Retrato do Brasil
Mário Magalhães
Os garotos da foto trabalham aqui no Rio como boleiros, ou apanhadores de bolas de tênis, no Clube dos Caiçaras.
Ou melhor, trabalhavam.
O Ministério Público do Trabalho identificou como trabalho infantil a atividade de mais de 20 adolescentes de 14 e 15 anos, e o _de fato_ trabalho foi interrompido há meio ano.
O Caiçaras alega que dava apoios diversos aos boleiros, inclusive escolar. E que em gorjetas eles podiam ganhar uns mil reais por mês. Fora do clube, perdem o dinheiro e a ajuda.
O imbroglio foi revelado na semana passada pelo jornalista Ancelmo Gois.
Desconheço muitas informações, por isso não posso julgar.
Mas sei que o Brasil que não abandona os mais fracos e pobres deve muito a procuradores que, até com o sacrifício da vida, têm batalhado contra condições indignas e ilegais de trabalho.
Cheguei a ler que a chance de os meninos se tornarem grandes jogadores de tênis terminou por culpa do MPT.
Falso. Jovens humildes não costumam se tornar tenistas profissionais porque tal esporte, no Brasil, é quase exclusividade da classe média para cima.
E nada impede o clube localizado na lagoa Rodrigo de Freitas de abrir suas portas para os antigos boleiros, em vez de apanharem bolas, passarem a aprender e treinar como jogadores. Ou impede?
É possível que haja um acordo, e os garotos ganhem o estatuto de aprendizes. O trabalho no país é vedado a menor de 16 anos, salvo na condição de aprendiz.
O que mais me impressionou foi a fotografia de Fernando Lemos, publicada na primeira página de ''O Globo'' deste domingo.
Todos os boleiros são negros ou mestiços.
E ainda tem gente proclamando democracia racial, ausência de racismo e outras balelas.
É obsceno comparar ''méritos'' quando as oportunidades são tão desiguais.
Até quando o lugar de meninos negros será somente fora das quadras, apanhando bolas de tenistas brancos?