Blog do Mario Magalhaes

A caixa-preta da Prefeitura do Rio

Mário Magalhães

A ciclovia desabou, e ao menos duas pessoas foram mortas – Foto Ricardo Borges/Folhapress

 

Foi preciso que ao menos duas pessoas fossem mortas no feriado de Tiradentes para que os cidadãos conhecessem um pouco mais a Prefeitura do Rio.

Na quinta-feira, desabou aqui no Rio um trecho da ciclovia da morte _não associem o nome de Tim Maia à obra erguida com desprezo pela vida humana. Foram mortos o gari comunitário Ronaldo Severino da Silva e o engenheiro Eduardo Marinho Albuquerque.

A ciclovia havia sido inaugurada em janeiro. Durou pouco mais de três meses.

A primeira novidade do noticiário foi a revelação de que o consórcio que construiu a ciclovia pertence a parentes do secretário de Turismo do Rio, Antônio Pedro Viegas Figueira de Mello.

Que Figueira de Mello e o grupo Concremat sustentem que o parentesco não influencia os negócios é previsível. Surpreendente foi o supersecretário municipal Pedro Paulo Carvalho dizer que ignorava o vínculo familiar.

Do colega de secretariado com o conglomerado que fatura mais de R$ 1 bilhão por ano.

Conglomerado que em 2014 pingou R$ 1 milhão na campanha à reeleição do governador Luiz Fernando Pezão, correligionário de Pedro Paulo.

Conglomerado cujos negócios com a prefeitura dispararam após a chegada ao governo da coalização liderada por Eduardo Paes, que quer fazer de Pedro Paulo seu sucessor.

Eis o que conta o noticiário: ''Na gestão Paes, iniciada em 2009, a empresa multiplicou por 18 [dezoito] o valor de contratos assinados com a Prefeitura do Rio. Entre 2000 e 2008, as empresas do grupo assinaram 16 contratos com o município. Os acordos somavam R$ 24,8 milhões, em valores corrigidos pela inflação. Após a entrada de Paes, as empresas passaram a participar de 54 obras no município, com um valor total de R$ 451,6 milhões, também em valores corrigidos''.

Desse total, cerca de 30% são oriundos de contratos com dispensa de concorrência. A justificativa é o alegado caráter emergencial das empreitadas.

Incrível, observando a catástrofe na ciclovia, é que as empresas do grupo Concremat costumam ser contratadas para evitar tragédias. ''Elas são responsáveis por identificar áreas de risco em favelas, realizar obras de contenção de encostas, reforçar a estrutura de viadutos e mapear o subsolo para evitar explosões de bueiros.''

Ironia ou desfaçatez?

Dois dias antes de a ciclovia ruir sob o impacto das habituais ondas que castigam o costão da avenida Niemeyer, constataram o risco de ressaca. A prefeitura não interditou o trânsito na ciclovia. Por quê? Porque nunca houve plano de interromper a circulação naquela via, mesmo em caso de o mar ameaçar a integridade física dos transeuntes.

A ciclovia custou quase R$ 45 milhões, em torno de 25% mais do que o previsto.

O mais inacreditável da caixa-preta da prefeitura é a identidade da empresa paga pela administração Eduardo Paes para fiscalizar a obra.

A ciclovia foi construída pelo consórcio Contemat/Concrejato, braços do grupo Concremat.

Para fiscalizar os trabalhos, o município contratou a Concremat Engenharia e Tecnologia S/A, do mesmo grupo.

Quem constrói é quem fiscaliza, em nome _e com o dinheiro_ dos contribuintes.

Existe evidente conflito de interesses na condição simultânea de fiscalizado e fiscalizador.

A tragédia das mortes vai expondo o que ficou escondido por muito tempo.

Qual será a próxima revelação?

P.S.: O prefeito Eduardo Paes pertence ao PMDB. O vice Adilson Pires, ao PT.

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