O silêncio cúmplice aceita a barbárie
Mário Magalhães
Somente um grande mentecapto suporia que os 800 mil manifestantes do domingo subscreveram mensagens como as retratadas acima (todas garimpadas na internet).
Seria ofensivo vincular o conjunto dos participantes dos protestos a bandeiras como o extermínio sob tortura em campos de concentração, como eram os DOI (Destacamentos de Operações de Informações) da ditadura; à convicção de que rico é imune à corrupção (vide contas secretas na Suíça e pilantragens de empreiteiros); ao lamento por não ter havido genocídio de antagonistas no golpe de Estado de 1964; à defesa de um novo golpe, por meio de ''intervenção militar''; e ao abraço em Eduardo Cunha como deputado digno de reverência.
Não subscrevem, é verdade. Mas não se soube de uma só restrição à presença de tais pessoas e à divulgação de tais ideias.
Nem de cidadão que tenha se retirado dos atos públicos ao se deparar com os arautos da intolerância.
A presidente da República foi o alvo central, com justiça ou não, das manifestações. Não é o caso, aqui, de julgar seu governo. Quando jovem, mais jovem do que hoje é a minha filha mais velha, Dilma Rousseff foi presa por agentes do Estado. À margem até da lei da ditadura, foi torturada com choques elétricos, no pau-de-arara, com a crueldade que quem não viveu não é capaz de imaginar.
Cartazes como os de ontem não são novidade nas demonstrações anti-Dilma que se sucedem desde o ano passado. Desta vez, novamente, ninguém confrontou os mensageiros da barbárie.
Quem cala consente, proclama o provérbio.
A gestação do fascismo, do nazismo e do stalinismo foi facilitada pelo silêncio cúmplice.
Não estou dizendo que o Brasil de 2015 se assemelha à Europa dos anos 1920 e 1930.
Mas que, se não podem ser apontados como co-autores das barbaridades de ontem, os manifestantes toparam estar lado a lado com os autores das barbaridades.
Em nome do combate ao adversário político, aceitam perfilar com quem, no conteúdo de alguns cartazes, não difere muito dos cretinos que, no século XX, identificavam-se com a SS.
Se quiserem brigar, não avacalhem a mim, nem me xinguem.
Briguem, avacalhem e xinguem os fatos. Pois é fato que silenciaram diante do ovo da serpente.
E desfilaram com quem preferia que Dilma Rousseff tivesse sido enforcada no DOI a enfrentá-la na democracia.