Ao vincular calamidade à Olimpíada, Dornelles estimula atos contra os Jogos
Mário Magalhães
Ao decretar hoje ''estado de calamidade pública, em razão da grave crise financeira no Estado do Rio de Janeiro'', o governador em exercício, Francisco Dornelles, deu a entender que o arrocho vai se agravar porque a prioridade do governo é gastar com a Olimpíada de agosto. (Deu a entender é eufemismo. Dornelles foi óbvio.)
O decreto afirma que a crise ''impede o cumprimento das obrigações assumidas em decorrência da realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016''.
Para honrar os compromissos referentes à Olimpíada, ''ficam as autoridades competentes autorizadas a adotar medidas excepcionais necessárias à racionalização de todos os serviços públicos essenciais, com vistas à realização dos Jogos''.
Noutras palavras, haverá menos dinheiro para os ''serviços públicos essenciais'' _é isso o que significa nesse caso ''racionalização''.
O funcionalismo já pena com a quebra do Estado. O atraso nos salários foi institucionalizado. A segunda parcela agora não tem data para ser paga. Aposentados e pensionistas não sabem quando vão receber. Com a suspensão de pagamentos a empresas terceirizadas, deixaram de ser prestados serviços de limpeza, segurança e muitos outros. Os servidores reagiram, com greves. Programa de renda complementar a pobres e miseráveis foi extinto. Serviços de emergência hospitalar fecharam.
Dornelles (PP) foi um dos políticos citados por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, por alegadamente ter recebido propina _R$ 250 mil. Ele ocupa o lugar de Luiz Fernando Pezão (PMDB), afastado para tratamento de saúde. Pezão é correligionário de Machado e do prefeito Eduardo Paes.
O decreto menciona ''queda na arrecadação, principalmente a observada no ICMS e nos royalties e participações especiais do petróleo''.
Diz que a crise ''vem impedindo o Estado do Rio de Janeiro de honrar com os seus compromissos para a realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016''.
Que pode haver ''total colapso na segurança pública, na saúde, na educação, na mobilidade e na gestão ambiental''.
Assinala que ''já nesse mês de junho as delegações estrangeiras começam a chegar na Cidade do Rio de Janeiro, a fim de permitir a aclimatação dos atletas para a competição''.
O estado de calamidade pública é instrumento que costuma facilitar o acesso a recursos emergenciais que permitam aliviar a pindaíba.
Certamente Dornelles pensou nisso.
Mas há um risco talvez não percebido, para o governo que afirma priorizar os Jogos: se a população fluminense tiver impressão de que está sendo sacrificada por causa da Olimpíada, os protestos até agora praticamente inexistentes podem pipocar.
Protestos contra a Olimpíada, claro. O Rio é a cidade-sede, e o Estado e a União também investiram muito.
Mais um espectro ronda o Rio: o espectro das Jornadas de Junho de 2013.