Me engana que eu gosto: Temer forja regra para manter ministro um novo Jucá
Mário Magalhães
Saudado em lábia e prosa pela regra anunciada ontem sobre demissão de ministros enrolados com a operação Lava Jato, Michel Temer deve estar às gargalhadas.
É evidente que ele estabeleceu critérios que protegem ainda mais o primeiro escalão do governo, em vez de enquadrá-lo.
Com sua linguagem rococó, o presidente mostrou um gato, disse que era lebre, e só não viu quem não quis.
Eis o que Temer falou, nas passagens compreensíveis: ''Se houver denúncia […], o ministro que estiver denunciado será afastado provisoriamente''; ''Depois, se acolhida a denúncia, aí, sim, a pessoa, no caso o ministro, se transforma em réu. Estou mencionando os casos da Lava Jato. Ele [o ministro] se transformando em réu, o afastamento é definitivo''.
Trocando em miúdos: o papel da polícia é recolher indícios de crime; quando os encontra, a polícia indicia o suspeito. A prerrogativa legal de acusá-lo é do Ministério Público. A acusação é denominada, formalmente, denúncia. Se a Justiça aceita a denúncia, o denunciado se transforma em réu no processo. Mais tarde haverá o julgamento.
Na prática, isso significa que Romero Jucá não teria caído do Ministério do Planejamento devido à gravação em que prega ''estancar essa sangria''. Isto é, salvar políticos ameaçados pelas investigações da Lava Jato.
Nem o ministro da Transparência, Fabiano Silveira, que rodou também por causa do teor de gravações feitas por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.
Idem Henrique Alves, do Turismo, abatido depois que Sérgio Machado contou aos procuradores que ele embolsara propina.
Os três não teriam perdido o cargo porque não eram réus nem haviam sido denunciados no âmbito da Lava Jato. Que eu saiba, continuam sem ser denunciados.
Temer inventou uma norma que favorece a impunidade. Em tese, um ministro pode ser flagrado roubando esmola de mendigo, mas permanecer no posto enquanto não for denunciado.
Como os ministros têm direito _privilégio_ a foro especial, denúncia na Lava Jato é decisão da Procuradoria Geral da República.
Em muitos casos, a PGR age com velocidade barriquélica.
A agilidade paquidérmica se manifesta igualmente no Supremo Tribunal Federal.
O presidente parece contar com a vagareza do procurador-geral e dos ministros do Supremo. Um novo Jucá não dançará.
''O governo não quer blindar ninguém'', trombeteou Temer.
Tal declaração vale tanto quanto outra, a de que os jornais ''Folha de S. Paulo'' e ''O Globo'' não foram censurados pela Justiça, a pedido do governo.