Blog do Mario Magalhaes

O dia em que a cobiça e a soberba teriam se encontrado

Mário Magalhães

Familiares do atacante Lucas prestam homenagem junto ao caixão - Nelson Almeida/AFP

A hora do adeus, sábado, na Arena Condá – Foto reprodução UOL

 

Com tantas provas documentais (como o plano de voo) e testemunhais (como o depoimento de uma funcionária do aeroporto de Santa Cruz de la Sierra), evidenciou-se o problema técnico decisivo para a queda do avião da LaMia em que 71 pessoas morreram seis dias atrás, incluindo quase todo o time da Chapecoense e duas dezenas de jornalistas: a falta de combustível do Avro para chegar a Medellín.

A essa altura, é complicado desassociar a decisão do piloto Miguel Quiroga, que descartou fazer escala, da economia que a atitude renderia à empresa aérea da qual ele era também sócio. As estimativas vão de R$ 10 mil a R$ 17 mil. A maior parte do dinheiro seria desembolsada em taxas aeroportuárias. Quiroga poderia reabastecer ao menos em Cobija, na Bolívia, ou em Bogotá, capital colombiana. Passou batido pelas duas cidades.

Se a cobiça, salvo alguma novidade relevante contida nas caixas-pretas, autoriza supor o motivo do imenso risco que o piloto assumiu, só ela não basta.

A não ser que se descubra que Quiroga, aos 36 anos e três filhos, tenha resolvido se suicidar, levando junto mais 70 pessoas. Inexiste indício de que isso tenha ocorrido. Ele morreu no desastre.

Por que arriscar tanto?

A soberba não constitui característica exclusiva de muitos pilotos da aviação civil, como comprovam muitíssimas pessoas soberbas de outras profissões.

Mas não é raro na aviação _escrevo na condição de quem cresceu nesse meio_ o sentimento de que domínio técnico e traquejo são capazes de superar os mais ameaçadores e inesperados obstáculos. No caso, possíveis surpresas na rota do voo LaMia 2933 que exigissem consumo de combustível maior do que o previsto. O comandante teria pensado que, graças à sua destreza, nada o impediria de pousar são e salvo na pista de Medellín.

É cada vez mais provável que, no balanço sincero da tragédia, confirme-se que 29 de novembro de 2016 foi o dia desgraçado em que a cobiça e a soberba se encontraram no ar.

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