Crivella muda tom, liga Freixo a tática ‘nazista’ e expõe agressividade
Mário Magalhães
Há uma mudança notável na campanha de segundo turno para prefeito do Rio, e seu protagonista é Marcelo Crivella (PRB).
O candidato tem nadado de braçada contra seu xará Marcelo Freixo (PSOL). De acordo com Datafolha e Ibope, o senador construiu vantagem na proporção de dois votos contra um do deputado.
A terça-feira, contudo, não assistiu ao Crivella pacato, tranquilo, paciente e com ar de sábio, o personagem mostrado até agora na campanha _de algum modo, todo candidato é um personagem ou assim é percebido.
Nem ao concorrente que, tamanha a distância sobre o antagonista, não precisa se arriscar em ataques virulentos e arroubos de agressividade.
O habitual é quem corre atrás bater mais, em busca de recuperação.
Freixo lançar-se contra Crivella é previsível, e não o contrário.
Mas, em anúncio na televisão, Crivella acusou Freixo de empregar tática de propaganda ''nazista''. Isso mesmo: nazista. O motivo é o deputado afirmar que o ex-governador Anthony Garotinho de algum modo participaria de um governo Crivella. O PR de Garotinho se coligou com o PRB e forneceu a Crivella muito mais tempo de propaganda no primeiro turno. O site da campanha do senador informou que Garotinho indicou o vice de Crivella.
À noite, o debate promovido por UOL, Rede TV! e ''Veja'' revelou um Crivella iracundo, desconhecido dos cariocas. Pronunciou a frase ''eu não vou descer o nível e dizer que você é canalha, safado e vagabundo'', no estilo não-vou-dizer-mas-já-estou-dizendo. É um direito de Crivella escolher suas palavras na contenda, porém elas não combinam com a campanha edulcorada de quem se propõe a ''cuidar das pessoas''.
Há um mistério: por que o candidato que beira os 70% de intenção de votos válidos pega mais pesado no ringue, ou debate, do que o oponente que mal passa dos 30%?
A resposta é a impressão de que, a 12 dias da eleição (contando a partir de ontem), a artilharia de Freixo ameaça.
Provavelmente, menos com as referências à aliança com Garotinho e mais com a exumação da trajetória de Crivella como bispo da Igreja Universal do Reino de Deus.
No domingo, o repórter Fernando Molica contou que em livro de 1999 Crivella desancou homossexuais e adeptos de outras religiões.
Hoje, Molica reproduz trechos de livro organizado por Crivella com ensinamentos como este: ''O ministério da mulher de Deus é cuidar do marido, dos filhos e da casa, como se estivesse servindo ao Senhor''; ''Não basta que ela seja de Deus e batizada com o Espírito Santo; é preciso que seja compatível com o marido, com o mesmo objetivo, sendo submissa, cumpridora de deveres como mulher, mãe e dona de casa''.
O pensador que recomenda a mulher submissa é o bispo Edir Macedo, tio de Crivella e líder da Igreja Universal.
Ontem se soube que Crivella, nos tempos de cantor, interpretou uma canção de sua autoria que parecia ironizar o chute que um pastor da Universal dera numa imagem de Nossa Senhora Aparecida. Crivella cantou versos como ''Na minha vida dei um chute na heresia/ Houve tanta gritaria de quem ama a idolatria/ Eu lhe respeito meu irmão, não quero briga/ Se ela é Deus, ela mesmo me castiga''. Mais: ''Aparecida, Guadalupe ou Maria/ Tudo isso é idolatria de quem vive a se enganar/ Mas não se ofenda meu irmão, não me persiga/ Se ela é Deus, ela mesmo me castiga''.
Talvez nenhum dos episódios agora conhecidos ou rememorados lhe seja tão daninho quanto o exibido reiteradamente num anúncio de Freixo. No vídeo, Crivella fala de arrecadação de contribuições de fiéis. No YouTube, só encontrei uma versão de 60 segundos produzida noutra eleição, e não a de 30 segundos que Freixo leva à TV. Para assistir, basta clicar aqui.
Ignora-se por enquanto se a nova atitude de Crivella lhe rende ou rouba votos.
Só na segunda-feira à noite o programa de Freixo na televisão começou a não pregar exclusivamente para convertidos e passou a tentar dialogar com o eleitorado que hoje não se dispõe a votar nele.
O programa noturno de ontem foi inteiramente dedicado a narrar a história de Freixo. Deveria ter ido ao ar na abertura da campanha televisiva do segundo turno, e não com oito dias de atraso. É muito mais profissional do que os desastrosos programas iniciais.
O maior erro do candidato do PSOL foi iniciar a batalha do segundo turno falando para o mesmo público que o havia sufragado no primeiro. É suicídio político.
Crivella, ao contrário, manteve o low-profile com que atravessara toda a campanha. Até a mudança desta semana,.
O favorito é Crivella, mas Freixo permanece no jogo.