Arquivo do SNI guardou entrevista do Zico em 1978: bom de bola, bom de cama
Mário Magalhães
Curiosidade histórica, não mais que um rodapé na memória da ditadura: o Serviço Nacional de Informações guardou em seu arquivo entrevista do Zico publicada em 1978 pelo jornal ''Repórter''. O título amalgamava quatro ingredientes _futebol, sexo, política e humor_ característicos da receita editorial do tabloide carioca: ''Zico é bom de bola, de cama e quer votar''.
Faz tanto tempo que o craque supremo ainda não havia sido campeão brasileiro e mundial pelo Flamengo. O presidente era o general-de-exército Ernesto Geisel. Lançado no ano anterior, ''Repórter'' era um periódico de oposição. E o SNI existia, espionando a vida alheia, reprimindo a expressão de ideias e conspirando contra a democracia. Entre os seus agentes, muitos pareciam não ter o que fazer, como indica o zelo em incorporar o bate-papo com o Zico ao acervo da arapongagem.
Não havia eleição direta para presidente, e vivia-se a iminência da indicação do novo ditador. Pergunta: ''E quanto à sucessão? Você acha certo um sucessor nomeado?''. O Zico respondeu: ''Eu acho que a gente deveria votar''. Em seguida, elogiou o governo por regulamentar a profissão de jogador de futebol.
Ao falar de sexo, ''Repórter'' indagou: ''E qual é a sua média, hein? O Ancheta [zagueiro uruguaio do Grêmio] diz que dá nove por semana''. O Galinho: ''Jogando quarta e domingo, não dá pra essa média''. Entrevistador: ''Você é bom de cama?'' Zico: ''Pergunta a ela [mulher dele]. Mas eu acho que sou. Pelo menos, me considero. Agora, também durmo pra caramba (ri). Não tenho problemas na cama, não''.
O servidor do SNI não sublinhou com a caneta manifestação política do Zico, contra (simpático à eleição direta para presidente) ou a favor (elogiando medidas boas para os boleiros) do governo. O araponga destacou a pergunta que mencionou a goleada do Ancheta.
Um registro: o Zico não dava maior atenção à política. Embora tivesse tido um irmão, Nando, e uma prima, Cecília, presos pela ditadura (ela, torturada). Conforme testemunhos, o camisa 10 acabou cortado da seleção olímpica de 1972 em virtude do parentesco.
Outro: dei com a entrevista do Zico ao mergulhar nos arquivos do SNI, garimpando matéria-prima para um novo livro. Havia milhares de páginas para conferir (encontrei ouro puro), mas não resisti a parar a pesquisa e ler o pingue-pongue com o Galo, no ano em que ele completava 25 anos.