Blog do Mario Magalhaes

Prisões: promiscuidade entre público e privado dilapida patrimônio público

Mário Magalhães

blog - angeli corruptos

Por Angeli, na ''Folha'', 26.11.2015

 

A impunidade é combustível indispensável à expansão da corrupção, modalidade criminosa que exige quem dê e quem receba, o corruptor e o corrupto. Quando bandidos acabam na cadeia, emite-se um aviso: quem reeditar práticas semelhantes se arrisca a ter idêntico destino. Se prevalece a impunidade, o combustível da gatunagem ganha aditivo.

Faz bem ao Brasil que o senador petista Delcídio do Amaral tenha ido para o xilindró e que o banqueiro amigo de tantos partidos André Esteves lhe faça companhia. É saudável que o STF tenha respondido com altivez às provas e que, no caso do líder do governo no Senado, a maioria dos seus pares tenha autorizado a prisão, nos termos da lei.

Por mais óbvio que seja a muita gente, para outros passa despercebido quem é a maior vítima da corrupção. É o patrimônio público, bem coletivo dos cidadãos, mais caro ainda aos que dependem do Estado para sobreviver. Num exemplo: se há quem tenha dinheiro para pagar o colégio privado da gurizada, parcela expressiva dos brasileiros depende de estabelecimentos públicos de ensino; a corrupção retira do Estado condições de manter escolas e oferecer educação de qualidade _no contraste com o desempenho das particulares, amplia-se o desnível de oportunidades. (Sem falar que os ricos costumam preferir faculdades públicas, bancadas por todos, em especial os mais pobres.)

A promiscuidade entre o segmento público e o privado serve ao segundo. Não que não devam existir parcerias, pactos, vínculos que promovam vantagens lá e cá. O setor público melhorando a vida das pessoas. O privado auferindo lucro legítimo. Relações não promíscuas. O problema é quando o público é prejudicado, favorecendo o privado, rompendo o equilíbrio na balança de interesses. Pior ainda, quando o patrimônio público é dilapidado em proveito de companhias e bolsos particulares.

A Petrobras é exemplar. Sua constituição foi uma batalha cívica de décadas, vencida contra petrolíferas privadas nacionais e sobretudo estrangeiras. Sabotagem nunca faltou contra a Petrobras. Por um bom tempo, opuseram-se opiniões distintas sobre o monopólio estatal do petróleo, hoje erradicado.

A partir de determinada quadra, uniram-se para pilhar a Petrobras aqueles que alardeavam a privatização e os que discursavam em alto brados contra ela. Associaram-se para roubar. Na prática, para privatizar, transferindo ilegalmente patrimônio público para mãos de larápios.

Que independência tem um governante ou legislador cuja campanha é financiada por empreiteiras, estaleiros e bancos, como o BTG Pactual de Esteves? Assim como não existe almoço gratuito, ''doação de campanha'' é história da carochinha. As empresas não doam, elas investem. O que o administrador público e o legislador têm a oferecer em troca, a não ser abrir mão de interesses públicos, privilegiando os de conglomerados privados? Podem falar em ''contribuição'' em nome de valores da cidadania, de veleidades sociais, do pragmatismo de o país ir bem, para as empresas avançarem. Não creio. Basta observar a atuação dos beneficiários das ''doações'', a quem eles servem, por que causas batalham. Por que a Vale foi tão bem tratada depois da tragédia criminosa de Mariana?

A promiscuidade é a antessala do crime.

O senador do PT é o mesmo sujeito nomeado diretor da Petrobras no governo FHC. O banqueiro seu camarada destinou milhões de reais às campanhas de Dilma Rousseff e Aécio Neves em 2014. E um trocado ao caixa 1 de Delcídio _sem contar eventuais pixulecos por baixo do pano.

A verborragia radicalíssima no choque entre vultos da politicalha brasileira disfarça comportamentos parecidos.

Nada foi tão constrangedor ontem como assistir aos senadores, aos menos de PT, PSDB e PMDB se humilhando ao elogiar Delcídio do Amaral. O que temem? A convicção de que lugar de ladrão é na cadeia?

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