Cadê Cabral?
Mário Magalhães
Não que sejam injustas as manifestações que se ampliam no Rio contra o governador licenciado Luiz Fernando Pezão e o governador em exercício Francisco Dornelles.
Mas elas não fazem justiça plena à história quando omitem ou subestimam a condição protagonista de Sérgio Cabral, o artífice supremo das políticas que empurraram o Estado à bancarrota, às vésperas dos Jogos Olímpicos.
A indigência descrita no decreto de calamidade pública assinado por Dornelles e sentida no cotidiano dos cidadãos é fruto do que o antigo governador semeou.
Foi Cabral quem indicou seu vice para sucedê-lo, bem como quem abençoou a chapa com Dornelles secundando Pezão. Indicara Eduardo Paes para concorrer à Prefeitura do Rio. Costurou os acordos que permitiram até há pouco a convivência desarmada entre os próceres do PMDB fluminense _ele, Paes, Pezão e o cada vez mais influente Jorge Picciani, presidente da Assembleia Legislativa.
Em vez aproveitar o boom do petróleo e outras commodities para o desenvolvimento social do Rio, Cabral viveu os dias de dinheiro farto em relações promíscuas com empresas privadas.
A farra na França com o empreiteiro Fernando Cavendish retratou o despudor.
As ditas delações premiadas de executivos da Odebrecht e da Andrade Gutierrez informam a tabela que estimulava a excitação em convescotes como o parisiense: o governador embolsaria propina de 5% do orçamento nominal das obras públicas.
No Maracanã, em cuja reconstrução foi dilapidado R$ 1,2 bilhão, o agrado teria alcançado R$ 60 milhões.
A empreitada foi tocada pelas duas construtoras cujos funcionários agora denunciam corrupção de Cabral, mais a Delta de Cavendish.
Gente próxima a Sérgio Cabral vinha dizendo nos últimos tempos que tudo o que ele desejava daqui em diante era gozar a vida. Sem ambições políticas maiores, ao menos eleitorais.
Desde as Jornadas de Junho de 2013, quando centenas de milhares de pessoas o xingaram, o antigo governador sabe que suas possibilidades nas urnas se extinguiram.
Para emplacar na eleição de 2014, Pezão teve de esconder o padrinho. Só levou devido à rejeição de Marcelo Crivella, decorrente do vínculo do senador com a Igreja Universal do Reino de Deus.
Cabral tornou-se carente de votos, não de poder. O tipo sorridente que gargalhava com Lula articulou os votos da bancada do PMDB do Rio para defenestrar Dilma Rousseff.
Com Cavendish em cana, cresce o perigo para ele, que permanece entocado _e intocado. Já não circulava pelas ruas, por temer reações.
De vez em quando é lembrado. Na semana passada, professores da Uerj protestaram no Leblon em frente ao prédio onde mora o ex-governador. Gritaram ''não tem arrego/ você tira o meu salário/ e eu tiro o seu sossego''.
Não é esse, contudo, o tom geral. Dornelles exerce ou aparenta exercer o governo, Picciani pretende sucedê-lo num arranjo dias após a Olimpíada, Pezão luta para sobreviver. E Sérgio Cabral?
O ex-comunista, ex-tucano e eternamente dono de alma peemedebista continua sumido, sem se pronunciar sobre a ruína do Estado.
Ninguém é tão responsável por tantas desgraças como ele, ainda que os sócios sejam numerosos.
É hora de Sérgio Cabral falar.
E de responder à Justiça, para ser condenado ou absolvido.
Cadê Cabral?