Esqueceram de mim: até agora, gargalhada mais ruidosa é a de Eduardo Cunha
Mário Magalhães
Limpando o terreno.
Só ingênuos irrecuperáveis e desinformados crônicos podem se surpreender com as suspeitas da Operação Lava Jato em relação ao marqueteiro João Santana. A memória não precisa ser das mais dotadas para recordar outro publicitário que serviu ao Partido dos Trabalhadores, Duda Mendonça, e sua confissão de recebimento ilegal de pagamentos no exterior. Se o ex-jornalista João Santana é culpado ou não, caberá à investigação da polícia e do Ministério Público apurar e à Justiça decidir, por mais que certos pregoeiros alardeiem sentenças sem nem terem folheado os autos do inquérito e do processo.
É preciso cultivar muita cara de pau para justificar promiscuidade ou crime alegando que adversários também fizeram ou fazem coisa igual. Exemplo gritante é o do mensalão. Uma das principais defesas do PT foi proclamar o inegável pioneirismo do PSDB na matéria, vide Eduardo Azeredo. Ora, a vigarice tucana não anistia a petista. E vice-versa. Tabelinha do roto com o esfarrapado. São outros quinhentos o fato de um lado ter sido punido e o outro permanecer impune, o que nos remete à Lava Jato e seus alvos seletivos.
Terreno limpo, é evidente que a 23ª fase da Operação Lava Jato consagra novamente um grande vencedor. Ninguém tem tantos motivos para gargalhar ruidosamente como Eduardo Cunha.
Há uma série de suspeitas e dúvidas sobre o caixa de João Santana. Ele teria recebido por meio de empresas de paraíso fiscal US$ 7,5 milhões da Odebrecht. Alega que depósitos no exterior não se originam de trabalhos no Brasil. A pergunta primeira: por que raios a Odebrecht desembolsaria toda essa grana? O marqueteiro fez alguma campanha publicitária da empreiteira? Ou a Odebrecht pagou por serviços prestados a outros, no país ou no estrangeiro? Aqui, Santana conduziu a campanha da reeleição de Lula e as duas campanhas vitoriosas de Dilma Rousseff. Também uma, sem sucesso, de Marta Suplicy, quando apostou na baixaria de lançar insinuações sobre a sexualidade do concorrente.
No caso de Eduardo Cunha, há mais resposta que pergunta. Documentos enviados por autoridades suíças atestam o vínculo do presidente da Câmara e sua mulher com contas bancárias não declaradas à Receita do Brasil. Faz tempo que a papelada chegou. Como a Lava Jato procede para aprofundar a investigação e punir o deputado? Outro dia um opinionista dava aula sobre o fórum privilegiado como escudo para Eduardo Cunha. Omitiu a mulher dele: a antiga jornalista Cláudia Cruz não tem mandato parlamentar que impeça a Justiça de primeira instância, que cuida das principais ações da Lava Jato, de se pronunciar, se provocada pela PF e o Ministério Público Federal. No escrutínio da roubalheira da Petrobras, assumidos ladrões denunciaram Cunha e propina. Mas a Lava Jato aparenta esquecê-lo. Sem falar no tal Conselho de Ética da Câmara, que até agora demonstra, para avançar na cassação de Cunha, acusado de mentir aos seus pares, agilidade semelhante à do David Luiz no 7 a 1.
A essa altura, tão cara de pau quanto apontar os podres alheios em busca de perdão para os seus é negar que a Operação Lava Jato parece usar antolhos. Mirou num caminho, ou alvo, e dispensou, ou não viu, os outros. Como o Judiciário no mensalão. Nunca tive dúvidas de que inexiste almoço de graça. Logo, ''doação'' de empresa privada para campanhas eleitorais configura embuste. O que os ''doadores'' fazem é investir, dando dinheiro antes em troca de facilidades dos administradores públicos mais tarde. Vale para empreiteiras, bancos e companhia.
Fazem isso com todo mundo. Portanto, não há por que supor que o sistema impere somente nas dezenas de milhões de reais doados à campanha reeleitoral de Dilma Rousseff por empreiteiras envolvidas na Lava Jato. E as dezenas de milhões que beneficiaram a campanha derrotada de Aécio Neves? É um insulto à inteligência e ao bom senso imaginar que haja distinção de propósito dos ''doadores''. Ah, os tucanos são diferentes, já ouvi. Fosfosol: votos para a emenda constitucional que permitiu a reeleição de Fernando Henrique Cardoso foram comprados. A revelação não foi coisa de quem não gosta de FHC _houve deputado que confessou em gravação. Que punição sobreveio? Nenhuma. A privatização de estatais, tamanhos os escândalos comprovados inclusive de viva voz, em grampos, ganharam do jornalista Elio Gaspari a qualificação de privataria. No que deu isso tudo? Em nada. Sem falar na obscenidade do roubo de merenda de criança.
A Operação Lava Jato precisa mesmo fazer uma limpa na gatunagem que assola o Brasil.
Mas, se vier a punir uns e preservar outros, não haverá Justiça, e sim ação política partidária e impunidade de muitos.
Por enquanto, o oposicionista Eduardo Cunha ri.
Rirá por último?