Dilma sacrifica quem não protesta contra ela
Mário Magalhães
A multidão de aproximadamente 800 mil pessoas, a confiar em cálculos da PM, seria expressiva em qualquer cenário. Foi também ontem, em manifestações massivas contra a presidente da República. Da fórmula da renúncia à do impeachment, prevaleceram os gritos de ''Fora, Dilma''.
A despeito do vigor dos protestos, Dilma Rousseff ganha fôlego, como reconhecem até comentaristas-torcedores que haviam veiculado obituários precoces da segunda administração da petista.
Dilma se vitaminou com precários acordos no Congresso, embora não se livre da anemia do isolamento. E, se muita gente saiu às ruas ontem, a audiência foi menor que na jornada de 15 de março. A candidata vitoriosa à reeleição recebeu 54.501.118 votos em outubro, e na democracia o sufrágio popular é soberano. Prognósticos para o futuro são temerários.
A principal ironia de ontem é que o governo Dilma Reloaded estabeleceu uma política econômica avessa aos interesses de quem não bate panela nem abre cartazes contra a presidente.
Ela implementa orientação contrária à que prometera na campanha. Assegurou que não sacrificaria os mais pobres, porém descumpre a palavra.
Dos juros que transferem recursos públicos para parasitas do sistema financeiro à escassez de verbas para a compra de livros de bibliotecas escolares, quem mais precisa é quem mais perde na crise. O governo patrocina mudanças na legislação que abolem conquistas e arrocham benefícios dos trabalhadores.
Para escapar ao cerco golpista, aceita a tal Agenda Brasil, um conjunto de medidas com nítidas perdas para os mais humildes. E com mãozinha obscena para segmentos empresariais como o dos planos e seguros de saúde. Contra os associados e segurados, é claro.
Dilma prefere se vincular a Renan Calheiros e aliados de Aécio Neves a mobilizar a base social que a elegeu. Na reunião com movimentos sociais na semana passada observou-se um paradoxo: boa parte dos movimentos a apoia, mas quase todas as ações do segundo mandato se confrontam com os estandartes dos movimentos.
A presidente tem hoje a seu favor as estatísticas sociais dos governos Lula-Dilma, quando a vida dos brasileiros melhorou, e o caráter legítimo da defesa da legalidade de quem foi escolhida pela maioria.
No mais, consagra a maldade, ao prejudicar sobretudo quem não desfralda bandeiras contra ela. Não é à toa que sua provação não alcança nem 10%.