Blog do Mario Magalhaes

Quatro dias após reeleição, oposição já questionava legitimidade de Dilma

Mário Magalhães

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Ato em São Paulo seis dias depois da reeleição de Dilma – Foto Eduardo Anizelli/Folhapress

 

Na noite de 28 de outubro de 2014, dois dias depois do segundo turno, o Tribunal Superior Eleitoral proclamou o resultado parcial que assegurava a reeleição de Dilma Rousseff.

Não demorou 48 horas para o PSDB questionar, no dia 30, a legitimidade e a legalidade do triunfo da presidente da República. O partido recorreu ao TSE, pedindo uma ''auditoria especial'' na contagem dos votos.

A ação tucana alegou que a iniciativa se devia a ''uma somatória de denúncias e desconfianças por parte da população brasileira''.

Acrescentou: ''Nas redes sociais os cidadãos brasileiros vêm expressando, de forma clara e objetiva, a descrença quanto à confiabilidade da apuração dos votos e a infalibilidade da urna eletrônica, baseando-se em denúncias das mais variadas ordens, que se multiplicaram após o encerramento do processo de votação, colocando em dúvida desde o processo de votação até a totalização do resultado''.

Até então, ao menos 60 mil pessoas tinham assinado petição on line reivindicando recontagem, uma forma de duvidar da honestidade do placar eleitoral.

A ''Folha'' informou: ''O PSDB requer a análise de cópia dos boletins de urna de todas as sessões eleitorais do país, documentos, impressos ou manuscritos gerados em todas as sessões eleitorais do país; cópia dos arquivos eletrônicos que compõem a memória de resultados obtidas a partir dos dados fornecidos por seção eleitoral; arquivos eletrônicos detalhados, originais e completos, correspondentes à transmissão e ao recebimento de todos os dados de apuração; entre outros''.

Em 26 de outubro, a petista Dilma havia recebido 54.501.118 votos, contra 51.041.155 para o peessedebista Aécio Neves.

Uma vantagem de 3.459.963, o equivalente a 3,28 pontos percentuais.

Passados dois dias do pedido do PSDB ao TSE, portanto seis depois do domingo do segundo turno, estimados 2.500 manifestantes defenderam em São Paulo o impeachment da presidente reeleita.

Bradaram por recontagem, classificando a eleição como ''a maior fraude da história'' _o que, supõe-se, inclui a época da dita República Velha (1889-1930).

No mesmo dia, protestos em Curitiba, Brasília e Manaus também exigiram o impeachment da presidente que só dali a semanas tomaria posse no segundo mandato.

Voto e democracia

Por que esse breve inventário, que talvez tenha mais utilidade quando estes tempos tormentosos forem revisitados com alguma serenidade?

Porque os fatos demonstram que Dilma Rousseff teve seu segundo mandato questionado antes mesmo de começar.

No princípio, os manifestantes eram poucos _e o PSDB chiava sozinho.

De tão radicais _berravam ''vai pra Cuba!'' e propunham ''intervenção militar''_, chegaram a ter utilidade para a presidente, como o blog observou mais de uma vez.

Com a segunda administração desastrosa desde a largada, devido sobretudo à adesão suicida à plataforma econômica derrotada pelos cidadãos em 2014, Dilma tinha a seu favor o argumento da democracia.

De fato, a soberania do sufrágio popular impunha _como ainda impõe_ o cumprimento do mandato conferido pelas urnas.

O governo era _é_ péssimo, mas é sua a bandeira da submissão democrática ao voto.

Como o aprofundamento de erros, da economia à política, Dilma se enfraqueceu, afundou o país e sacrificou os mais pobres. Nem assim mudou sua orientação. Contribuiu para que a intolerância de fanáticos ganhasse adesões de quem tem poder _ainda que ilegal e ilegítimo_ para golpeá-la.

Com a escolha de Eduardo Cunha para capo da Câmara, a conspiração se expandiu. E Michel Temer, hoje com 2% de intenção de voto para presidente, vislumbrou a oportunidade de se promover para o Planalto.

As tais ''pedaladas fiscais'' são pretexto. Uma presidente constitucional contra quem inexiste denúncia de se locupletar com dinheiro público está sendo asfixiada por uma turma contra a qual pesam suspeitas e acusações das mais cabeludas.

A evidente inépcia de Dilma como gestora não esconde o empenho, desde o terceiro trimestre de 2014, de seus opositores para a impedirem de governar. No parlamento, na Justiça, onde for. Este é um aspecto decisivo da crise e do buraco.

Ainda não se sabe no que dará o processo de impeachment.

Mas se sabe que a intolerância em relação à opinião alheia _no caso, à da maioria que escolheu Dilma_ se mantém vigorosa no Brasil.

E que, se houver ousadia e poder para isso, a soberania do sufrágio popular pode ser violentada.

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