O atentado em Nice e a Olimpíada da incerteza
Mário Magalhães
Logo depois da divulgação na França da suspeita de que a delegação do país aos Jogos do Rio venha a ser alvo de atentado com participação de brasileiro, o terror voltou a atacar e matou ao menos 84 pessoas em Nice.
A considerar o que se ouve desde ontem à noite nas ruas, no metrô e nos elevadores, o morticínio na Riviera Francesa aumentou o receio dos cariocas de que a Olimpíada seja palco de ataque. Muita gente com bala na agulha para ingressos havia desistido de comprá-los. O horror além-mar, às vésperas da cerimônia de abertura aqui, amplia a incerteza.
A cidade está tomada de agentes de inteligência e segurança das nações que enviarão atletas e autoridades. Em outros eventos de grande dimensão, da conferência Rio-92 à Copa do Mundo, não houve problemas graves, ao menos para os visitantes. O patrulhamento numeroso, com a presença de tropas das Forças Armadas, costuma inibir a violência cotidiana que nos assola antes e depois dos encontros e competições. O que há de diferente em 2016 é o medo do terrorismo.
A imagem dos integrantes da Força Nacional dormindo em colchões comprados por eles próprios estimula a sensação de improviso e insegurança. O governo não havia providenciado nem camas. Parte do efetivo submeteu-se a regras dos bandos paramilitares que controlam o condomínio onde os policiais se alojam. Se não dão conta nem da milícia, como enfrentarão eventuais terroristas? _eis o que pergunta o senso comum.
Contudo o monitoramento, a prevenção e o combate ao terrorismo não são da alçada direta da Força Nacional. São poucas as informações sobre os movimentos dos agentes brasileiros e estrangeiros, o que é compreensível em se tratando de serviços secretos. O mistério reforça a incerteza.
Não são poucas as incertezas sobre a Olimpíada. Deixando para lá os abutres, que torcem contra, e os bobos da corte, que aplaudem até maracutaia, há raras certezas. Uma delas é que o Rio perdeu oportunidade histórica para seu desenvolvimento social.
As instalações para as competições estão quase prontas, com contas a escrutinar e atrasos. Mas ninguém pode descartar, para ficar num exemplo, mortandade de peixes na lagoa Rodrigo de Freitas (toc, toc, toc). Lá ocorrerão provas de remo e canoagem.
A turma que bolou a cerimônia de abertura e o elenco escalado indicam uma noite linda no Maracanã. O temor é que outras coisas atrapalhem. Sem falar na derrota que é abrir os Jogos no estádio que rendeu, de acordo com executivos da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, 5% de propina ao ex-governador Sérgio Cabral, o que equivaleria a R$ 60 milhões do pornográfico R$ 1,2 bilhão consumido na reconstrução.
Tudo ou quase tudo, do que ainda é possível a essa altura, pode dar certo.
O problema é que pode não dar.
Incerteza, eis o que é a Olimpíada a 21 dias do começo.