A lição da eleição de 2006, o efeito Garotinho e a aposta de Freixo no Rio
Mário Magalhães
Faz só dez anos, algo como, contemplando a história, o tempo de um espirro. Não custa contar, para quem não viveu ou não se lembra. Parece inacreditável, mas aconteceu de verdade.
Na eleição presidencial de 2006, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) alcançou maioria relativa no primeiro turno e absoluta no segundo. Não foi ele, porém, o protagonista da façanha incrível, e sim o candidato Geraldo Alckmin (PSDB).
No dia 1º de outubro daquele ano, o tucano obteve 39.968.369 votos. Voto pra caramba, o equivalente a 38,13% do total e a 41,64% dos sufrágios válidos.
Em 29 de outubro, deu-se o feito extraordinário: Alckmin foi escolhido por 37.543.178 cidadãos.
Isso mesmo: sua votação diminuiu, 2.425.191 eleitores a menos que quatro semanas antes. Caiu para 36,81% do total e 39,17% desprezando brancos e nulos.
Foi como se todos os eleitores dos demais candidatos tivessem preferido Lula (e milhões pró-Alckmin o abandonaram).
Como foi possível ocorrer a regressão inusitada?
Por muitos fatores, inclusive as circunstâncias em que Alckmin logrou evitar o triunfo lulista na rodada inicial.
Mas nenhum contribuiu mais para o desastre do hoje governador de São Paulo do que um gesto seu em 3 de outubro, dois dias depois da ida às urnas: ele se encontrou com o ex-governador do Rio Anthony Garotinho e a então governadora Rosinha Garotinho, ambos do PMDB. A família Garotinho anunciou apoio a Alckmin no mata-mata derradeiro. O presidente nacional do PMDB, um certo Michel Temer, estava presente. Deu no que deu.
Assim que soube da adesão dos Garotinho, o coordenador da campanha de Alckmin, o prefeito Cesar Maia (PFL, atual DEM), assinalou: ''[Alckmin] perde o discurso da ética''. A observação decorria das numerosas denúncias sobre Garotinho no trato do patrimônio público.
O efeito Garotinho também se manifestou no Estado do Rio. No comecinho de outubro, Alckmin colhera 25,95% dos conjunto de votos. No finzinho, praticamente não saiu do lugar, com 26,73%.
Além de conhecer a história, o que não faz mal a ninguém, qual o sentido de exumar as lições do pleito de 2006?
Entender a aposta de Marcelo Freixo (PSOL) na tentativa de diminuir a vantagem de Marcelo Crivella (PRB) na campanha em curso para prefeito do Rio. De acordo com o Ibope mais recente, o deputado tem um voto para cada dois do senador (33% a 67%).
O PR, partido de Garotinho, está coligado com Crivella. Conforme notícia veiculada no site do candidato, Garotinho indicou o vice da chapa, fato que Crivella agora nega. A rejeição ao ex-governador permanece expressiva.
O propósito de Freixo em entrevistas, discursos e propaganda na TV é enfatizar o acordo Crivella-Garotinho.
''O povo nem liga para isso'', deu de ombros Crivella nesta quinta-feira.
Garotinho minimiza sua rejeição: ''Eu acho que eles [adversários de Crivella] estão dando um tiro n'água na medida em que eles tentam associar o meu nome ao Crivella, achando que minha rejeição é grande. Porque minha rejeição já foi grande no Rio, mas, pelos últimos números que eu tenho, está na casa dos 20%, 22%. O PMDB roubou tanto que roubou até minha rejeição''.
A esmagadora maioria do PMDB carioca quer a vitória de Crivella no próximo dia 30.
Se a rejeição de Garotinho é pequena, por que Crivella o mantém afastado dos holofotes?
Ainda é cedo para saber se, em 2016, o efeito Garotinho se reproduzirá, ainda que em menor escala.