Blog do Mario Magalhaes

Museu do Barcelona aponta Messi como ‘o melhor jogador da história’
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Mário Magalhães

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Foto feita pelo blog em janeiro de 2014 no museu do Barcelona, no Camp Nou

 

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Em janeiro deste ano dei com uma novidade no museu do Barcelona que lá não estava na visita anterior: um setor em homenagem a Lionel Messi apontando-o, em catalão, castelhano e inglês, como ''o melhor jogador da história''.

Desde que foi introduzida, no ano passado, a reverência tem merecido aplauso de muitos e rejeição de outros tantos. Ao lado de uma fotografia de Messi barbudo, visual pouco comum no argentino com cara de bom moço, comemorando gol, um texto explica o critério da celebração:

''Lionel Messi foi premiado por quatro anos consecutivos com a Bola de Ouro da Fifa, o prestigioso prêmio que reconhece anualmente o melhor jogador do mundo. Messi é o único futebolista [entre os homens] que ganhou o troféu quatro vezes, um marco que o consagra como o melhor jogador da história.''

Pode ser.

Mas nos tempos de Di Stéfano, Puskas, Pelé, Garrincha, Beckenbauer, Cruijff, Zico e Maradona não havia a Bola de Ouro, ao menos nos moldes atuais. Por isso os feitos incontestáveis de Messi em sua geração, com os quatro galardões da Fifa, não podem ser comparados às medalhas individuais de outrora.

A hegemonia de Messi no futebol contemporâneo teve outra apoteose no orgástico triunfo do Barcelona por 4 a 3 sobre o Real Madrid, na capital espanhola. A Pulga colocou Neymar três vezes na cara do gol (numa o brasileiro sofreu o pênalti que redundou em gol e na justa expulsão de Sérgio Ramos), uma vez Iniesta (gol do manchego dono de vinícola), esteve duas vezes na cara do gol, desperdiçando as chances, e… marcou três vezes, depois do passe decisivo para Iniesta abrir o placar.

Desde ontem Messi é o maior artilheiro (20 gols) em clássicos Barça versus Real Madrid, superando Di Stefano (18), embora em menos partidas (o jovem 26, o veterano 30) e numa época em que o futebol tem menos gols.

Cristiano Ronaldo? O invejoso craque português é um aprendiz no cotejo com Messi.

Com 236 gols, o argentino passou o mexicano Hugo Sánchez e já é o segundo maior artilheiro do Campeonato Espanhol em todos os tempos.

Cada cabeça uma sentença: nunca vi um jogador melhor do que Messi. Joga mais que Maradona, Zidane, Romário, Ronaldinho Gaúcho e outros gigantes a que assisti (incluindo Zico, Beckenbauer e Cruijff).

Mas não vi o Pelé jogar (muito menos Di Stéfano). Ou melhor, vi, mas de quase nada me lembro. Conheço-o por alguns videoteipes e melhores lances. As estatísticas são difíceis de comparar, inclusive porque inexistem: quantas assistências Pelé deu na vida? Ninguém sabe. E há o essencial não mensurável: quantos caminhos para o gol de um companheiro cada um abriu levando consigo um ou mais marcadores? A subjetividade não é secundária: o futebol de ontem não é igual ao de hoje. Cientificamente, não dá para cravar, embora a maioria dos amigos que viram os dois considere o Pelé melhor.

Há outros candidatos. Ao ver no museu do Camp Nou a louvação a Messi, de quem é fã, o meu caçula, de seis anos, contrariou-se: ''Só esqueceram do Zico, né, pai?''.


Bellini e Almir Pernambuquinho: padrinho e afilhado, amigos para sempre
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Mário Magalhães

Almir e Bellini, nos tempos de Vasco – Foto reprodução Futebol de Todos os Tempos

 

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Em 1993, quando a morte de Almir Pernambuquinho completou 20 anos, escrevi na ''Folha'' uma reportagem sobre sua vida alucinante e seu esquecimento. A matéria acabou publicada também em ''Viagem ao país do futebol'' (DBA/1998), livro com fotos do Antônio Gaudério e textos meus.

O maior prazer na apuração foi conhecer o herói Bellini. Um cavalheiro.

Bellini se foi. Em reverência à sua memória e gratidão por suas façanhas, reproduzo o relato cujo protagonista é Almir, mas o grande amigo, daqueles para sempre, é Hideraldo Luiz Bellini.

Gracias, viejo!

* * *

Brigão, bom de bola e esquecido

Vinte anos depois de sua morte numa briga de bar, o jogador Almir Moraes Albuquerque, o Almir Pernambuquinho, foi esquecido no Rio. Os rastros da sua passagem por Copacabana, onde viveu em períodos intercalados nas décadas de 1950, 60 e 70, foram apagados.

Ao chegar ao Vasco em 1957, vindo do Recife, Almir foi morar no bairro onde a bossa nova nasceria. Aqui, inventou o futevôlei no fim dos anos 1960, rememora seu amigo de infância e confessor Fausto Neto. Num bar da avenida Atlântica, à beira-mar, assassinaram-no na madrugada de 6 de fevereiro de 1973.

“Só saio de Copacabana atrás de muito dinheiro ou morto”, costumava bravatear. Morreu como jogava, violentamente. Na antologia do esporte, Almir é o maior brigão da história do futebol brasileiro. Quebrou pernas, enfrentou no braço times inteiros e, com fúria e coragem, empurrou o Santos à conquista do bicampeonato mundial, em 1963.

Estaria completando 56 anos. Os vinte de sua morte passaram em branco. “A memória do país é assim”, lamenta o padrinho de Almir, o ex-jogador Bellini. “Sua memória no Rio se apagou”, confirma o jornalista Fausto Neto. “Uns poucos ainda falam dele nos botecos da rua Miguel Lemos”, conforma-se o cronista esportivo Hans Henningsen, espanhol celebrizado por Nelson Rodrigues como Marinheiro Sueco. Hans encontrava-se com Almir no Bar do Nicola, na rua Constante Ramos. Almir bebia cerveja. Um habitual vizinho ilustre de botequim, Nelson Rodrigues, só tomava cafezinho e água.

O Bar do Nicola é hoje o restaurante VinSanto. O Rio Jerez, bar onde Almir foi baleado na cabeça e morreu, mudou de nome para Sindicato do Chopp. No prédio onde morava Elói Lima, o Japonês, amigo de Pernambuquinho que sobreviveu à briga de 1973, ninguém se lembra dos dois. Os restos de Almir não estão mais no cemitério São João Batista, onde o corpo foi enterrado na gaveta 229 da quadra treze. Foram transferidos para o Recife em 1978, a pedido da família. As pegadas de Almir sumiram do Rio.

Homofóbico, ele ironicamente morreu no Rio Jerez, ao lado da Galeria Alaska, ainda hoje point de homossexuais e travestis. Numa mesa, gays disseram gracinhas e jogaram bolas de papel em Almir. Ele se levantou e deu um sopapo num. Logo foi chamado de covarde por três portugueses e uma argentina de uma mesa vizinha. Partiu para o pau _essa versão, colhida a quente pela polícia e pelos repórteres, foi comum a testemunhas que simpatizavam ou não com Almir, bem como aos garçons que assistiram ao pugilato e ao crime.

Quando o antigo jogador surrava o português José Salazar, o pai adotivo do rapaz, Artur Garcia Soares, disparou com uma pistola automática. A mesa de Almir tinha quatro pessoas. Ele e Alberto Russo morreram. Elói Lima foi baleado na perna. A namorada de Almir, Eunice Ferreira de Souza, escapou.

Dias depois da abertura do inquérito, o assassino confesso viajou para Portugal, e nunca mais se teve notícia dele. Os dois delegados do caso e o advogado de defesa já morreram. No Rio, poucos se lembram da história _e de Almir.

* * *

Antes de morrer, Almir deu o mais impressionante depoimento que o Brasil conheceu sobre os bastidores do futebol, publicado na revista Placar. Contou que ele e muitos outros se drogavam para jogar. “Tomei bolinha para enfrentar o Milan”, confidenciou, sobre a final do Mundial de 1963 no Maracanã, quando substituiu Pelé e se tornou o herói do título.

Na mesma partida, segredou, o árbitro argentino Juan Brozzi teria sido subornado pelo Santos e permitido a Almir “bater em quem quisesse”. Uma paulada de Pernambuquinho em Amarildo empolgou o time.

Suas garra e valentia contagiavam dentro e fora do campo. Ao ver da janela o jogador enfrentar uma turma inteira, João Saldanha, outro valentão, aderiu. “Botamos os caras pra correr”, escreveu o técnico e comentarista.

No Vasco desde 1957, Almir sagrou-se campeão carioca ao lado do zagueiro Bellini e do atacante Vavá. Foi companheiro fiel de Pelé no grupo que treinava para a Copa de 58. Durante a preparação, perdeu o entusiasmo e acabou cortado do time que triunfou na Suécia. “As cartas estão marcadas”, choramingava junto a Bellini, que até hoje discorda.

No Santos, foi reserva de Pelé. Jogou na Argentina e na Itália. Voltou ao Rio, pelo Flamengo, sendo campeão ao lado dos meias Carlinhos e Nelsinho, hoje treinadores.

Balearam-no duas vezes: na perna, em um entrevero de 1963 em Santos, e na cabeça, dali a dez anos, quando o mataram. Pernas, quebrou ao menos duas: uma de Hélio, do América, outra de Jadir, do Botafogo. Numa homenagem disparatada, recebeu do Jornal dos Sports um troféu do Certame de Técnica e da Disciplina.

Morreu aos 35 anos, separado da primeira mulher, e deixou um casal de filhos. No fim, mantinha-se com pouco dinheiro, do aluguel de dois imóveis que lhe restavam. Andava triste em fevereiro de 1973. No começo do mês, morrera atropelado seu amigo Perereca.  No velório, Almir pediu:

“Me leva contigo, Perereca.”

Almir colocou uma aliança em um dedo do amigo, solteiro, e outra no cadáver de uma mulher da sala ao lado. “É para ele não chegar sozinho ao céu”, sussurrou.

* * *

Na espetacular confissão que vomitou a Fausto Neto e Maurício Azedo, pouco antes de morrer, Almir registrou a mais notável catarse do futebol. O depoimento foi publicado em 1973 na Placar e editado no livro Eu e o futebol. Algumas frases:

“Eu fui um marginal do futebol.”

(Autodefinição sincera.)

“Dei-lhe [no goleiro Ubirajara, do Bangu] um soco no estômago. Ele caiu e se levantou logo para revidar, enquanto Ari Clemente me dava um soco. Eu estava cercado de jogadores do Bangu, mas fui enfrentando todos eles: um pontapé num, um soco noutro, uma corrida em cima do outro, até que todo mundo entrou na briga (…) Eu estava uma fera (…) Ia dando cacete em quem encontrava.”

(Sobre a final Flamengo x Bangu do campeonato carioca de 1966.)

“Amarildo vinha saçaricando, queria impressionar o público, estava naquela de mostrar que era o Possesso, apelido que ganhou na Copa do Mundo de 62. Mas possesso ali era eu. Corri em diagonal na direção dele, avisei ao Ismael e ao Mauro para fazerem a cobertura, disse logo que aquele era meu. ‘Deixa esse filho da mãe comigo! Agora ele vai ver!’ Foi um toco só. Ele caiu se contorcendo.”

(Sobre a final Santos x Milan, do Mundial de 1963.)

* * *

O pernambucano Almir era atacante, tinha dezenove anos e desembarcava no Rio. O paulista Bellini, oito anos mais, era um zagueiro consagrado. No ano seguinte, 1958, levantaria a taça Jules Rimet na primeira conquista de uma Copa do Mundo pelo Brasil. O primeiro era boêmio, e o segundo, avesso à noite de Copacabana. Tornaram-se grandes amigos, moraram juntos. O mais velho foi padrinho de batismo (!) e de casamento do mais novo.

O encontro de Almir com Bellini tinha tudo para dar errado, mas não deu. Além da amizade, venceram juntos no futebol. Em 1958, conquistaram o campeonato carioca pelo Vasco. Um ano mais tarde, brigaram juntos contra a seleção uruguaia, ganhando no braço e na bola (3 a 1).

Aos 63 anos, dedicado a ensinar futebol a garotos de onze a quinze anos no Centro Olímpico Ibirapuera, em São Paulo, Hideraldo Luiz Bellini ainda se emociona ao falar do biafilhado.

Quando o senhor conheceu Almir?

Quando ele chegou ao Vasco. Logo nos aproximamos. Já tinha o temperamento explosivo. Era valente, esquentado, terrível. Para dar uma ideia, num treino da seleção ele me deu uma solada que quase me quebra. Porque eu brinquei com ele, dizendo “não vem encher o saco”.

Qual a origem desse comportamento?

O pai dele tinha uma mercearia no Recife. À noite, entravam ladrões. O que não podiam levar estragavam. Misturavam açúcar com querosene, açúcar com álcool. Nos fundos da mercearia, era a residência. O pai dele começou, armado, a esperar os ladrões à noite. Saíram vários tiroteios.

Quando o senhor o levou para morar no seu apartamento, em Copacabana?

Foi logo depois de ele chegar. Tirei-o da concentração do Vasco porque era boêmio. Era preciso cuidado com ele, tinha um futuro brilhante. A mãe escrevia cartas lindas para o Almir, que me mostrava. Ela mandava ouvir o “seu Bellini”, dava conselhos.

Como o senhor se tornou padrinho de Almir?

A mãe dele era batista. O pai, católico. Ela disse ao marido: “Vamos deixar as crianças crescerem para decidir qual religião querem seguir.” A maioria ficou sem religião. Em 1958, quando o Vasco ganhou o campeonato carioca, um frade argentino que jogava futebol perto de São Januário foi nos cumprimentar. Eu falei, apontando para o Almir: “Frei, esse sem-vergonha não tem religião.”

E aí?

Brincando, eu falei: “Vamos batizá-lo.” O Almir topou. Peguei a filha de um dirigente do Vasco e falei que ela seria a madrinha. Eu decidi: “Vou ser o padrinho.” O frade me deu um catecismo. Em casa, eu o ensinava a rezar. Almir dava risada. “Vai ter que rezar e parar de molecagem”, eu dizia. Nós o batizamos numa igreja de Copacabana.

Como era o dia a dia de vocês?

Morávamos em Copacabana e tomávamos café num bar da rua Constante Ramos. Íamos de carona ou lotação para o Vasco. Não saíamos juntos porque eu dormia para treinar cedo. Ele sempre arranjava amigos boêmios. Eu falei: “Aqui o apartamento é meu, você não paga nada, mas tem horário.”

E não se divertiam?

A segunda-feira era livre, não tinha treino. Domingo dava para chegar mais tarde. Ele podia levar mulher para casa, mas no período da tarde. Acertávamos o horário. Das duas às quatro, o apartamento era para um. Das quatro às seis, para outro. Ele era mulherengo, era um garoto.

Já se envolvia em confusões?

Sempre. Um exemplo: ele ficou afastado de um jogo porque teve uma contusão na perna. Perto do bar aonde íamos havia um ponto de táxi. O Almir deu uma corridinha em frente ao ponto para atravessar a rua. Um motorista gritou: “Aí, garoto safado! Para jogar, está machucado, mas, para namorar, está correndo!” O Almir sentou a mão no cara. Os motoristas vieram reclamar comigo, o padrinho.

Na intimidade ele era mais amável?

Era fantástico. Vivíamos na casa de conselheiros do Vasco, dançávamos com as meninas filhas deles. Era bacaníssimo, fiel aos amigos. Mas tinha o outro lado: gostava de um barzinho, de cerveja, só cerveja. Para brigar com alguém, não precisava estar bêbado. Não se envolvia com drogas, na época. Mas tenho minhas dúvidas sobre a fase em que foi morto. Tinha umas companhias meio manjadas.

Como ele o convidou para padrinho de casamento?

Foi quando ele estava em São Paulo, no Corinthians. Mero acaso. Num sábado eu vim com o Vasco jogar contra a Portuguesa. Quando chego ao hotel depois do jogo, tem um bilhetinho: “Bellini, compareça à igreja nos Campos Elíseos. Por favor, para meu casamento. Almir.”

O casamento foi no sábado?

Sim. Eu fui para lá. Duas horas antes, se casava na mesma igreja o Éder Jofre. Quando eu estou chegando, o Almir está na frente da igreja. “O que aconteceu, Almir?”, perguntei. “Ele respondeu: “Você tem que ser meu padrinho.” Eu: “Mais uma vez, cabra-macho? Uma vez não chega?” O Almir explicou: “O meu sogro morreu hoje cedo. O padrinho ficou cuidando do corpo. Tem que ser você.” Na vida dele as coisas aconteciam assim. A morte do Almir foi muito estranha.

Não era previsível?

Não sei se você sabe. Um dia, um delegado no Rio deu uma batida em Copacabana. Chegaram no Almir, pedindo documento. Ele já pegou a mão no delegado. Os policiais o levaram num camburão. Ele já havia parado de jogar. Eu acho que o episódio teve influência no assassinato.

Quando foi a última vez que o senhor o viu?

Ele já havia parado de jogar. Foi no Rio. Estava gordo e com os cabelos caindo. No enterro, a mãe dele veio conversar comigo: “Quem me dera ele nunca tivesse se afastado do senhor.” Foi triste.


50 anos do golpe: debates na Unicamp reveem os tempos da ditadura
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Mário Magalhães

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Na próxima terça-feira (25.mar), às 18h, a Associação de Docentes da Unicamp abre um ciclo dedicado ao debate sobre o golpe de Estado de 1964 e suas consequências na vida brasileira.

A primeira mesa, ''Em nome da Segurança Nacional'', reúne o mediador Carlos Lobão Cunha e os debatedores Manoel Cyrillo de Oliveira Netto e Renato Tapajós.

Também com mostra de filmes de Renato Tapajós, o ciclo vai até o dia 1º de abril, aniversário de meio século da deposição do presidente constitucional João Goulart.

Uma tremenda oportunidade para, com participantes de alto nível, discutir o passado do Brasil e o país que se quer construir.

blog - unicamp vale este


Ditadura: militar diz que arrancava dedos, dentes e vísceras de preso morto
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Mário Magalhães

 

Em um dos mais importantes e verossímeis depoimentos já prestados por agentes da ditadura (1964-85), o coronel reformado Paulo Malhães afirmou que ele e seus parceiros cortavam os dedos das mãos, arrancavam a arcada dentária e extirpavam as vísceras de presos políticos mortos sob tortura antes de jogar os corpos em rio onde jamais viriam a ser encontrados.

O relato histórico do oficial do Exército foi feito à Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro e revelado nesta sexta-feira pelo repórter Chico Otávio.

Malhães se referia a presos políticos assassinados na chamada Casa da Morte, um imóvel clandestino na região serrana fluminense onde servidores do Centro de Informações do Exército detinham, torturavam e matavam opositores da ditadura. De acordo com o coronel, os cadáveres eram ensacados junto com pedras. Dedos e dentes eram retirados para impedir a identificação, na eventualidade de os restos mortais serem encontrados. As vísceras, para o corpo não boiar.

Veterano da repressão mais truculenta do passado, Malhães figura em listas de torturadores elaboradas por presos. É ele quem assumiu ter desenterrado em 1973 a ossada do desaparecido político Rubens Paiva (post aqui).

Seu testemunho, sem vestígios de arrependimento, contrasta com o de aparente mitômano surgido em anos recentes. Malhães não é um semi-anônimo, mas personagem marcante para seus pares em orgãos repressivos e para presos políticos.

Dois trechos do seu depoimento à comissão, conforme reprodução de ''O Globo'' (a reportagem pode ser lida na íntegra clicando aqui):

1) “Jamais se enterra um cara que você matou. Se matar um cara, não enterro. Há outra solução para mandar ele embora. Se jogar no rio, por exemplo, corre. Como ali, saindo de Petrópolis, onde tem uma porção de pontes, perto de Itaipava. Não (jogar) com muita pedra. O peso (do saco) tem que ser proporcional ao peso do adversário, para que ele não afunde, nem suba. Por isso, não acredito que, em sã consciência, alguém ainda pense em achar um corpo.”

2) “É um estudo de anatomia. Todo mundo que mergulha na água, fica na água, quando morre tende a subir. Incha e enche de gás. Então, de qualquer maneira, você tem que abrir a barriga, quer queira, quer não. É o primeiro princípio. Depois, o resto, é mais fácil. Vai inteiro.”

Com a frieza de quem conta ter ido à padaria, Malhães afirmou, referindo-se ao local onde vive, a Baixada Fluminense: ''Eu gosto de decapitar, mas é bandido aqui''.

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Coronel afirma que desenterrou corpo do desaparecido Rubens Paiva em 1973
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Mário Magalhães

Ex-deputado federal Rubens Paiva, cassado em 1964 e assassinado em 1971

 

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O coronel Paulo Malhães, oficial reformado do Exército e legendário membro do aparato repressivo da ditadura(1964-85), afirmou ter participado de operação para desenterrar a ossada do deputado federal cassado Rubens Paiva, desaparecido em 1971 depois de ter sido morto na tortura em dependências militares. Até hoje seu corpo não foi encontrado.

''Recebi a missão para resolver o problema, que não seria enterrar de novo'', disse o coronel à repórter Juliana Dal Piva. ''Procuramos até que se achou, levou algum tempo. Foi um sufoco para achar (o cadáver). Aí, seguiu o destino normal.''

O ''destino normal'' seria ocultar o corpo para sempre.

A missão teria ocorrido em 1973, na praia carioca do Recreio dos Bandeirantes. Malhães disse que sabia de quem eram os restos mortais: “Eu podia negar, dizer que não sabia, mas eu sabia quem era sim. Não sabia por que tinha morrido, nem quem matou. Mas sabia que ele era um deputado federal, que era correio de alguém”.

Malhães foi apontado por numerosos presos políticos como autor de violências. Integra listas de torturadores. Militou em órgãos como o Centro de Informações do Exército (CIE). Cuidava de alguns dos serviços mais sujos da ditadura.

Sua identificação, com declarações de relevância histórica, estão na edição de hoje do jornal ''O Dia'' (reportagem aqui). A matéria nomeia outros militares que teriam atuado com Malhães para desenterrar e desaparecer com o corpo. O coronel disse ignorar o destino dos restos mortais. E que o CIE resolveu dar ao caso uma ''solução final''.

De acordo com o oficial, a operação foi necessária porque alguns agentes do Destacamento de Operações de Informações (DOI) do I Exército ameaçavam divulgar onde estava a ossada.

Para onde foi levado o corpo? “Pode ser que tenha ido para o mar. Pode ser que tenha ido para um rio.”

Malhães disse que a ordem para desenterrar Rubens Paiva veio do gabinete do ministro do Exército. À época, o ministro do Exército era o general Orlando Geisel, irmão do futuro ditador Ernesto Geisel. O presidente da República (igualmente ditador) era o general Emílio Garrastazu Médici.


Companhia das Letras libera grátis capítulo de ‘Marighella’ sobre o golpe
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Mário Magalhães

Editado pela Companhia das Letras, o livro está na quinta reimpressão

 

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O capítulo da biografia ''Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo'' que conta as horas incandescentes do golpe de Estado de 1964 está à disposição, gratuitamente, na internet.

A Companhia das Letras liberou o capítulo ''Os aviões ficaram no chão'', que pode ser baixado e lido aqui (para acessar, basta clicar em cima do negrito):

* Site da Companhia das Letras;

* Cultura;

* Saraiva;

* Iba;

* Amazon;

* Kobo;

* iTunes.

A gênese e a execução do golpe de 50 anos atrás é contada em cinco capítulos do livro: ''O taquígrafo da história''; ''Cutucando Jango''; ''Soldados vermelhos''; ''O ghost-writer''; e ''Os aviões ficaram no chão'', cuja narrativa abre em 30 de março de 1964.

* * *

Escrevi uma breve introdução ao capítulo. Reproduzo-a:

“Os aviões ficaram no chão”: em 1964, Marighella foi às ruas contra os golpistas

Nunca se saberá ao certo se o golpe de Estado de 1964 teria sido barrado se o presidente João Goulart e seus aliados tivessem resistido com mais vigor. Quem detinha poder para encarar os golpistas não os confrontou ou pouco perseverou.

Entre os que não tinham essa força, o ex-deputado federal Carlos Marighella (1911-1969) foi um dos mais devotados militantes a se empenhar, nas ruas, para impedir a deposição do governo constitucional de Jango. O capítulo “Os aviões ficaram no chão” encerra a segunda das três partes que compõem a biografia Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo (Companhia das Letras). Reconstitui a dramática luta do protagonista do livro contra o golpe que ele buscou derrotar.

Marighella organizou companheiros para enfrentar os inimigos de Goulart. Discursou na Cinelândia, onde balas disparadas desde a sede do Clube Militar zuniam, feriam e matavam. Apelou a um comandante legalista da Marinha para fuzileiros navais tomarem o palácio Guanabara, onde despachava o governador oposicionista Carlos Lacerda _um plano para bombardear o palácio não vingara. Implorou para que um brigadeiro enviasse um caça para interromper a marcha de tropas que se deslocavam rumo ao Rio com o propósito de derrubar Goulart. E articulou um ataque ao QG do Exército, base de generais golpistas.

O capítulo abre com uma reunião de Marighella com sargentos, no entardecer de 30 de março de 1964. À noite, numa festa no Automóvel Club, João Goulart pronunciaria seu derradeiro discurso em solo brasileiro. A narrativa se estende até as ações de Marighella, uma semana depois da queda de Jango, tentando frear a ditadura nascente _um mês mais tarde ele resistiria à prisão em um cinema e seria baleado e preso.

Além dos movimentos de Marighella, “Os aviões ficaram no chão” conta, no calor da hora de 50 anos atrás, as idas e vindas de Jango e dos governistas; de protagonistas e coadjuvantes militares ou paisanos, tanto golpistas quanto legalistas; de Luiz Carlos Prestes e do Partido Comunista Brasileiro; da CIA e do Departamento de Estado dos EUA; dos sindicalistas que apoiavam o governo e da polícia política que os perseguia; de quem matou e foi morto na virada de março para abril. Histórias de tirar o fôlego, esmiuçando as jornadas que convulsionaram e mudaram o país.

Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo é fruto de nove anos de trabalho. Para investigar a trajetória do revolucionário comunista que passou boa parte da vida adulta na clandestinidade ou encarcerado, entrevistei 256 pessoas; pesquisei documentos em 32 arquivos públicos e privados de cinco países; e consultei uma bibliografia de 600 títulos.

Lançado em outubro de 2012, o livro recebeu o Prêmio Jabuti, o Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) e o Prêmio Botequim Cultural como melhor biografia, o Prêmio Casa de las Américas, na categoria literatura brasileira, e, hors-concours, o Prêmio Direitos Humanos. Graças à imensa generosidade dos leitores, já chegou à quinta reimpressão.

Será adaptado para o cinema por Wagner Moura e a produtora O2. O filme baseado em Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo marcará a estreia de Wagner como diretor de longa-metragem. Deve ser rodado em 2015, com lançamento em 2016.

* * *

Eis a capa feita para o mini e-book gratuito:

mariga - capa os avioes vale


Libertadores escancara limitações do Flamengo
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Mário Magalhães

blog - flamengo leo moura contra bolivar

Flamengo em minoria na disputa pela bola, o padrão ontem – AFP PHOTO/Aizar Raldes

 

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Por conta de certa data redonda, está na hora de eu passar por um check-up. Sugerirei ao médico desprezar os exames de coração, por ter sobrevivido aos jogos do Flamengo na Libertadores. Se superei essas provações, mal não devo estar. Até agora (toc, toc, toc).

A derrota de ontem para o Bolívar na altitude teve características para testar não somente a saúde cardiológica do cidadão, mas a sua sanidade, tamanhos os enganos capazes de enlouquecer os rubro-negros. Mas o revés mais irritante não foi ontem, pois desde sempre nós, os povos do nível do mar, habituamo-nos a perder nas alturas de La Paz.  E, sim, o empate no Maracanã semana passada.

A Libertadores, com a fase de grupos, tem mostrado a equipe mais próxima da que por pouco não foi rebaixada no Campeonato Brasileiro. E não da que, incentivada pela torcida soberana, conquistou a Copa do Brasil 2013.

Poderia ser diferente? No quesito coletivo, a estreia no México evidenciou que sim, a despeito da derrota de 2 a 1 para o León. O time fez uma partida de orgulhar os torcedores. Sucumbiu porque jogou com dez na maior parte do tempo, desde a merecida expulsão de Amaral aos 11 minutos do primeiro tempo. E porque foi garfado pelo árbitro.

Sobreveio a vitória de 3 a 1 sobre o Emelec, no Maracanã. Muito melhor vencer, mas a primeira etapa indigente preocupou.

Na quarta-feira retrasada, igualdade de 2 a 2 com o Bolívar, houve quem elegesse Wallace e João Paulo bodes expiatórios, em virtude de seus erros nos gols do antagonista boliviano. Um injustiça, pois o conjunto esteve mal, com exceções como Éverton. Elano, na ciclotimia que o distingue nos últimos anos, desapareceu.

Ontem, Samir escorregou e entregou o gol decisivo. Escorregou mais duas vezes e quase entregou de novo. O placar poderia ter sido mais amplo, embora o Flamengo no finzinho tenha tido chances que dispararam os batimentos do coração.

A primeira constatação no balanço provisório é que a Libertadores não é o Campeonato Estadual, onde o time deita e rola. Óbvio? Pois às vezes parece que os jogadores não se dão conta. A impressão foi de salto alto contra o Bolívar, no Maracanã.

Luiz Antônio, que há pouco se reintegrou ao elenco, e sobretudo Elias fazem uma tremenda falta. Muralha tem talento, mas não passa como os volantes que partiram nem ataca como eles.

Se alguns titulares estão longe de serem grandes jogadores, há suplentes muito piores. No empate diante do Bolívar, os laterais Léo Moura e André Santos, que já não jogam o que jogavam noutros tempos, foram substituídos por Léo e João Paulo. Pareciam atletas de terceira divisão provando a primeira.

Para um clube que busca padrões mais profissionais, o destempero de Amaral no México e as derrapadas de Samir na Bolívia indicam que não houve preparação adequada, principalmente de cabeça _ou psicológica, vá lá_ para uma pedreira como a Libertadores. Erros individuais comprometem o empenho coletivo.

Jayme foi fundamental para o título da Copa do Brasil, mas, como todo treinador, tem as suas idiossincrasias. Uma delas é, volta e meia, insistir no decadente Carlos Eduardo. Por que escalá-lo ontem? Queria cadenciar o jogo? Havia outras formas. Tirando um passe para Paulinho, o gaúcho nada fez. Quer dizer, fez sim: errou passes, desperdiçou ataques, não conseguiu dominar a bola, entregou contra-ataques, pouco marcou. Ele caminha pelo campo, cabisbaixo, depressivo. O Messi também? Mas o Messi é o Messi!

O incrível é que nada disso é novidade, mas Carlos Eduardo teve de reaparecer logo ontem. Para ser justo, Éverton e Gabriel também estiveram péssimos. O trio encenou um futebolzinho insosso e pouco objetivo, de passes para o lado, abandonando a busca pelo gol.

Dar ainda dá para classificar, o que estaria quase garantido com nove pontos em casa, o que já não é possível. O Emelec, bem como León e Bolívar, é limitado. Pode ser batido em Guayaquil, uma das cidades mais feias que conheci _antes de ir para lá passei pela belíssima Cuenca, também no Equador.

O Flamengo também não é nenhum timaço, mas pode ganhar os próximos seis pontos. Desde que recupere o espírito da estreia, suprimindo maluquices, como a do Amaral, que ameaçam com um infarto a maior nação futebolística do Brasil.


Parece provocação: aumento em trem e metrô no Rio a menos de um mês da Copa
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Mário Magalhães

blog - trena caoa rio

O aumento tarda, mas, ao contrário de certos trens, chega – Celso Pupo/Foto Arena/Estadão Conteúdo

 

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Parece provocação.

A Agetransp autorizou aumento nas passagens de trens e ônibus no Rio (reportagem aqui).

A legislação só permite que as novas tarifas entrem em vigor daqui a dois meses (leia nota da agência).

A Copa abre em 12 de junho. Três dias depois, tem jogo no Maracanã.

Parece provocação: reajustar as tarifas a menos de um mês do Mundial.

No ano passado, o adiamento dos aumentos de janeiro para as vésperas da Copa das Confederações foi um dos mais potentes combustíveis das jornadas de junho.

Terão os concessionários das linhas rodoviárias e férreas, bons amigos do governador Sérgio Cabral, disposição para tal desatino? Ou deixarão a garfada para depois da Copa do Mundo, buscando esvaziar os prováveis protestos?

A Agetransp não costuma contrariar interesses de Cabral.

Permitir aumentos na bica da Copa parece provocação.

Parece?


Exame de DNA confirma identidade de guerrilheiro enterrado com nome falso
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Mário Magalhães

Iara Xavier Pereira (ao centro) acompanha exumação – 9.abril.2013/Foto Tâna Rêgo/ABr

 

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Exame de DNA concluiu que são mesmo do guerrilheiro Alex de Paula Xavier Pereira (1949-1972) os restos mortais enterrados no cemitério de Inhaúma, na zona norte carioca.

Alex foi morto por agentes da ditadura em São Paulo, no dia 20 de janeiro de 1972. O militante integrava a Ação Libertadora Nacional (ALN), maior organização de combate ao regime instaurado em 1964. Peritos da Comissão Nacional da Verdade apontaram em 2014 numerosos indícios de que ele foi executado (leia aqui post do blog).

Em abril do ano passado, a ossada de Alex foi exumada no Rio, a pedido da família, do Ministério Público Federal e da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada à Secretaria dos Direitos Humanos (assista a reportagem da TV Brasil; e leia matéria do jornal ''O Globo'').

Havia sido transferida para lá por parentes do guerrilheiro, em 1980. Passara muito tempo desaparecida, até ser encontrada no cemitério paulistano Dom Bosco, em Perus, onde fora enterrada em nome de João Maria de Freitas, embora seus matadores, do DOI (Destacamento de Operações de Informações) do II Exército, soubessem muito bem de quem se tratava.

A família supunha que os restos pudessem ser de Alex, mas jamais teve certeza _o Estado, a quem cabia identificar o morto, tentara ocultá-lo com nome falso.

O exame foi feito por técnicos da Polícia Federal, comparando os DNAs de Alex e de sua mãe, Zilda Paula Xavier Pereira, 88, um dos principais dirigentes da ALN nos anos 1960.

Iara Xavier Pereira, irmã do guerrilheiro, afirmou em comunicado: ''Há 40 anos os restos mortais de Alex, sepultado com nome falso no cemitério Dom Bosco, Perus, foram localizados por sua tia Irene Paula. Foi o início de uma longa jornada pela recuperação dos restos mortais e sua identificação. Nos últimos anos, essa jornada contou com a participação do Ministério Público Federal, com atuação destacada do procurador da República Sérgio Suiama, da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, e com o apoio da ministra Maria do Rosário, que solicitou à Polícia Federal a realização de novos exames. Salve a luta dos familiares, salve Irene Silva!''.