Blog do Mario Magalhaes

Falta d’água no Rio do século… 19. Marc Ferrez fotografou obras
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Mário Magalhães

Neste século 21, não há dia sem notícia de falta d'água no Grande Rio, quase sempre castigando os mais pobres. Com ameaça de faltar ainda mais, por causa dos reservatórios com sede. No século 20, a marchinha fez a crônica do ''Rio de Janeiro, cidade que me seduz, de dia falta água, de noite falta luz''. O problema vem de antes. De passagem pelo Arquivo Público do Estado do RJ, dei com a exposição de algumas fotos do carioca Marc Ferrez. A que está abaixo (de 1889, informa a Brasiliana Fotográfica) retrata obra de canalização do rio São Pedro, no tempo em que _conta texto na imagem seguinte_, ''no século 19, o Rio de Janeiro sofria com a falta de água''. Naquela época, São Pedro ajudava. Hoje, colocam a culpa nele.

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"Obras provisórias para canalização do rio São Pedro" - Foto Marc Ferrez/Aperj

''Obras provisórias para canalização do rio São Pedro'' – Foto Marc Ferrez/Aperj

Texto do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro contextualiza foto acima

Texto do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro contextualiza foto acima


‘Eu não anistiei ninguém’, cantou Renato Russo
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Mário Magalhães

 

No dia em que a Lei da Anistia completa 36 anos e num tempo em que a impunidade dos agentes da ditadura ainda incentiva a reedição da barbárie, o blog lembra ''La Maison Dieu'', música do disco ''Uma Outra Estação'', da Legião Urbana.

Alguns versos:

Eu sou a lembrança do terror
De uma revolução de merda
De generais e de um exército de merda
Não, nunca poderemos esquecer
Nem devemos perdoar
Eu não anistiei ninguém

Eis a íntegra da composição de Renato Russo, gênio da raça, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá (para ouvir, basta clicar na imagem lá do alto):

Se dez batalhões viessem à minha rua
E 20 mil soldados batessem à minha porta à sua procura
Eu não diria nada
Porque lhe dei minha palavra
Teu corpo branco já pegando pelo
Me lembra o tempo em que você era pequeno
Não pretendo me aproveitar
De qualquer forma quem volta
Sozinho pra casa sou eu
Sexo compra dinheiro e companhia
Mas nunca amor e amizade, eu acho
E depois de um dia difícil
Pensei ter visto você
Entrar pela minha janela e dizer:
''Eu sou a tua morte''
Vim conversar contigo
Vim te pedir abrigo
Preciso do teu calor
Eu sou
Eu sou
Eu sou a pátria que lhe esqueceu
O carrasco que lhe torturou
O general que lhe arrancou os olhos
O sangue inocente
De todos os desaparecidos
Os choque elétrico e os gritos
– Parem por favor, isso dói
Eu sou
Eu sou
Eu sou a tua morte
E vim lhe visitar como amigo
Devemos flertar com o perigo
Seguir nossos instintos primitivos
Quem sabe não serão estes
Nossos últimos momentos divertidos?
Eu sou a lembrança do terror
De uma revolução de merda
De generais e de um exército de merda
Não, nunca poderemos esquecer
Nem devemos perdoar
Eu não anistiei ninguém
Abra os olhos e o coração
Estejamos alertas
Porque o terror continua
Só mudou de cheiro
E de uniforme
Eu sou a tua morte
E lhe quero bem
Esqueça o mundo, vim lhe explicar o que virá
Porque eu sou
Eu sou
Eu sou

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Lei da Anistia: impunidade de agentes da ditadura estimula chacinas de hoje
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Mário Magalhães

Campanha da anistia não defendeu anistiar torturadores – Foto Jorge Araújo/Folhapress

 

A fotografia acima recebeu o Prêmio Esso em 1979. Ela documenta manifestação em São Paulo da campanha da anistia. Seu autor é Jorge Araújo, um dos mais brilhantes repórteres fotográficos brasileiros de todos os tempos, com quem tive a sorte, gracias a la vida, de tabelar por anos a fio. O Jorge é tão bom que continua no auge. O cara não tem, ao contrário de tantos craques, fase ruim.

Ninguém naquele protesto (a não ser os espiões infiltrados) advogava anistia para os agentes da ditadura que perseguiam, torturavam, matavam e sumiam com corpos de cidadãos, quase tudo à margem até da lei imposta pela ditadura parida em 1964. A anistia era para os milhares de brasileiros que haviam sido julgados, presos, cassados & caçados, estuprados, banidos, expulsos, seviciados, humilhados, violentados, punidos das mais diversas formas. A campanha democrática exigia ''anistia ampla, geral e irrestrita''.

Hoje a Lei da Anistia faz 36 anos. Em 28 de agosto de 1979, o ''Diário Oficial da União'' publicou-a, assinada pelo general-de-exército João Baptista Figueiredo, presidente da República sem nem um voto popular, e ministros da ditadura. Não foi nem ampla, nem geral, nem irrestrita, mas permitiu aos oposicionistas deixarem as cadeias (alguns tiveram de esperar meses), à maioria dos exilados regressar, a (poucos) trabalhadores reassumirem seus trabalhos.

A ditadura convencionou que os funcionários públicos que haviam violado os direitos humanos também estariam protegidos pela Lei da Anistia. Estariam abrigados na expressão ''crimes conexos''. Papo furado: não há uma só palavra na norma que se pronuncie, para ficar num exemplo, sobre tortura. Logo, torturador não foi anistiado. Tortura, estabelece a legislação internacional, é crime imprescritível.

A ditadura considerou que havia se auto-anistiado. Essa interpretação recebeu respaldo anos atrás do Supremo Tribunal Federal, que pode mudar, se provocado, tal decisão. O que a ditadura fez e se mantém foi consagrar a impunidade de criminosos que, com salários pagos pelos contribuintes, cometeram crimes de lesa-humanidade como a tortura.

Ao contrário do que se supõe, a exigência de punição para torturadores e outros bandidos a serviço do Estado não diz respeito a arqueólogos. A impunidade imposta no passado estimula a reedição da barbárie.

Policiais militares que torturavam (torturam?) moradores da Rocinha na dita Unidade de Polícia Pacificadora contavam com a impunidade para praticar tal crime. Num dia de 2013, torturaram o pedreiro Amarildo, mataram-no e desapareceram com seu cadáver. É provável que agora haja castigo. Mas os PMs faziam o que faziam supondo que, mire-se a tradição, ficariam impunes.

Idem com chacinas como a que resultou na morte de ao menos 19 pessoas neste mês em São Paulo. Se a cultura do não-vai-dar-em-nada inexistisse ou fosse menos arraigada, dificilmente policiais e comparsas perpetrariam um massacre como esse.

Na Alemanha, no Camboja, na Sérvia, na Argentina, em muitas nações os violadores dos direitos humanos no século XX ainda são punidos, mesmo por crimes que parecem distantes.

É pegadinha da história: só parecem distantes, porque, quando se eterniza a impunidade, vitamina-se hoje o impulso bárbaro que seria mais contido em caso de punição exemplar para servidores públicos criminosos.

Quanto mais impunidade _vale para tortura, corrupção e outros crimes_, maior a chance de repetição.

No 36º aniversário da Lei da Anistia, está na hora de, mesmo atrasado, o Brasil cansar de ser o país dos impunes e julgar os agentes da ditadura.

Não deixa de ser um acerto de contas civilizatório com o passado.

Mas é muito mais um projeto de futuro de democracia, tolerância e dignidade.

Lugar de torturador, de ontem e de hoje, é na cadeia.

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Em mais um ano sem título, o Flamengo colhe o que plantou
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Mário Magalhães

A bola vai chegar para Rafael Silva marcar de cabeça

A bola vai chegar para a cabeçada do vascaíno Rafael Silva: 1 a 1

 

Pelas seis da manhã, o filho de oito anos se levantou, vestido com a camisa do Flamengo com que dormira, e perguntou sem dar nem bom dia, antes da notícia ruim:

''Quanto foi o jogo?''

Horas antes, sacramentada a eliminação rubro-negra na Copa do Brasil, o irmão vascaíno torpedeara: ''Freguês''.

No começo da partida, depois do gol contra de Madson, Flamengo 1 a 0, o irmão gremista mandara outra mensagem: ''Que confusão, hein!''.

Confusão no gol controverso e em seguida mais confusão ainda no time que vencia. Em meia hora, o Flamengo perdeu seu maior trunfo ofensivo, Guerrero, e a aposta, Ederson, para a bola chegar camarada ao ataque. Ambos contundidos. O futebol ficou confuso e indigente, com aqueles chutões para a frente que têm chance de resultar em gol igual à do nosso bilhete de rifa ser premiado.

Com Oswaldo de Oliveira, o Flamengo venceu domingo o São Paulo no Campeonato Brasileiro e empatou ontem em 1 a 1 com o Vasco. Ainda sob o comando de Cristóvão Borges, perdera para a equipe cruzmaltina o primeiro confronto do mata-mata. Fica, renovando a rotina, pelo caminho. Com mais um gol sofrido em bola aérea, repetiu o feito-defeito das seis partidas anteriores.

O Flamengo foi sobrepujado pelo lanterninha do Brasileiro. Sem Brasileiro e Copa do Brasil, acumula mais um ano sem título nacional. Em 2015, também sem o Estadual. Só os otimistas desbragados acham que dá para alcançar uma vaga na Libertadores, assim como há de ser pessimista tarja-preta para temer o rebaixamento.

A nova temporada de reveses é consequência da gestão do clube. A diretoria parece ter transformado o equilíbrio das contas, relevante e urgente, em fim em si mesmo. Como se o futebol fosse coadjuvante.

Não é problema exclusivo de orçamento. Muitas agremiações, com menos dinheiro que o Flamengo, montaram times mais competitivos. A cartolagem rubro-negra, tabelando com seus executivos e treinadores, sobretudo Vanderlei Luxemburgo, contratou um elenco com fragilidades notórias. É incrível que antes do Brasileiro tivesse expectativa de disputar a cabeça. Colhe o que plantou.

Guerrero e Ederson foram buscados durante o Brasileiro, às pressas, para evitar fiasco maior. Quando eles deixaram o campo, a ambição de jogar com a pelota no chão virou frustração. Permitir ao Vasco controlar a bola não é para qualquer um, há que se superar em jogo ruim. E velocidade, sem qualidade nos passes, não basta.

O Vasco teve méritos para vencer. O que não impede o registro factual: dos três gols do mata-mata, apenas um foi sem dúvida decorrente de jogada ilegal, o tento vascaíno no 1 a 0.

Outro pitaco pontual: Emerson disse no intervalo que o juiz é ''um merda''. Certamente será punido pela justiça desportiva. Reitero: castigar manifestação de opinião é medida inconstitucional, fere direito democrático garantido pela Carta de 1988. Não é porque o Sheik está no Flamengo. Nos tempos dele no Botafogo, eu já pensava a mesma coisa. Os árbitros também querem os seus caraminguás pelas transmissões, como ''artistas do espetáculo''. Então, que possam ser criticados, como um ator canastrão ou um cineasta… de merda. Quem se sentir ofendido que recorra à Justiça comum. Chega de sufocar a liberdade de expressão. Para não dizerem que fiquei em cima do muro, concordo com o conteúdo da avaliação do Sheik, que levou uma botinada, a falta foi marcada a favor do agressor, e o atacante de pavio curto ainda recebeu amarelo. Como definir tal juiz?

Para um 2016 mais generoso, há que superar a inépcia da atual cartolagem do Flamengo, agora dividida em duas chapas para a eleição vindoura. O caminho é profissionalizar mais a administração. Mas com a diretoria recrutando executivos eficientes e vitoriosos. Caso contrário, vamos continuar dando más notícias às crianças rubro-negras.

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Desviando
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Mário Magalhães

Esquina de Nossa Senhora de Copacabana com Bolívar, aqui no Rio

Esquina de Nossa Senhora de Copacabana com Bolívar, aqui no Rio


Persiste, firme e sem pudor, o Brasil do ‘sabe com quem você está falando?’
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Mário Magalhães

Como contar uma história

Como contar uma história

 

Com dezenas de multas de trânsito no currículo, 14 delas por embriaguez ao volante, o empresário Ivo Nascimento de Campos Pitanguy atropelou e matou na quinta-feira o operário José Fernando Ferreira da Silva. Testemunhas asseguram que Pitanguy estava bêbado. Ele passou alguns dias em cana, mas não demorou para sair. A Justiça mandou soltá-lo, com base na apreciação do Ministério Público, que divergiu da Polícia Civil no fundamental. A polícia indiciou o atropelador por homicídio doloso _ao dirigir alcoolizado, assumiu o risco de matar. Mas a denúncia da Promotoria classificou o homicídio como culposo, aquele sem intenção. Em suma, adeus, cadeia pública.

Um taxista contou que em seguida ao acidente (crime?), em vez de socorrer o atropelado, o motorista tentou ligar seu carro (para fugir?). Só se aproximou do operário agonizante quando bombeiros e PMs chegaram. Quando o taxista lhe pediu para desligar o motor, Pitanguy reagiu assim, informou o repórter Sérgio Ramalho: ''Tu sabe quem eu sou?'' Insistiu: ''Tu sabe quem eu sou?''

Antes mesmo de ler Roberto DaMatta eu já sabia, pelo meu pai, aluno dele, das considerações do antropólogo sobre o Brasil do ''sabe com quem está falando?'' como retrato da distinção entre brasileiros e brasileiros. O episódio na Gávea escancara a manutenção da diferença, ainda que o país de hoje seja um pouco menos desigual (o presidente da maior empreiteira nacional está em cana) que o dos tempos em que DaMatta teve a grande sacada.

Pitanguy estava com a carteira de motorista em dia, mesmo com 14 flagrantes de falta gravíssima. Talvez tivesse mesmo seus motivos para indagar ''tu sabe quem eu sou?'' Ninguém sabia quem era o operário morto. Justiça igual para todos, reafirma o cotidiano, não passa de balela.

(O blog reproduz no alto a abertura da reportagem de Caio Barretto Briso e Gustavo Goulart publicada sábado em ''O Globo''. Mesmo na correria, é possível contar bem uma história.)

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Há 54 anos, Jânio renunciou, abriu crise e golpistas tentaram virar a mesa
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Mário Magalhães

Jânio Quadros, em foto clássica de Erno Schneider - Reprodução internet

Jânio Quadros, em foto clássica de Erno Schneider – Reprodução internet

 

Há 54 anos, como hoje, era Dia do Soldado. O 25 de agosto de 1961 entrou para a história por outro motivo, a renúncia do presidente Jânio Quadros (1917-1992). Eleito no ano anterior como o homem que varreria a corrupção, era um embuste. Estava no governo desde janeiro quando pediu o boné. Ao contrário do que narra a verve saborosa, não renunciou por conta dos efeitos do seu amigo fiel, o álcool. A interpretação mais verossímil é que Jânio saiu sonhando em voltar nos braços do povo, com mais poderes para sufocar um Congresso subjugado. Deu errado, e o Brasil entrou em crise.

Isso mesmo, a renúncia abriu uma baita crise.

Os comandante militares logo buscaram o golpe de Estado que havia sido abortado em 1954, com o suicídio do presidente Getulio Vargas, e em 1955, com a ação do general Henrique Teixeira Lott. O oficial legalista botou os tanques na rua para que o resultado da eleição recém-realizada fosse respeitado (foi assim que Juscelino Kubitschek assumiu democraticamente a Presidência).

Os golpistas tentaram impedir a liturgia constitucional, com a posse do vice, João Goulart. Fracassaram, mas influenciaram um conchavo ''parlamentarista'' que reduziu as atribuições de Jango. No comecinho de 1963, os cidadãos decidiram em plebiscito restabelecer o presidencialismo, com poderes plenos para Goulart. Até que, em 1964, o golpe enfim vingou, instaurando a ditadura que se arrastou por 21 anos.

Na crise de 1961, deflagrada com a renúncia do aventureiro Jânio Quadros, o marechal Lott foi preso por se pronunciar a favor da legalidade.

Naqueles dias, no bairro do Catete, agentes do Dops carioca colocaram abaixo a porta do apartamento onde vivia a militante comunista Clara Charf. Entraram de armas na mão e se retiraram, ao não encontrar o homem que caçavam, o ex-deputado Carlos Marighella. Clara gritou, temendo que, se não denunciasse a invasão, pudessem matá-la. Uma vizinha apareceu quando os tiras haviam partido e cometeu o humor involuntário:

''A senhora tem que chamar a polícia!''

Clara esclareceu:

''Mas foi a polícia que acabou de fazer isso!''

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São Paulo: Marcia Camargos e Carla Caruso lançam livro ‘Diálogos de Samira’
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Mário Magalhães

blog - diálogos de samira

 

Sempre tive, continuo a ter, aversão a livros que transformam matéria-prima fascinante em palavras aborrecidas que só por decreto impedem o leitor de se livrar delas. Por decreto entenda-se exigência escolar e acadêmica. O livro, didático ou não, que colégios e faculdades obrigam o aluno a ler, caso não queiram ser reprovados.

Da mesma forma, nunca entendi como alguém é capaz de, ao contar e ensinar histórias fabulosas, fazer com que quem as ouve peleje contra o sono e torça para a aula acabar logo. Existe gente assim, mas aposto que é minoria, responsável por muitos estudantes rejeitarem disciplinas encantadoras como história e geografia. O problema não é das matérias, mas do modo enfadonho como às vezes são ministradas.

O contrário de tudo isso é o livro de Marcia Camargos e Carla Caruso que está saindo do forno, ''Diálogos de Samira: Por dentro da guerra da Síria'' (Moderna).

Em São Paulo, o lançamento será nesta terça-feira, a partir das 19h, na Livraria da Vila (rua Fradique Coutinho, 915, Pinheiros).

Destinado a alunos do oitavo e nono anos do ensino fundamental, o livro infantojuvenil de ficção pode ser lido com interesse por qualquer pessoa, incluindo adultos (devorei-o inteirinho). É acompanhado por um roteiro para orientar o professor. Como é muito bem escrito, merece ser lido mesmo sem recomendação docente.

''Diálogos de Samira'' conta a troca de correspondência entre a menina do título, uma brasileira de 12 anos, e um garoto sírio, Karim, de 13, refugiado no Líbano. Karim e os pais deixaram seu país devido à guerra.

Em meio às histórias cotidianas e descobertas de cada um _Samira ainda espera seu primeiro beijo na boca_, as autoras reconstituem a tragédia na Síria e arredores. Contam a história da região séculos antes de Cristo e os devastadores confrontos bélicos e massacres contemporâneos. Apresentam os costumes e ideias do islamismo. E incentivam a tolerância com a diferença e os diferentes.

Marcia e Carla mostram como é possível educar, abordando assuntos complexos, sem fazer da educação um martírio. ''Diálogos de Samira'' é literatura prazerosa que também dá lições. Karim tem um segredo, que só ao fim da narrativa se revela. Os campos de refugiados estão repletos de meninos como Karim.

Abaixo, o blog reproduz o release da editora.

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Costumes e cultura do mundo islâmico são temas de novo livro da Editora Moderna

Assunto recorrente, obra mostra, por meio de ficção, a guerra na Síria e a situação dos povos que vivenciam esse conflito

Lançamento da Editora Moderna, Diálogos de Samira: por dentro da guerra síria é um infantojuvenil que trata de um tema atualíssimo. Por meio desta ficção, as autoras Marcia Camargos e Carla Caruso apresentam as visões e costumes de um garoto islâmico e uma menina brasileira.

O texto narra a história de Samira, que vive no Brasil, e Karim, obrigado a deixar Aleppo, sua cidade natal, e tudo o que mais gostava, para morar em um campo de refugiados no Líbano. Com 12 e 13 anos, respectivamente, os jovens correspondem-se por e-mails e cartas.

Situados em realidades diferentes, Samira e Karim trocam confidências e explicam um para o outro suas tradições, raízes culturais e expectativas, o que faz com que acabem olhando o mundo de outra forma.

Dirigido a adolescentes, o livro vem contribuir para melhor entendermos o universo islâmico e o conflito sírio, que se prolonga desde 2011. Ao final, traz um pequeno dicionário com expressões e palavras em árabe, além de definições de Al Qaeda, Estado Islâmico, Hezbollah, xiita, sunita e alauita, entre outros termos deste contexto sobre o qual muito se fala, mas pouco se conhece de fato.

Sobre as autoras

Marcia Camargos

Nascida em Belo Horizonte, em 2011 recebeu o titulo de cidadã paulistana, concedido pela Câmara dos Vereadores da cidade. Jornalista com pósdoutorado em História pela USP, é coautora de ''Monteiro Lobato: Furacão na Botocúndia'', prêmios Jabuti e Livro do Ano de 1998, pela CBL. Sócia da Usina de Conteúdo, produtora cultural especializada em temas brasileiros, tem 25 livros publicados para adultos e jovens.

Carla Caruso

Nasceu em São Paulo, e hoje vive entre sua cidade natal e Montevideo, no Uruguay. Conhecida escritora de livros infantojuvenis, é também ilustradora. Formada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Há dez anos trabalha como professora de literatura e criação literária em espaços públicos como bibliotecas, escolas e presídios. Recebeu o prêmio Abril de Jornalismo pela Edição Especial Almanaque Recreio (Ed. Abril, 2004) e ganhou o prêmio Jabuti, por Almanaque dos sentidos (Ed. Moderna, 2010).


Autor do furo sobre aeroporto em terra de parente de Aécio rebate cascatas
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Mário Magalhães

Vista do aeroporto de Cláudio, construído na gestão Aécio

Aeroporto de Cláudio (MG), construído na gestão do governador Aécio Neves – Foto Alexandre Rezende/Folhapress

 

Poucas incompreensões sobre o jornalismo são tão graves quanto confundir suas atribuições com as da polícia (que aponta suspeitos), do Ministério Público (acusa) e da Justiça (julga).

O papel social do jornalismo é informar.

Foi informação inédita, relevante e rigorosa que o repórter Lucas Ferraz ofereceu aos leitores e cidadãos no ano passado, em reportagem sobre a construção de um aeroporto na cidade mineira de Cláudio quando Aécio Neves era o governador de Minas Gerais.

O aeroporto foi construído com recursos públicos, em terras de parente do hoje senador.

O Ministério Público pediu o arquivamento da investigação. Em artigo publicado no domingo, Lucas Ferraz explica por que essa decisão deve ser cobrada _ou celebrada…_ dos promotores, e não do jornalismo. E desmonta, item por item, cascatas propagadas sobre o episódio.

O blog reproduz na íntegra o artigo do repórter, veiculado na ''Folha'':

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Inverdades sobre o aeródromo de Cláudio

O arquivamento do caso não apaga os fatos levantados e comprovados em uma investigação jornalística legítima e autônoma

Por Lucas Ferraz

O jornalista norte-americano Henry Louis Mencken, mestre das tiradas antológicas, cunhou uma, há quase um século, que caberia perfeitamente no Brasil destes tempos: ''É difícil acreditar que um homem esteja dizendo a verdade quando você sabe muito bem que mentiria se estivesse no lugar dele''.

Lembrei-me da frase de Mencken ao ler o artigo do deputado federal Domingos Savio (PSDB), publicado neste espaço no domingo passado (16), sobre a construção do aeroporto de Cláudio, em Minas Gerais, erguido em terras de um familiar do senador Aécio Neves (PSDB). A obra do Executivo mineiro foi concluída em 2010, no final do segundo mandato do tucano no Estado.

Citando o recente arquivamento de investigação do Ministério Público de Minas Gerais, que pela segunda vez apurou o caso e não encontrou irregularidades na construção da pista, o deputado cobra reparação a Aécio, que teria sido injustiçado por uma ''falsa acusação''. Classificando a reportagem de ''ficção'', ele escreve que a história ''não é'', como ''nunca foi'', verdadeira.

Ao defender o aliado, o presidente do PSDB de Minas omite e falseia deliberadamente informações que foram publicadas nesta Folha.

Logo ele, cuja atuação parlamentar se entrelaça com a história do aeródromo: o deputado batizou o local, por meio de lei aprovada no Legislativo mineiro, com o nome do finado Oswaldo Tolentino, um dos tios-avôs de Aécio e irmão de Múcio, o proprietário do terreno desapropriado para o aeroporto.

Todos os detalhes do episódio –a obra ao custo de R$ 14 milhões, a antiga pendência judicial pela posse da área, o funcionamento irregular e privado da pista, que era controlada por familiares de Aécio– foram relatados e documentados em reportagem de minha autoria, publicada em julho de 2014.

A 6 km da pista está a fazenda da Mata, da família do senador e um de seus refúgios preferidos, descrita por ele, à revista ''Piauí'', como o ''meu Palácio de Versalhes''.

Além de informações extraídas de documentos judiciais e do governo estadual –todos públicos–, duas fontes primárias foram fundamentais para sustentar o relato exposto no jornal. As declarações, gravadas, foram apagadas da memória de conveniência do deputado.

Domingos Savio afirma que, à época das reportagens, a gestão do aeroporto já era de responsabilidade da Prefeitura de Cláudio, que teria também as chaves da pista.

O que emerge da reportagem é outra coisa: o chefe de gabinete da prefeitura não soube explicar o funcionamento do aeroporto, pois este não era controlado pela administração municipal, mas, sim, pela família de Múcio Tolentino.

O filho de Múcio confirmou que a família tinha a posse das chaves. Disse que abriria a pista para quem precisasse utilizá-la, sem custo algum, e ressaltou: ''O aeroporto, para todos os efeitos, ainda é nosso''.

Quatro anos depois de ser construído, era esse o panorama do aeródromo: além do controle privado, ele operava de forma irregular, sem a homologação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

Todos esses fatos não sofreram reparo, nem judicial nem editorial. Houve só um equívoco, corrigido na seção ''Erramos'' do jornal: o aeródromo de Cláudio tem capacidade para receber aeronaves com no máximo 18 passageiros, e não 50, como citado na primeira reportagem.

O arquivamento do caso, que em si nada significa, não apaga os fatos levantados e comprovados em uma investigação jornalística legítima e autônoma.

O engraçado é que a segunda investigação da Promotoria mineira, instaurada após a revelação da Folha, ignorou todos os elementos expostos na reportagem. Talvez os promotores tenham alguma explicação.

Como diria Mencken, ''pode ser um pecado pensar mal dos outros, mas raramente será um engano''.