Blog do Mario Magalhaes

‘Contragolpe’: PSDB insinua na TV discurso das forças que derrubaram Jango

Mário Magalhães

As anotações a seguir, bem como a propaganda televisiva de que elas tratam, podem no futuro ser condenadas a reles pé de página, se tanto. Ou não. Dependerá do rumo do Brasil.

Na noite desta segunda-feira, o PSDB exibiu dez minutos de programa na TV (assista à íntegra clicando na imagem no alto). Em inflexão que talvez venha a ganhar relevância histórica, o partido semeou uma narrativa que pretende conferir legitimidade ao afastamento da presidente da República ungida pelas urnas.

Os tucanos não pronunciaram a palavra, mas deram a entender que o afastamento de Dilma Rousseff do Planalto seria resultado de um contragolpe, e não de um golpe de Estado.

Em comparação com a novidade, foram secundários os discursos de Geraldo Alckmin, José Serra, Fernando Henrique Cardoso e Aécio Neves (outro registro para a história: três políticos de São Paulo, um de Minas, e só).

No finzinho, depois do recado do candidato presidencial derrotado em 2014, um ator-apresentador disse (começa aos 9 minutos e 23 segundos do programa):

''Se você empresta dinheiro para uma pessoa, e essa pessoa some, nunca mais aparece pra te pagar, você foi vítima de quê? De um golpe, não é?''

Reiterou:

''E se você vota em quem promete controlar a inflação, não mexer em direitos trabalhistas, e muitas outras maravilhas, mas depois a inflação sobe sem parar, ela corta o seguro-desemprego, 1 milhão e meio de vagas no Pronatec, aumenta e muito a conta de luz. Pense bem: isso é ou não é um verdadeiro golpe?''

Contra um golpe, ilegítimo já no nome, o que seria legítimo? Um contragolpe!

As forças militares, econômicas e políticas que se associaram para derrubar o presidente constitucional João Goulart em 1964 jamais reconheceram ter participado do golpe de Estado que de fato ocorreu.

Sempre afirmaram, e as viúvas da ditadura (1964-1985) repetem até hoje, que houve um contragolpe que barrou um alegado golpe iminente de Goulart.

Como identificam consciências honestas e historiadores respeitáveis, houve mesmo um golpe contra Jango _e, acrescento, contra o Brasil.

Serra, presidente da UNE em 1964, e FHC, sociólogo que viajou de São Paulo ao Rio para participar do comício da Central do Brasil, sabem que ''contragolpe'' é farsa histórica destinada a acobertar os golpistas que fulminaram a democracia 51 anos atrás.

Aécio era criança, mas deve ter ouvido do avô, o legalista Tancredo Neves, que contragolpe era história da carochinha.

Contragolpe de verdade, ensina o passado, aconteceu em novembro de 1955. Um golpe em curso tentava impedir a posse do presidente sufragado pelos cidadãos, Juscelino Kubitschek. Reagindo aos golpistas militares e civis, o general legalista Henrique Teixeira Lott lançou os tanques às ruas no contragolpe que permitiu a posse do eleito pelo povo.

Em suma: golpe alveja quem tem o respaldo constitucional do voto; contragolpe digno de assim ser chamado protege quem tem voto.

Méritos e deméritos dos governos FHC, Lula e Dilma, em parte abordados ontem, são outra conversa.

O marcante foi o tucanato ter insinuado o mesmo discurso que conheceu seu auge em 1964.

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