Blog do Mario Magalhaes

Arquivo : maio 2013

Parentes de vítimas temem pizza na CPI da boate Kiss
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Mário Magalhães

Integrantes do Movimento Santa Maria do Luto à Luta; Carina Corrêa é a quinta, da esq. para a dir.

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Em Santa Maria (RS)

Enquanto cumprimentava o pessoal do Movimento Santa Maria do Luto à Luta, eu imaginava o parentesco de cada um com a gurizada morta na tragédia da boate Kiss. Como logo se confirmaria, havia primas, irmãs, amigas e um pai _logo chegou outro. Diante do ar adolescente de Carina Corrêa, cogitei que ela tivesse perdido a irmã.

Thanise, uma moça bonita de 18 anos, parecia mesmo sua irmã, um pouco mais nova. Era assim que as pessoas as reconheciam quando as viam caminhando serelepes pelas ruas da cidade. Mas a estudante de filosofia não era irmã de Carina, a auxiliar em nutrição que, aos 34 anos, há muito se despediu da adolescência. Thanise era sua filha.

Carina foi mãe aos 15 anos. Empenhada em iniciativas que reivindicam punição dos responsáveis pelo incêndio que matou 242 pessoas, ela conta ter ouvido de uma autoridade impaciente com as cobranças por justiça: “O que eu tenho a ver com os filhos de vocês?”.

Hoje, Carina veste a camisa negra com o mote, citação de Cazuza, do movimento que rejeita as acusações de partidarismo proferidas por correligionários do prefeito Cezar Schirmer (PMDB): “Meu partido é um coração partido”.

Foi com o coração partido que Marília Torres Ribeiro, a idealizadora do grupo, fez duas promessas em seguida à morte da prima Flávia, filha única de 22 anos, e outras quatro amigas: “Cuidar da minha tia e lutar por justiça para as gurias. Porque não foi fatalidade, foi assassinato”.

Um mês depois do horror de 27 de janeiro, Marília e seus companheiros mobilizaram 2.500 pessoas em uma passeata contra a impunidade. Ela leu seu discurso: “[…] Vidas que nos foram roubadas, tiradas por negligência do serviço público, por falta de fiscalização das autoridades ditas competentes e pela ganância de alguns ‘empresários’ da noite”. Alertou, sobre a Comissão Parlamentar de Inquérito criada pela Câmara Municipal para investigar o incêndio: “É nossa obrigação enquanto cidadãos fiscalizar, acompanhar e exigir que essa CPI mascarada que foi instalada não acabe em pizza”.

É o que eles têm feito, embora as ilusões desvaneçam. “Vai sair uma pizza grande”, prevê Flávio José da Silva. “Se depender dessa CPI, jamais haverá justiça.” Andrieli, aluna de cursinho pré-vestibular filha de Flávio, festejara 22 anos três dias antes de perder a vida na Kiss.

A apuração sobre os responsáveis pela tragédia foi tocada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público. Caberia à CPI esquadrinhar as falhas do serviço público que permitiram à boate funcionar sem condições de segurança e identificar responsáveis. O propósito é prevenir que episódios semelhantes se repitam na cidade.

“O problema é que blindam as pessoas que poderiam enfrentar um julgamento político, como o prefeito, secretários e demais agentes públicos”, observa o advogado Rodrigo Dias, representante do movimento. “A CPI só está refazendo o trabalho que já foi feito pela polícia e o Ministério Público”, lamenta Sérgio da Silva.

Filho de Sérgio, Augusto, de 20 anos, concluiria a faculdade de direito em agosto de 2014, se não tivesse morrido em meio ao fogo e à fumaça. Sérgio é um dos diretores da Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria, primeira entidade surgida das cinzas da madrugada de 27 de janeiro.

O receio de frustração com a CPI cresceu devido a uma decisão da semana retrasada, de não convocar para depor os dois proprietários da Kiss que estão presos. Como se Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann não tivessem nada a esclarecer sobre as relações que mantinham com funcionários públicos para manter a boate aberta.

Presidente da CPI, a vereadora Maria de Lourdes Castro (PMDB) alegou que cabe à Justiça as sanções criminais, enquanto a comissão da Câmara deve se debruçar sobre o papel da prefeitura. Na sessão da CPI de 9 de maio, Maria de Lourdes afirmou que Santa Maria “tem que voltar a sorrir”. E pediu aos “formadores de opinião” que não recorram à tragédia para “fomentar o ódio”.

“Também queremos seguir a vida, mas depois que houver justiça”, retruca Vanessa Vasconcellos, segurando sua cuia de chimarrão que é abastecida diariamente por três garrafas térmicas com água quente. Sua irmã Letícia, funcionária da Kiss, deixou órfãos filhos de 13 e seis anos. “Há vereadores que dizem que é vingança, ódio nosso, mas é democracia”, argumenta Carina Corrêa, que organizou um ato pelo impeachment do prefeito.

A manifestação mais recente do Movimento Santa Maria do Luto à Luta reuniu 500 pessoas, um quinto da primeira. Carina diz que um dia desses uma pessoa que considera exacerbada sua pregação disparou: “Lugar de mãe é chorando, e não fazendo protesto”.

Outro lado

Presidente da CPI, a vereadora Maria de Lourdes Castro, 56, sustenta que boa parte das críticas se origina de incompreensão sobre as atribuições da comissão: “A CPI visa fazer uma investigação de fatos, ações e omissões administrativas que podem ter levado à tragédia”.

Não haverá pizza porque, ela afirma, “a CPI não tem competência para julgar ou condenar alguém. Ela analisa o que levou a isso, oferece sugestões para que não volte a acontecer”.

Na quarta-feira vão depor mais quatro fiscais do município _oito já foram ouvidos. “Chamamos pessoas das secretarias de Mobilidade Urbana e de Finanças, que foram direta ou indiretamente responsáveis pela legislação, pela autorização e pela fiscalização.”

A vereadora rebate a acusação de blindagem política: “Se tu fores ver todas as pessoas que falaram na CPI vais ver que não existe interferência nenhuma. Tudo o que foi feito [para liberar a Kiss] foi legal. O problema é que a lei é pífia, absurda”. De acordo com Maria de Lourdes, um decreto municipal de 2002 permite a estabelecimentos como a boate incendiada funcionarem precariamente. A CPI proporá a mudança das leis relativas ao tema.

A presidente diz que a CPI resolveu por unanimidade não convocar os donos da Kiss porque eles “são réus, respondem a processo-crime, não haveria por quê. As perguntas que querem fazer para eles podem ser feitas no Judiciário. Não se poderia permitir que houvesse interferência do Legislativo no Judiciário e do Judiciário no Legislativo. Acreditamos na competência de cada Poder”.

Parentes das vítimas haviam assinalado que a CPI poderia indagar a respeito de eventual pagamento de propina a servidores públicos. “Então por que nada foi dito sobre isso no inquérito policial?”, questiona a vereadora.

Os três membros da CPI são da base do prefeito.  Além de Maria de Lourdes, do PMDB, há um vereador do PP e um do DEM. A presidente aponta partidarismo em certos críticos. “Não aceito que uma tragédia desse tamanho sirva de palco para disputas políticas.”

O prefeito Cezar Schirmer será chamado a depor, mas a CPI já concluiu que todos os procedimentos para emissão do alvará da boate Kiss respeitaram a lei.

 


Nara, por Janio
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Mário Magalhães

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Pena, pena mesmo, que o colunista Janio de Freitas não trate mais vezes de assuntos alheios à aridez da política, sua matéria-prima há décadas. Na leitura mais saborosa do fim de semana, o jornalista evocou a cantora Nara Leão (1942-89). “Nara é enlevo, e pode ser saudade”, escreveu.

Janio é o autor das célebres capas dos dois primeiros discos da artista, em meados dos anos 1960: “Opinião de Nara” e “O canto livre de Nara”. Em um artigo no domingo, ele lembrou que a contracapa do primeiro LP e a capa do segundo não saíram exatamente como ele as desenhara.

“O sucesso de Nara foi rapidíssimo”, recordou Janio. “Mas sucesso da moça que gostava de cantar. Nara não passou a ser ‘a cantora’. Nada de roupas feitas para os shows, penteados e maquiagens arquitetônicos, arranjos decorativos no camarim. Nenhuma pose teatral. Todo o jeito só do jeito dela. Suave em tudo, em tudo meiga”.

O artigo foi publicado ontem, por ocasião do lançamento de uma caixa com 13 CDs de Nara. Um deleite para começar a semana, o texto de Janio de Freitas pode ser lido aqui.


Mão grande sobre a Marina da Glória
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Mário Magalhães

A Marina da Glória, deslumbrante, à direita – Foto TurisRio

 

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O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional decide na primeira semana de junho se preservará as características originais do aterro do Flamengo e da Marina da Glória ou se vai ceder ao projeto do empresário Eike Batista, que pretende erguer um centro de convenções no lugar.

O colunista Elio Gaspari tratou do tema no domingo, no texto intitulado “Eike busca mais uma vitória”. Um trecho:

“No dia 4 de junho, reúne-se em Brasília a Câmara Técnica do Iphan que julgará a conveniência da construção, no parque, de um auditório de 900 lugares, com 50 lojas e 600 vagas para automóveis. No dia seguinte o Conselho Consultivo da instituição dará a última palavra a respeito do assunto. Trata-se de autorizar uma edificação numa área tombada pelo próprio Iphan, onde não podem ser acrescentados equipamentos urbanos estranhos ao projeto original do arquiteto Affonso Reidy. Nele não há centro de convenções”.

Se vingar o plano de Eike Batista, o aterro ganhará outro trambolho, depois da casa de shows edificada diante do Museu de Arte Moderna, um atentado visual contra o MAM, também obra de Affonso Reidy.

Gaspari contribuiu para a transparência do processo no Iphan, dando nomes e sobrenomes de quem baterá o martelo. Sua coluna pode ser lida na íntegra aqui.


A primeira página que nasceu clássica
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Mário Magalhães

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Eis a capa do jornal argentino “Página 12” no sábado, noticiando a morte do genocida Jorge Rafael Videla, ex-ditador do país:


A assassina não gostava de segundas-feiras
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Mário Magalhães

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Na manhã da segunda-feira 29 de janeiro de 1979, uma garota de 16 anos invadiu uma escola fundamental em San Diego, matou dois adultos a tiros e feriu oito crianças e um policial. Presa, Brenda Ann Spencer reconheceu os crimes e conversou com um repórter, que indagou sobre seus motivos. A assassina teria respondido: “Eu não gosto de segundas-feiras”.

Em excursão aos Estados Unidos com sua banda de então, The Boomtown Rats, o cantor irlandês Bob Geldof chocou-se com o episódio da Califórnia e compôs uma canção sobre ele. Intitulou-a “I don’t like Mondays”, a suposta resposta da criminosa ao jornalista.

A música se transformou em um hit mundial (para ouvir, clique na imagem acima). E no hino informal dos que odeiam as segundas-feiras e, em boa parte, ignoram a origem sangrenta da inspiração de Geldof.


Governo Videla queimava corpos de opositores em fornos de hospitais, mostra documento secreto no Brasil
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Mário Magalhães

De bigode, na primeira fila, o ditador Videla; ao seu lado, João Havelange

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Morreu o ex-ditador argentino Jorge Rafael Videla. Tirano com viés nazistoide, o general acumulou perversidades em seus tempos de poder, quando, só para lembrar, trocava salamaleques com o presidente da Fifa, João Havelange.

Ao contrário do que muita gente pensa, não foram abertos os arquivos da repressão argentina. Os acervos de 1976 a 83 foram destruídos ou escondidos. Sumiram. Restaram muito poucos documentos do horror.

Acabei por descobrir no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro uma preciosidade histórica: um relatório da Força Aérea Brasileira, da época da “nossa” ditadura, nítida tradução de original argentino, dando conta de um “problema” em 1977. A ditadura vizinha atirava corpos mutilados de oposicionistas no rio da Prata, mas os cadáveres desaguavam no Uruguai, causando constrangimentos. A “solução”: passaram a cremá-los em fornos de hospitais.

O documento foi revelado na “Folha de S. Paulo” em maio de 2000. No dia seguinte, o jornal “Página 12”, de Buenos Aires, noticiou a matéria e tascou o título na capa: “Auschwitz argentino”. Eis a íntegra da reportagem que escrevi:

*

O regime militar da Argentina (1976-83) sumia com os corpos de opositores de esquerda assassinados pelas forças de repressão jogando-os no rio da Prata ou cremando-os em fornos de hospitais públicos.
Essa afirmação consta do informe confidencial nº 013/A-2 do 3º Comar (Comando Aéreo Regional), da Aeronáutica.
O relatório foi escrito num formulário do Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica) no dia 11 de agosto de 1977, com o título “Evolução da Luta Anti-subversiva na Argentina – Período de Janeiro a Maio de 1977”.
A Folha encontrou uma cópia guardada no Arquivo Público do Estado do Rio. Sobre o papel, foi impresso o carimbo “Ministério da Aeronáutica, 2ª Seção do Estado-Maior, 3º Comando Aéreo Regional”.
O último parágrafo do texto de duas páginas diz: “Dado que o lançamento de cadáveres no estuário do rio da “Plata” causa, vez por outra, problemas no Uruguai, com o aparecimento de corpos mutilados nas praias, estão sendo empregados fornos crematórios de hospitais estatais para cremação de subversivos abatidos”.
Informado ontem pela Folha sobre a existência do relatório da Aeronáutica, o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul, Jair Krischke, disse que essa é a primeira vez que aparece, no Brasil ou na Argentina, um documento relatando os métodos de desaparecimento de militantes argentinos.
“No Brasil, nunca se conheceu um documento sobre isso”, disse Krischke. “Na Argentina, o que existiram foram depoimentos de pessoas que participaram da repressão. Não vieram a público documentos dos órgãos de informação falando a respeito dos desaparecimentos.”
Krischke lembrou um livro de um ex-integrante do aparato repressivo argentino contando que corpos de oposicionistas eram jogados no mar. “Mas não havia documentos.”
O informe da Aeronáutica dá mais pistas sobre o fenômeno do sumiço de corpos na Argentina: “A imprensa noticia que, entre 1º de janeiro e 31 de maio (de 1977), foram abatidos 325 subversivos, número este que está muito aquém da realidade, pois, somente em confrontos, entre 24 e 29 de maio, mais de cem subversivos foram mortos, tendo sido noticiados apenas 32”.
O que o relatório indica é o seguinte: em cinco dias, no máximo uma em cada três mortes se tornou pública.
Os outros dois terços podem não ter tido as mortes registradas, com o consequente desvio dos corpos.
Há vários indícios de que a fonte dos detalhes apresentados pelo 3º Comar foram órgãos repressivos argentinos. No começo, o texto registra que “esta agência tomou conhecimento e difunde o seguinte informe”.

Portunhol 

O rio da Prata é chamado de “Plata”, em espanhol. O líder da Juventude Universitária Peronista José Pablo Ventura, “abatido”, não é descrito como líder ou cabeça da organização, mas como “cabecilha”, do castelhano “cabecilla”.
Outra militante assassinada (“abatida”, para os militares brasileiros) foi Norma Inês Cerrota, “responsável sindical” da Coluna Sul do maior grupo de guerrilha argentino, os Montoneros.
“Responsável sindical”, tradução literal de nomenclatura empregada pela esquerda em francês e espanhol, significa “líder sindical” no Brasil.
Com entusiasmo, a Aeronáutica afirma que “os grandes êxitos que vêm alcançando as Forças Armadas e de segurança são derivados, em parte, do grande número de subversivos (cerca de 200 no último mês) que desertaram e se apresentaram àquelas forças, que deles obtêm informações sobre os movimentos dos subversivos, em troca de garantia de suas vidas”, conforme o documento.
A Argentina foi o país do Cone Sul com maior número de desaparecimentos políticos nas ditaduras militares.
A Comissão Nacional de Desaparecidos comprovou 8.961 casos, de acordo com Jair Krischke.
A organização Mães da Praça de Maio e outras entidades de defesa dos direitos humanos estimam o número em 30 mil.
A colaboração entre o regime militar do Brasil (1964-85) e o da Argentina foi intensa.
No sábado, a Folha publicou uma lista de 149 argentinos procurados em território brasileiro, em 1976, a pedido do governo daquele país.
Em 1975, foi criada a Operação Condor, uma ação conjunta de combate a militantes de esquerda que reuniu os governos militares de Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e Bolívia.
Antes da Condor já havia colaboração intensa entre as Forças Armadas da América do Sul.


Quem será o próximo otário a apostar em Luxemburgo?
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Mário Magalhães

O tempo passou na janela, e só o Vanderlei não viu

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Como se sabe, o “Luxemburgo” no meio do nome de Vanderlei da Silva é um tributo de seu pai, comunista, à militante polaco-alemã Rosa Luxemburgo, assassinada em 1919. Rosa era uma revolucionária. Seu xará tropical parece que parou no tempo, sem evoluir, um conservador.

O homem que parou no tempo assistiu de camarote à eliminação de sua equipe na Libertadores. Não estava no banco porque, feito um iniciante encrenqueiro, meteu-se em confusão depois de uma classificação sacramentada, e lhe tascaram um gancho.

Do camarote, testemunhou o Grêmio só se defender, como evidentemente planejara. É uma maldade contra o chileno Vargas responsabilizá-lo pela derrota de 1 a 0 para o Santa Fé, por ter perdido o gol salvador pouco antes do fim. O problema é que o time só atacou no final.

Claro que o trabalho de Luxemburgo no clube porto-alegrense não deve ser julgado só por ontem. E sim pelo conjunto da obra, como o fiasco no Gauchão 2013. Ou o revés em casa para o Huachipato, na Libertadores. Ou os surtos suicidas do zagueiro Cris, (ex) jogador avalizado por Luxemburgo.

Tudo com um elenco caríssimo, capaz de render muito mais.

Fracassos como o da Libertadores não são novidade para o técnico nos últimos anos. É só perguntar aos torcedores de Flamengo, Atlético-MG e Santos _não vale considerar campeonatos estaduais, pequenos demais para quem tem o cartel e a banca de Luxa. O Vanderlei de hoje é um simulacro do técnico que já encantou o país.

É difícil identificar quando sua carreira degringolou, mas suponho que a decadência esteja relacionada à ambição desmedida de administrar esferas de poder muito além das de um treinador. Perdeu o foco, esqueceu de estudar. O tempo passou na janela, e só Luxemburgo não viu. Hoje são muito mais eficientes profissionais como Tite, Abel, Mano, Cuca, Muricy, Oswaldo… a lista é extensa.

Nem por isso Vanderlei pena na rua da amargura, pois há sempre um clube disposto a lhe pagar salários estratosféricos em “projetos” que resultam em naufrágio, como agora com o Grêmio da Libertadores.

Talvez a arrogância caricatural do ex-lateral-esquerdo tenha um efeito sedutor inimaginável para seres normais. Mais provável é a crença dos dirigentes em um gênio da lâmpada que aparecerá para reconduzir Vanderlei à era de sucessos.

Vanderlei Luxemburgo não tem com o que se preocupar. Sempre haverá cartolas crédulos _eufemismo para otários_ dispostos a bancar seus “projetos”. Seja no Grêmio, continuando para o Campeonato Brasileiro, seja bem longe do Rio Grande do Sul.


Estética do frio
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Mário Magalhães

O catador Ricardo, quando os termômetros marcavam 8 graus hoje de manhã, em Pelotas (RS)

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Em Pelotas (RS)

O trabalhador da foto acima se chama Ricardo, tem 43 anos e é catador de garrafas pet. Topei com ele e sua bicicleta às 9h15 de hoje em Pelotas, a pouco mais de uma hora _de carro_ do Uruguai, quando o sol enganador não impedia os termômetros de marcarem 8 graus. De madrugada deve ter feito 3 graus, caso tenha se confirmado a previsão.

Ricardo tinha começado a trabalhar à meia-noite, recolhendo material nos sacos de lixo nas calçadas. Ganha R$ 5, R$ 6 em média por dia. Se a sorte o acode, fatura “oito pila”, como me contou.

O tempo virou pelo meio-dia de ontem, quando uma ventania e um temporal inspirados nos romances de Gabriel García Márquez castigaram a cidade. Em um município vizinho, onde visitei uma fábrica de doces, faltou luz, porque o vendaval derrubou dois postes de energia.

Eu caminhava pelos casarões do século 19 em torno da praça central de Pelotas, o mais espetacular conjunto arquitetônico neoclássico do Sul do país, no instante em que o tempo virou. Como soube depois pelos meteorologistas, a temperatura em 60 minutos despencou de 25 para 14 graus. A queda de 11 graus me surpreendeu com roupa leve, e acabei tendo de comprar um agasalho às pressas.

A expectativa é que amanhã faça zero grau. No sábado, 1 negativo.

Pela segunda divisão do Campeonato Gaúcho, o Brasil de Pelotas recebe hoje à noite o São Paulo, de Rio Grande, no primeiro dos dois jogos que valem um lugar no Gauchão de 2014.

E o compositor Kleiton Ramil lança um livro. Kleiton é irmão de Vitor Ramil, também compositor, músico, cantor e escritor. Foi Vitor quem elaborou a sacada da “estética do frio”. Deu-se conta de que a arte nascida numa terra às vezes gélida como esta tem características muito próprias, estranhas às de lugares quentes como a Bahia. Está coberto de razão.


Nos 50 anos do golpe, só antigos opositores da ditadura vão disputar eleição presidencial
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Mário Magalhães

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No ano em que o golpe de Estado de 1964 completará meio século, as eleições presidenciais do ano que vem terão monopólio de antigos opositores da ditadura que vigorou por 21 anos.

Todos os candidatos mais badalados até agora combateram, com maior ou menor intensidade, o regime instaurado com a derrubada do governo constitucional do presidente João Goulart. São eles:

Dilma Rousseff (PT): nos tempos da ditadura, a presidente que deve buscar a reeleição militou na Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop), nos Comandos de Libertação Nacional (Colina, agrupamento armado), na Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares (VAR-Palmares) e no PDT. Foi presa política e torturada.

Lula (PT) – Alternativa do Partido dos Trabalhadores para 2014, o ex-presidente se tornou figura pública nacional como líder metalúrgico, a partir das greves operárias do ABC, no final da década de 1970. Foi preso devido à militância sindical e política. Fundou o PT.

Marina Silva (Rede Sustentabilidade) – Caso consiga tornar viáveis seu projeto de partido e sua candidatura, a ex-ministra concorrerá pela segunda vez ao Planalto. Durante o regime encerrado em 1985, ela militou no Partido Revolucionário Comunista (PRC, mesma sigla de José Genoíno e Tarso Genro) e no PT.

Aécio Neves (PSDB) – O então jovem Aécio foi fiel acompanhante do avô oposicionista, Tancredo Neves. Recentemente, o senador tucano chamou a ditadura de “Revolução”, como fazem veteranos partidários dos governos militares, mas voltou atrás.

Eduardo Campos (PSB) – É neto de Miguel Arraes, governador de Pernambuco cassado pelo golpe de 1964, preso e exilado. Como Aécio, combateu a ditadura ao lado do avô, que regressou ao Brasil com a anistia de 1979.

José Serra (PSDB ou MD) – O ex-governador de São Paulo é uma opção pouco provável a Aécio Neves no PSDB, mas pode trocar de agremiação pelo MD, novo partido do antigo comunista Roberto Freire. Quando ocorreu a deposição de Jango, Serra presidia a União Nacional dos Estudantes (UNE) e integrava a organização de esquerda Ação Popular. Partiu para o exílio, voltou em 1977 e se incorporou à oposição em atividade no país.

Luciana Genro (PSOL) – A ex-deputada federal começou a militância ainda na adolescência, na Convergência Socialista, corrente trotsquista do PT que mais tarde seria a semente do PSTU.

Chico Alencar (PSOL) – Outro nome do PSOL para o pleito de 2014. Professor de história no ensino fundamental e médio e membro das redes católicas de esquerda, Chico foi um opositor ativo da ditadura, concentrando a militância no movimento de associações de moradores, até ingressar no PT.

José Maria de Almeida (PSTU) – Se o habitual candidato do PSTU vier a disputar a Presidência novamente, será outro velho opositor no páreo. Metalúrgico e sindicalista no ABC, foi preso com Lula na virada da década de 1970 para a de 80. Era um dos dirigentes da Convergência Socialista, tendência que passou muitos anos no PT e mais tarde deu origem ao PSTU.

Não está descartado que algum candidato nanico em 2014 tenha sido adepto da ditadura ou que a evoque positivamente. Seria a exceção confirmando a regra.

O fenômeno de candidatos antiditadura vem se consolidando. Em 1985, José Sarney, que atravessara quase todo o período pós-1964 como governista, herdou o cargo de presidente com a morte do oposicionista Tancredo Neves, que vencera a eleição no Colégio Eleitoral. No primeiro pleito direto em quase três décadas, Fernando Collor, antigo partidário da ditadura, levou em 1989. Foi o ultimo presidente desse espectro político.

Seu vice, Itamar Franco, herdou a cadeira de presidente depois do impeachment de Collor em 1992. Itamar fora parlamentar do velho MDB. Em 1994 e 98, Fernando Henrique Cardoso, outro opositor da ditadura, venceu as eleições. Sobrevieram os triunfos de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002 e 2006, e mais tarde o de Dilma, em 2010.

O fenômeno permite algumas conclusões. Ao contrário do que alardeiam veteranos correligionários da ditadura, inexiste em segmentos amplos da sociedade brasileira sentimento nostálgico em relação àqueles tempos. Esse sentimento sobrevive em guetos. Caso contrário, haveria algum candidato disposto a capitalizar a “saudade” pela era de repressão política. Candidatos saudosos da ditadura tentam cargos parlamentares, e não majoritários, porque têm consciência de não ter chances de sucesso.

Lição principal: o balanço que os brasileiros fazem dos 21 anos de ditadura é negativo. A ditadura fez mal ao Brasil, como se lembram os mais velhos e descobrem os mais novos. As viúvas da ditadura são como torcedores de certos clubes de futebol, que fazem muito barulho, mas são poucos.


Gente honesta
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Mário Magalhães

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A foto acima foi feita na semana retrasada pela repórter Cleo Guimarães e publicada na coluna “Gente Boa”. Mostra Ana de Hollanda no ônibus da linha 432, que liga o bairro de Vila Isabel ao da Gávea. A cantora embarcou à noite na rua Prudente de Moraes, em Ipanema.

Até oito meses atrás, Ana de Hollanda exercia o cargo de ministra da Cultura, com todas as regalias que essa condição confere.

O flagrante da Cleo atiçou minha memória. Num dos muitos períodos intercalados em que morei em Copacabana, eu pegava todo santo dia o metrô, na então única estação do bairro, rumo à Cinelândia, em cujas cercanias trabalhava.

Volta e meia batia o olho em um senhor espichado e careca que em alguma estação do meio do caminho entrava no vagão. Era Roberto Saturnino Braga, político de larga trajetória, prefeito do Rio de 1986 a 88.

O raciocínio pode não ter muita sofisticação política, mas eu pensava: se um cabra desses anda de metrô, feito um assalariado como eu, é porque deve ser honesto, não enricou na prefeitura.

Era tão honesto que, quando a cidade faliu na gestão de Saturnino, Millôr Fernandes o classificou como “o homem que desmoralizou a honradez”.

Em um tempo pré-Constituição de 1988, os municípios ainda não tinham recursos como agora, e outros obstáculos também prejudicaram o prefeito. Mas ficou evidente que lhe faltava para o Executivo o mesmo talento que sempre exibiu no Legislativo.

Ana de Hollanda também não foi bem-sucedida como gestora, no Ministério da Cultura. Sua administração foi severamente criticada, inclusive por partidários do governo Dilma. Ignoro se com razão.

Ruins ou não de governo, Saturnino e Ana deixam uma lição, no metrô ou no ônibus: é possível ocupar funções públicas que mexem com fortunas e continuar andando de metrô, ônibus ou em carros com padrão igual ao de antes de assumir. Basta querer.