Trump, Hillary e as lições das derrotas de Serra e Aécio para Dilma
Mário Magalhães
Para entender Donald Trump, líder na disputa do Partido Republicano para escolher o candidato a presidente na eleição de novembro, não custa compará-lo a Ronald Reagan.
De 1981 a 1989, o ex-ator canastrão Reagan presidiu os Estados Unidos. Anticomunista inveterado, formava nas fileiras mais exaltadas da direita.
No confronto histórico com Trump, Reagan não passa de um moderado, um político com a sobriedade de, digamos, Tancredo Neves ou Ulysses Guimarães.
A fanfarronice é a forma de Donald Trump. No conteúdo, trata-se de um intolerante alucinado e disseminador de ódio. Com suas ofensas machistas e a profissão de fé contra os muçulmanos em geral, dispara tiradas fascistoides e agourentas.
Reagan, para o bem e para o mal, tinha pinta de estadista.
Trump, famoso como apresentador de TV, soa como piada sem graça.
Se ele triunfar nas primárias contra 11 concorrentes, vai encarar, ao que tudo indica, a democrata Hillary Clinton na eleição presidencial.
Posso estar enganado, mas seria um candidato dos sonhos para ela _melhor só Jeb Bush, enfraquecido pelo sobrenome de má lembrança.
A radicalização encarnada por Donald Trump não é estranha ao seu partido, cada vez mais conservador.
Mas a dose é tão exagerada que o pré-candidato espanta eleitores mais ao centro, inclusive republicanos de extração civilizada.
O radical funciona assim: estimula o fervor dos seus fiéis até o paroxismo, mas dificilmente amplia o rebanho. Ou amplia até um limite insuficiente para alcançar a maioria. Nem sempre, mas quase sempre funciona assim.
Na tradicional divisão do eleitorado norte-americano entre democratas e republicanos, quem decide sobretudo é o centro. A despeito da rejeição acumulada por Hillary Clinton, não há como a antiga secretária de Estado não se beneficiar do perfil grotesco do possível oponente _não falo das madeixas de Trump, mas da cachola.
O que os Estados Unidos em 2016 têm a ver com os pleitos presidenciais no Brasil em 2010 e 2014?
Entre os motivos reconhecidos para a vitória de Dilma Rousseff (56,05%) contra José Serra (43,95%) em 2010 são apontados, corretamente, a popularidade do presidente Lula, os bons resultados da economia e o impacto de programas sociais.
No segundo turno, porém, houve um momento em que o tucano se aproximou da petista. Os partidários dela dizem desde então que Dilma impediu a ultrapassagem ao mudar de atitude e atacar Serra num debate. Pode ter influenciado, mas provavelmente não foi o principal.
Há cinco anos tenho a convicção de que a inflexão de Serra à direita prejudicou sensivelmente seu desempenho. O hoje senador já tinha à época assegurada a preferência dos segmentos mais conservadores. Dissesse o que dissesse, eram votos garantidos. Em vez de rumar para o centro-esquerda, batalhando os votos difíceis para uma candidata de performance sofrível na campanha, o ex-militante da Ação Popular resolveu se concentrar nas multidões mais excitadas da direita. Estimulou a raiva contra Dilma (e o padrinho Lula), mas pregou para convertidos. Acabou perdendo por 12 pontos percentuais. Em vez de reta final renhida, sobreveio um passeio.
Com Aécio Neves, em 2014, o erro foi o mesmo, porém mais grave. Porque o postulante do PSDB tinha muito mais chances do que Serra de superar a desgastada candidata do PT. Aécio embicou à direita, entusiasmando o eleitorado que seria seu em qualquer cenário. Esqueceu o centro e permitiu que Dilma prevalecesse, 3,3 pontos à frente. O discurso radical de Aécio Neves foi decisivo para o seu revés, embora outros fatores tenham contribuído.
É passado, recente, mas passado. Se reeditados, esses comportamentos podem vir a pesar no pleito de 2018, ainda que sem protagonistas do PT e do PSDB.
Nos Estados Unidos, em 2016, Hillary Clinton torce para Trump radicalizar cada vez mais.