Último presidente dado a mesóclises foi Jânio Quadros. Golbery era fã delas
Mário Magalhães
A certa altura do discurso de ontem, Michel Temer saiu-se assim: ''Como menos fosse sê-lo-ia pela minha formação […]''.
Empregou mesóclise, definida pelo ''Houaiss'' como ''colocação do pronome oblíquo átono entre o radical e a desinência das formas verbais do futuro do presente e do futuro do pretérito (p.ex.: vê-lo-ei, contar-me-ás)''.
Temer poderia ter dito de maneira mais clara o que quis dizer, mas isso é com ele.
Duas anotações históricas.
Até onde a memória alcança, o último presidente dado a mesóclises foi Jânio Quadros, que assumiu e renunciou em 1961. A renúncia foi manobra para um golpe de Estado que não prosperou. ''Fi-lo porque qui-lo'', dizia Jânio, ao menos lhe atribuíam tal tirada que contém erro gramatical. Pinguço notório, teria explicado por que bebia com disposição: ''Bebo porque é líquido. Se fosse sólido, comê-lo-ia''.
O general Golbery do Couto e Silva, prócer da ditadura, também era vidrado numa mesóclise.
Não era exclusivo da turma mais à direita o recurso à mesóclise. Ela estava incorporada à língua de tribunos considerados cultos.
Parece-me elegante, mas ouvindo velhas gravações do século 20. No 21, cheira a mofo. Cheira e é.
No ''sê-lo-ia'' da pregação temeriana _ou temerosa ou temerária_, um retrato do governo que querem impor ao Brasil.
Pela primeira vez desde a ditadura, nenhum ministro é mulher. Só ministro, sem ministra.
No aniversário dos 128 anos da Abolição, nenhum ministro negro.
Para ministro do Gabinete de Segurança Institucional, o general Sérgio Etchegoyen, saudosista da ditadura.
Em comparação com tamanho anacronismo, a mesóclise passadista é o de menos.