Blog do Mario Magalhaes

Boxe: sangue no ringue, por Edgard Alves

Mário Magalhães

Luta do torneio de boxe olímpico de 2012 – Foto reprodução

 

A retirada do capacete protetor de pugilistas amadores já tinha parecido suspeita, como comentei no Pan do ano passado.

Deu a impressão de que o negócio do esporte se sobrepunha à saúde dos desportistas.

Agora, a coisa pode ficar pior ainda, com a permissão para pugilistas profissionais disputarem a Olimpíada.

Na aparência, uma maravilha: a chance de ver em ação a nata dos ringues.

Ainda mais para quem, como eu, comprou ingressos para duas jornadas de boxe nos Jogos do Rio.

A aparente boa notícia oculta a má: o abismo entre amadores e profissionais às vezes é tamanho que iria se multiplicar o risco de lesões.

Quem dá o toque é o Edgard Alves, um dos maiores conhecedores de esporte no jornalismo brasileiro.

''Não há dúvida, vai jorrar mais sangue sobre o ringue'', alertou hoje o Edgard em sua coluna na ''Folha''.

A cartolagem, ao que parece, nem está para isso _não faltarão ''pareceres'' médicos de encomenda, minimizando os perigos.

O negócio é faturar.

*

No fio da navalha

Por Edgard Alves

A Associação Internacional de Boxe (Aiba) está revendo as regras do torneio de boxe da Olimpíada. Estuda a possibilidade de permitir a participação de pugilistas profissionais. A hipótese de nomes famosos estarem nos Jogos tornou a informação explosiva.

A euforia, lamentavelmente, apaga da memória coisas negativas. Como ficam questões relacionadas à saúde e riscos dos pugilistas? Os não-profissionais, claro.

O boxe enfrentou por décadas campanhas que tinham como apelo a violência para banir a modalidade dos Jogos. Com dificuldades, e opiniões divididas, as pressões acabaram superadas. Certamente devem voltar caso a Aiba, responsável pelo boxe olímpico, exponha os pugilistas a novos riscos.

O potencial e recursos de um atleta profissional são superiores aos de um não-profissional no esporte em geral. Quando o assunto é boxe, as diferenças tornam-se mais distintas. No boxe olímpico se leva mais em conta o toque; no profissional, a contundência, ou seja, a pancada.

O ex-peso pesado Maguila, expoente do profissionalismo no Brasil, tinha dificuldades para treinar com sparrings. Era raro arrumar algum, mesmo buscando no exterior, tal a escassez. A diferença de nível era notória.

Nas categorias mais fortes, notadamente no peso pesado, uma frase do próprio Maguila espelha a dimensão do problema: ''Onde o cara bate não nasce mais pelo''. Nas categorias mais leves, há mais equilíbrio.

O boxe é mesmo peculiar. Fora do ringue, mas bem próximo dele, o médico responsável pela luta pode determinar a sequência ou o encerramento da contenda caso suspeite haver lesão grave de um lutador.

Prontos para intervir, a equipe médica, o juiz e os assessores dos pugilistas observam ainda o estado de lucidez dos lutadores, que às vezes perdem completamente as referências e, sonados, tornam-se indefesos, sujeitos a um massacre.

Em circunstâncias assim, a luta é interrompida imediatamente e cuidados especiais devem ser dispensados ao lutador.

Também de prontidão há especialista para tentar estancar sangramentos em segundos nas paradas regulamentares. Apesar de toda essa atenção, os riscos de uma lesão cerebral estão presentes. Todo cuidado é pouco. É ou não um esporte diferenciado?

O COI teria manifestado desejo de tornar o boxe mais atrativo em termos midiáticos, desafio encampado pela Aiba, que deve decidir até maio sobre a presença de profissionais na Olimpíada.

Nos Jogos de Londres-12, foi quebrado um tabu, com o boxe realizando seu primeiro torneio olímpico feminino. Era a única modalidade em que faltava dar espaço às mulheres.

Para a Rio-2016, o boxe aumentou de 34 para 40 anos o limite de idade dos participantes. Além disso, aproximando-se das normas profissionais, adota novo sistema de pontuação e aboliu o capacete protetor (exceto para as mulheres).

Não há dúvida, vai jorrar mais sangue sobre o ringue. O capacete evita ferimentos, tanto assim que até os profissionais recorrem a ele nos treinamentos. Abolir esse equipamento, e simultaneamente abrir as portas para os profissionais, pode tornar o fardo insuportável para os atletas olímpicos.

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