Durante a semifinal, o público cantarolou ''Aquarela do Brasil'' e, no embalo da quarta-feira de inverno com pinta de verão, ''Cidade Maravilhosa''.

Uma tarde com a luz irradiada desde o gramado. A julgar por hoje, pertence ao passado longínquo a equipe que não conseguiu marcar um só gol na África do Sul e, valha-me, Deus, no Iraque.

O gol de Neymar com poucos segundos _14, fico sabendo em casa_ facilitou. Mas ele só saiu porque a seleção se determinou a sufocar a saída de bola oponente. De primeira, já deu certo.

O time todo jogou bem, mas é inegável que Neymar se sobressaiu. Um gênio caçado a pontapés.

Este blog reitera desde sempre o mantra: Neymar não é problema, é solução.

Outro prazer é assistir a Marquinhos, zagueiro clássico, que dificilmente perde no mano a mano e distribui passes redondos. Ele fez gol. Não é à toa que há anos o Barcelona sonha em arrancá-lo do PSG.

Para quem só tinha visto o time olímpico pela TV, observá-lo ao vivo permite entender melhor a armação básica. Depois dos quatro da linha de defesa, há três linhas de dois. Os volantes-meias Wallace e Renato Augusto, o maestro. Mais na frente, Gabriel Jesus aberto na esquerda e Gabigol na direita. Entre a primeira e a última linhas ficam Neymar pela esquerda e Luan pela direita, mais centralizados. Estes dois giram o tempo todo, alternando socorro aos de trás, armação para os da frente e infiltrações em direção ao gol.

Luan, muito bem, e Neymar são os maiores trunfos, pois imprevisíveis, para confundir a marcação.

Honduras não passa de um timeco, mas a seleção foi mesmo exuberante.

A torcida empurrou, no entanto não é a que acompanha futebol. Na primeira etapa, com o time com a bola de pé em pé, dando um show, duas sonoras vaias foram escutadas. É possível que os jogadores tenham pensado que eram os destinatários. Não eram. O público condenava quem preferia ver o jogo a participar da ''ola'' mais apropriada para peladas que aborrecem. Tudo bem, sai na urina.

Ainda grogue com o 7 a 1, os brasileiros gritaram ''Alemanha, pode esperar, a tua hora vai chegar!''.

Nem o placar de 14 a 2, em eventual final com os alemães, apagaria o 7 a 1. O futebol olímpico é importante, mas está distante da relevância da Copa do Mundo.

A seleção brilhava no sol covarde do começo da tarde, e eu lembrava que 20 anos atrás estava nem Athens, onde cobri nossa derrota na semi para a Nigéria, que neste momento enfrenta a Alemanha por um lugar na decisão de 2016. Em Atlanta-1996, acabamos com o bronze. Agora é hora do ouro.

Sobre o ser humano eu mantenho as dúvidas.

Para o futebol brasileiro, como o Maracanã solar evidenciou, eu sei que há esperança.

(O blog está no Facebook e no Twitter )