Blog do Mario Magalhaes

O sonho não acabou: Mr. Lam, o restaurante de Eike Batista, continua divino

Mário Magalhães

Guerreiro em terracota, na entrada no restaurante Mr. Lam, no Rio

Guerreiro em terracota, na entrada no restaurante Mr. Lam, no Rio

 

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A OGX rendeu uns pingos de óleo e olhe lá. Triturou o sonho de Eike Batista de se tornar o terráqueo mais endinheirado. E consumiu um naco das economias de uma vizinha gente boa aqui do prédio, que comprou por 18 reais ações que se desmilinguiram até valer 13 centavos.

A MMX entregou muito menos minério do que prometera. Com o colapso da petroleira e o fiasco da mineradora, a holding desabou. O empresário com alma de garimpeiro, o apostador que apostou errado, alardeara todos os empreendimentos em “estado da arte”, porém nada era o que parecia.

Nada? Rematada injustiça. O restaurante Mr. Lam, às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, sobrevive como o único reduto de sucesso no inventário de fracassos de Eike. Concedendo aos clichês, é a derradeira joia da coroa do que um dia deu a impressão de constituir um império, mas não passava de tigre de papel.

Mais de três anos depois, regressei sábado à noite à casa de decoração kitsch, embrulhada para nouveaux riches, construída sobre barras de cobre. Dado a ouvir conselhos de cartomantes e bruxas, Eike mandou instalar o cobre por inspiração do feng shui. Pelo visto, a providência de fato espantou más energias. Terá sido das barras subterrâneas o mérito por impedir outro revés?

A primeira surpresa foi ver o estabelecimento lotado, com fila até quase a meia-noite. Não é novidade que Eike investiu 8 milhões de reais no negócio que nunca se pagou. A clientela farta evidencia que a imagem de validade vencida do dono não contaminou seu restaurante.

Será que os comensais buscavam testemunhar a decadência em forma de comida? Ou queriam visitar o Mr. Lam antes que venha a fechar, soterrado pelas ruínas do Grupo X? Quando os pratos chegaram o mistério se desfez: a excelência da cozinha chinesa sobrevive às demais derrotas do antigo conglomerado, como um jogador que consegue brilhar solitariamente em um time que despenca para a terceira divisão.

Quase tudo continua uma maravilha: os espetinhos de frango (melhor) e camarão (talvez tenha sido cozido sem casca, o que rouba sabor) com um molho branco misterioso; os rolinhos primavera; as lulas do Olin (empanadas, receberam o nome de um filho de Eike); e o sqwab (frango cortadinho e molho adocicado que o cliente enrola em folhas de alface americana).

Tudo em várias porções, de novo e de novo. Quando todos à mesa se sentem empanturrados, arriscam uma última concessão à gula, os noodles de frutos do mar. O macarrão chinês fininho é devorado até não restarem vestígios. De sobremesa, o falso ovo frito, no qual o maracujá se finge de gema, e a clara de mentirinha é uma cocada branca mole (no cardápio, intitula-se “uhn ehggi”).

O maior trunfo do restaurante é a cozinha povoada por chineses, importados pelo grande cozinheiro Mr. Lam, que vive longe do Brasil. Eike o descobriu em Nova York. Deliciou-se tanto com o chef que o trouxe para oferecer no Rio as iguarias consagradas nos Estados Unidos. A predileta do empresário quebrado, ele me contou certa vez, é o satay de frango, os divinos espetinhos (leia aqui o  perfil de Eike Batista que eu escrevi em 2009).

Outra vantagem do Mr. Lam é que, embora perfile entre as melhores casas cariocas e deixe para trás os concorrentes (ditos) asiáticos, seus preços ficam aquém dos do restaurante mais simples de Claude Troisgros (CT Trattorie) e são muitíssimos mais baixos que os do Gero, do Antiquarius e do Cipriani.

Éramos cinco à mesa redonda. Com o consumo de água mineral italiana e quatro garrafas de vinho tinto francês beaujolais, além de cerveja, a conta somou 1.045 reais, ou 209 por cabeça, incluindo a gorjeta. Hoje como antes, o serviço se mantém de primeira.

Se a OGX mostrou que Eike Batista nada entende de petróleo, o Mr. Lam sugere que o empresário é bom de boca. Se pensar somente no restaurante ainda ótimo, talvez ele possa fantasiar que o seu sonho não acabou.