Dilma rumo ao suicídio político: ou a presidente reage ou golpe a derruba
Mário Magalhães
Resta pouca areia na parte de cima da ampulheta de Dilma Rousseff.
Se a presidente constitucional, eleita democraticamente por 54.501.118 brasileiros, mantiver a desastrosa política do seu segundo mandato, cairá fulminada por um golpe de Estado.
Como inexiste prova de crime cometido por Dilma, se ela for afastada, o que haverá é golpe.
Golpes de Estado violentam a soberania do voto popular, pilar da democracia.
Por mais eufemismos que os embrulhem, como a alegada ''defesa da ordem constitucional'' (em 1964, esse pretexto foi muito ouvido; na verdade, estupraram a Constituição e instauraram uma ditadura).
Podem ocorrer com tanques na rua, como em 1937, ou num arranjo golpista que prescinda das armas.
A deposição de Dilma representaria um mastodôntico retrocesso institucional.
Eis a mensagem golpista: danem-se as urnas, existem caminhos mais espertos para alcançar o governo.
Golpismo e golpistas
Não confundamos responsabilidades. Na hipótese da derrubada de Dilma, a culpa essencial seria dos golpistas.
Desde 26 de outubro do ano retrasado, o domingo em que Dilma (PT) venceu Aécio Neves (PSDB) no segundo turno, uma turma intolerante reivindica a deposição da governante legal e legítima.
Ainda em 2014 _com a presença de viúvas da ditadura, nostálgicos do integralismo e veteranos da TFP_, São Paulo assistia a manifestação pelo ''fora, Dilma''.
O boicote à sua administração disseminou-se, inclusive na Câmara dos Deputados. O correntista Eduardo Cunha consagrou-se como o muso do impeachment.
A presidente pareceu não notar quando a pregação de alucinados de extrema-direita vitaminou-se, aproveitando os enganos de Dilma Reloaded e a ruína nos índices de aprovação popular ao governo.
Ao subestimar o DNA golpista de trincheiras poderosas da vida nacional, Dilma não mostrou resistência à altura, ao menos até agora. Esse erro político lhe custa caro.
Mas nenhum é maior do que abandonar os compromissos assumidos em palanque na campanha reeleitoral. Dilma prometeu governar para os mais pobres, e ninguém paga mais do que os pobres pela crise que assola o país. A questão não era somente Levy, nem é Barbosa, ministro que mantém o arrocho do antecessor. É Dilma quem manda. Ela adotou a orientação econômica proposta por Aécio em 2014. Quantos eleitores de Dilma estarão dispostos a defendê-la nas ruas, se ela faz o que disse que não iria fazer? Há quem pense: se é para governar à direita, existem motorneiros mais habilitados do que Dilma.
É inegável que o cenário econômico internacional dificulta. Com o preço do minério de ferro e do petróleo em baixa, pior para a Petrobras, já abalada pela roubalheira e pela Operação Lava Jato, e para as contas do país exportador de commodities. A China desacelera? Sim. O compromisso da presidente, contudo, é proteger, em qualquer situação, os mais fracos. Os banqueiros, com juros ascendentes, ficaram mais ricos. Os trabalhadores, mais pobres.
Inépcia e inabilidade
A inépcia administrativa do governo se combina com a inabilidade política da presidente. São tantos exemplos, limito-me a dois.
Nos três primeiros meses do atual mandato, o ministro das Relações Institucionais foi Pepe Vargas. Pelo que ouço, trata-se de homem decente. Mas politicamente é pequenininho demais para a função em que foi escalado, e logo a deixou.
Sob cerco furioso da turba que pretende depô-la, e com seu aliado Lula acossado por perseguidores seletivos, Dilma está de fato sem ministro da Justiça.
Ninguém a advertiu para a possibilidade de se tornar um imbroglio judicial a nomeação do promotor Wellington César Lima e Silva? Não o conheço, pode ser cidadão digno e qualificado. Porém, ele não é o nome certo para o momento. Ainda que não tivesse a condição funcional como empecilho para permanecer ministro. Numa conflagração como esta, o ministro da Justiça deveria ser um jurista (ou quadro do mundo do direito) de projeção, e não alguém que, por mais íntegro, gere a seguinte pergunta ao ter o nome pronunciado: quem é?
Será que o ambiente bajulatório em torno de Dilma é tal que nenhum adulador lhe alerta para obviedades como a relevância do Ministério da Justiça?
A presidente aparenta estar alheia ao cadafalso político que montam para liquidá-la.
Reitero: suicídio não é só físico, como o de Getulio Vargas em 1954.
Pode ser político.
Nada disso é novidade. A novidade é que a hora do vamos-ver se aproxima dramaticamente.
Bola cantada
Em maio de 2015, pouco mais de quatro meses depois da posse, o blog anotava: ''Houve [na Câmara] uma derrota política monumental de quem governa graças ao compromisso de melhorar, e não piorar, a vida dos que mais sofrem com a obscena desigualdade social do Brasil. Tropeços no Congresso acontecem. A verdadeira derrota é abandonar quem se habituou ao abandono. Parece suicídio''.
Basta observar os índices sociais para saber que o Brasil de hoje é, para a maioria da população, melhor que o de 14 anos atrás.
No segundo governo Dilma, vão regredindo as conquistas da era Lula e da primeira administração da presidente.
Dezenas de milhões de cidadãos votaram em Dilma.
Para mobilizá-los ao seu lado, a presidente precisa dar uma virada em seu governo.
Como? Honrando as promessas de 2014, protegendo quem é mais desprotegido.
Ainda é tempo de a presidente reagir, mas seu tempo está acabando.