Blog do Mario Magalhaes

Se fosse Dilma ou Lula, Temer já teria caído
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Mário Magalhães

Um retrato na parede – Foto Kleyton Amorim/UOL

 

Notícia de dezembro, o que nesses tempos soa como pretérito mais-que-perfeito: ''O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, reuniu indícios de que o vice-presidente, Michel Temer (PMDB), recebeu R$ 5 milhões do dono da OAS, José Adelmário Pinheiro, o Leo Pinheiro, um dos empreiteiros condenados em decorrência do escândalo da Petrobras''.

Numa troca de mensagens, conforme Janot, ''Eduardo Cunha cobrou Leo Pinheiro por ter pago, de uma vez, para Michel Temer a quantia de R$ 5 milhões, tendo adiado os compromissos com a 'turma'''. A turma é outra turma do PMDB, agremiação integrada pelo antigo mandachuva da Câmara e pelo atual ocupante do Planalto.

Nesta quarta-feira, mais novidade. De acordo com depoimento de Sérgio Machado, peemedebista ex-presidente da Transpetro, o então vice Temer combinou com ele propina para campanha eleitoral de Gabriel Chalita. Machado é correligionário de Temer.

O ex-capo da subsidiária da Petrobras afirmou que Temer retomou o comando do partido em 2014 para administrar a partilha de R$ 40 milhões encaminhados por fora pelo PT (!), pois chefões do PMDB na Câmara e no Senado se digladiavam pelo butim.

Na investigação do mensalão, inexistiu descrição de participação direta do presidente Lula na bandalheira _o que não impede a especulação, legítima, sobre se houve ou não.

Nas falcatruas na Petrobras, não há denúncia de que Dilma tenha embolsado dinheiro.

Na dita delação premiada de Sérgio Machado, a presidente deposta não é mencionada, ao contrário de Temer.

É claro que os companheiros do ex-chefe da Transpetro só podem ser acusados e condenados se houver provas além da versão. Seja prova oferecida pelo próprio Sérgio Machado, seja colhida em apurações complementares.

Mas se evidenciam novamente tratamentos diferentes, dois pesos e duas medidas.

Se em vez de Michel Temer o personagem vinculado a valores como R$ 5 milhões e R$ 1,5 milhão fosse Dilma Rousseff ou Luiz Inácio Lula da Silva, a casa teria ido abaixo. Bradariam por deposição, renúncia. ''Fora com a corrupção!''

É possível que não diluíssem as declarações sobre o presidente-do-dia num pacote em que Aécio Neves às vezes recebe mais atenção que a pessoa no exercício da Presidência da República.

Talvez Renan Calheiros não ofuscasse o titular do Planalto, como hoje.

(Não que os dois senadores não mereçam atenção e escrutínio, muito pelo contrário.)

Dilma e Lula provavelmente já teriam caído. Ao menos, agonizariam.

Com Temer, o papo é outro.

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Cariocas usam luvas no outono invernal
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Mário Magalhães

Ano estranho, 2016 – Renato Stockler/Na Lata/Folhapress

 

Sei que para milhões de brasileiros não tem nada de mais calçar luvas para se proteger do frio. É hábito. Mas aqui no Rio, mesmo no inverno mais gélido, não se vê nas ruas gente de luva.

Eu havia lido na coluna do Ancelmo Gois que já existe camelô vendendo as ditas cujas.

Ontem à noite vi no metrô um adolescente com luvas de lã.

Hoje de manhã, uma funcionária de quiosque que cuida de sobrancelhas.

Outro dia o termômetro marcou oito graus na cidade.

Neste instante, o aplicativo meteorológico do celular informa que faz 18 graus.

Parece muito, muitíssimo menos, neste outono invernal.

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História: herança principal de Eduardo Cunha é Michel Temer no Planalto
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Mário Magalhães

Xifópagos, por Aroeira, hoje no Facebook

 

Engolfadas pela sofreguidão da história e contaminadas pela memória traiçoeira, muitas análises do revés de Eduardo Cunha no Conselho de Ética da Câmara têm omitido a herança mais relevante dos seus dias como deputado todo-poderoso: a influência decisiva para a substituição de Dilma Rousseff por Michel Temer no Planalto.

Seria tosco ignorar que certas forças sociais, políticas e econômicas foram determinantes para a deposição da presidente constitucional. Sem aquela coalização o impeachment não teria prosperado.

Sem a ação de Cunha, contudo, é provável que ainda nem tivesse sido votado na Câmara.

Não é preciso ter memória de elefante para lembrar as observações do deputado Paulinho da Força: ''Tá indo por causa do Eduardo Cunha. […] O impeachment só tá acontecendo por causa do Eduardo Cunha''.

Enquanto o marido de Cláudia Cruz abreviou a tramitação do impeachment, o Conselho de Ética atrasou a deliberação sobre o pedido de cassação dele por mentir sobre contas na Suíça. Mudaram a composição do conselho, acumularam chicanas, assistiu-se a adesões descaradas ou dissimuladas. O acordão pró-impeachment da presidente estabeleceu pactos para a salvação de Cunha.

O plano sacramentado por parlamentares acabou implodido pela Justiça. A mesma Justiça que demorou a se pronunciar sobre a saída de Cunha da chefia da Câmara, permitindo que ele presidisse a sessão farsesca de 17 de abril, alvejou-o com tantas bombas nos últimos dias que provocou constrangimento excessivo até para aliados do outrora mandachuva. Formar ao lado de Eduardo Cunha equivaleria, para alguns, a suicídio político. Não estavam a fim de se suicidar.

Mesmo afastado da presidência da Câmara, Eduardo Cunha influenciou decisões de Michel Temer, como a escolha do líder do novo governo, vinculado ao _ainda_ deputado do Rio.

Muita gente esquece o que não é irrelevante: Temer e Cunha são correligionários. O primeiro não seria hoje chamado de presidente se o outro peemedebista não se dispusesse a patrociná-lo.

No balanço sincero da história, registre-se que um deputado denunciado por crimes cabeludos foi indispensável para derrubar uma presidente contra quem inexiste acusação de gatunagem.

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Rio: quem avisa amigo é
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Mário Magalhães

blog - rio, planta

Rua Voluntários da Pátria, entre Dezenove de Fevereiro e Guilhermina Guinle, no Rio


O silêncio de Messi e a língua de Neymar
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Mário Magalhães

Um fala demais, outro, de menos – Foto Lluis Gene/AFP

 

Messi fala de menos, a considerar um monte de argentinos que gostariam que ele falasse mais, inclusive Maradona.

O silêncio lhe rende restrições e reticências.

Neymar fala demais, como demonstram as tonterias recentes.

Parece buscar, mais que restrições e reticências, aversão e antipatia dos brasileiros.

Pena.

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Papa Francisco e Obama apontaram ódio em Orlando. Itamaraty calou. Por quê?
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Mário Magalhães

 

Ao se pronunciar sobre o massacre a tiros numa boate em Orlando que provocou ao menos cinquenta mortes, Barack Obama empregou a palavra ''ódio''. ''Um ato de terrorismo é ódio'', disse o presidente dos Estados Unidos.

Idem o papa Francisco. Houve ''manifestação de caráter homicida e de ódio insensato'', afirmou o chefe do Vaticano, por meio do seu porta-voz.

A nota distribuída ontem pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil (no alto) cala sobre o caráter de ódio da ação terrorista na Flórida. Condena o ''ataque'', o ''ato de terrorismo'' e a ''barbárie assassina''.

De acordo.

É inaceitável, porém, o silêncio sobre o caráter também ou sobretudo homofóbico do massacre reivindicado pela organização conhecida como Estado Islâmico.

A casa noturna era frequentada pelo comunidade LGBT.

Ao omitir a homofobia em sua nota, o Itamaraty oculta o preconceito homofóbico.

Na melhor das hipóteses, o Ministério ignora o que ocorreu e não tem ideia do que uma agenda humanista e democrática exige para o século 21.

Na pior, procurou não contrariar deputados pregadores do ódio e da homofobia que integram a base política de Michel Temer.

Por que o Itamaraty calou sobre o ódio contra os gays?

Por quê?

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Poucas vezes a seleção retratou o tempo do Brasil como neste 2016 sombrio
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Mário Magalhães

Dunga: até quando técnico da seleção? – Foto Hector Retamal/AFP

 

Nem sempre a seleção retrata ou metaforiza o tempo do Brasil.

Em 1958, a primeira Copa papada combinou com a euforia dos cinquenta anos em cinco proclamados pelo presidente Juscelino Kubitschek.

Em 1970, a festa do tri, ao contrário, contrastou com as sombras e catacumbas da ditadura.

Neste 2016, a seleção é a cara do Brasil sombrio e desesperançado, cansado e triste.

Uma das poucas diferenças relevantes é que a seleção tornou-se previsível em seus malogros _ontem foi eliminada pelo Peru, na primeira fase da Copa América.

E o Brasil poucas vezes foi tão assustadoramente imprevisível.

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Sabáticas: Rua Nascimento Silva, 378
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Mário Magalhães

Na capa de disco, Renato Russo em frente ao prédio 378 da Nascimento Silva

 

Na entrada do pequeno prédio da rua Nascimento Silva, 107, duas placas celebram o local onde Tom Jobim, como eternizam os versos de Vinicius de Moraes, ensinou “pra Elizeth as canções de Canção do Amor Demais”. Era lá que Tom vivia no finzinho dos anos 1950, à altura do parto da Bossa Nova. Justíssima reverência.

Três quarteirões à frente, no outro lado da mesma rua de Ipanema, quem passa não vê homenagens. Porque inexistem. Mas a música também deve muito ao lugar. No apartamento 201 do edifício número 378, Renato Russo criou letras e melodias que seus contemporâneos não esquecem e as novas gerações descobrem encantadas.

Renato chegou em 1990. Enquanto ali morou, saíram três discos da Legião Urbana gravados em estúdio, além de dois exclusivos do líder da banda. Para o retrato da capa de um álbum, ele posou na porta estreita do prédio de três andares com fachada de tijolo aparente.

O apartamento conservado quase como estava duas décadas atrás não parece um museu. Nele a vida pulsa tanto que pode até constranger quem, com jornada mais longeva, não teve nem de longe a vida tão vivida de Renato.

Na sala, espalham-se treze caixas com preciosidades como desenhos feitos por Renato com giz de cera _de Isadora Duncan, Jesse James, Rimbaud. Há composições inéditas, peça de teatro, esboço de ópera, gravações, poemas desconhecidos. Tudo da lavra do morador de outrora.

E mais de cinquenta cadernos manuscritos, que expõem a carpintaria criativa, versão após versão, de clássicos como “Eduardo e Mônica”, composto antes da mudança para Ipanema. Esses diários reconstituem festas de arromba, esmiúçam amores e desamores, segredam bastidores do rock’n’roll. Trevos de quatro folhas resistem entre as páginas.

Em armários no corredor, permanecem as camisas estampadas vestidas nos shows. A biblioteca tem biografia de Jean Genet e livro com letras de Chico Buarque. Um quarto abarrotado de CDs e vinis guarda de Richard Wagner aos Menudos. Noutro, reparei que a cama de Renato era de solteiro, como a de Fernando Pessoa em Lisboa.

O tesouro da rua Nascimento Silva começou a ser conhecido numa coleção de livros de Renato editada pela Companhia das Letras. Só por hoje e para sempre, volume de estreia, contém os textos escritos durante uma internação para combater a dependência química.

Em setembro de 1996, a Legião lançou o disco A Tempestade. Renato, aos 36 anos, estava enfraquecido pela Aids. Ele cantou: “Hoje a tristeza não é passageira/ Hoje fiquei com febre a tarde inteira/ E quando chegar a noite/ Cada estrela parecerá uma lágrima”.

A Wikipedia informa que Renato morreu em casa um mês mais tarde, em outubro _faz vinte anos em 2016. Acho melhor corrigir: Renato Russo é imortal.

(MM, publicado originalmente na revista Azul Magazine, março de 2016)

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Com Messi em campo, fabricantes de bebidas energéticas perdem dinheiro
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Mário Magalhães

Nos 29 minutos em campo, três gols marcados, mais um criado – Foto Omar Torres/Getty/ESPN/UOL

 

Diego Armando Maradona perdeu a chance de ficar calado, ao aproveitar nesta semana seu encontro com Pelé _o que não consegue um bom cachê…_ para fustigar Messi, dizendo-o sem liderança.

Pode até ser, mas Messi é maior no futebol do que o gigante e genial Maradona. É mais jogador.

Na fim da noite de ontem e começo da madrugada de hoje, horário de Brasília, o craque supremo foi o antídoto mais poderoso contra o sono.

Ainda convalescendo de contusão, só entrou no segundo tempo e jogou 29 minutos contra o Panamá, pela Copa América, goleada da Argentina por 5 a 0.

Finalizou três vezes.

As três no gol.

E nas três anotou.

Além do hat-trick, criou a jogada de outro gol.

Quando Messi joga, os fabricantes de bebidas energéticas perdem dinheiro.

Para ficar acordado, não é preciso recorrer a elas e suas doses de cafeína capazes de levantar defunto.

Porque dormir com Messi em campo é impossível, ao menos para quem tem o futebol como paixão e devoção.

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