PMs do Rio treinavam antiguerrilha contra ‘Alozirb’, ‘Brizola’ ao contrário
Mário Magalhães
Em 1978, o engenheiro Leonel de Moura Brizola, ex-governador do Rio Grande do Sul e deputado federal cassado em 1964, amargava o exílio. Perseguido pela ditadura nascente, deixara o país em seguida ao golpe de Estado contra seu cunhado João Goulart. Regressaria em 1979, ao abrigo da anistia. Em 1982 e 1990, elegeu-se governador do Rio de Janeiro. Entre um e outro triunfo, foi um dos líderes da Campanha das Diretas, em 1984, e quase passou ao segundo turno no pleito presidencial de 1989. Morreu em 2004.
Com o assassinato de Carlos Marighella em 1969, a ditadura abatera o guerrilheiro que o governo qualificara como ''inimigo público número 1''. Ao matar o capitão Carlos Lamarca, em 1971, as Forças Armadas eliminaram o revolucionário que, devido à origem na caserna, mais odiavam. Em 1978, ninguém era alvo de tanto ódio dos partidários da ditadura quanto Brizola.
Entre outras batalhas do gaúcho, ele comandara a resistência vitoriosa contra os golpistas que tentaram rasgar a Constituição em 1961. Propôs ao presidente Jango, sem sucesso, ir de novo à luta em 1964. Nos anos seguintes, até 1967, incentivou, do Uruguai, guerrilhas contra a ditadura. Desistiu da luta armada, manteve a militância oposicionista e acabou indo morar nos Estados Unidos.
No mesmo 1978, quando a anistia se aproximava, o jovem Ubiratan Angelo, de 21 anos, fazia treinamento antiguerrilha num curso da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. O futuro coronel Ubiratan seria o comandante-geral da PM de janeiro de 2007 a janeiro de 2008. Hoje na reserva, é o coordenador de Segurança Humana do Viva Rio.
O treinamento se chamava estágio básico de guerrilha e contraguerrilha. Os policiais aprendiam sobrevivência na selva, patrulha, incursão. No teatro de operações, encenavam o combate a uma força guerrilheira empenhada na tomada do poder.
Quem era o líder dos guerrilheiros fake?
''O general Alozirb'', contou-me o coronel Ubiratan hoje de manhã.
E o que é Alozirb? ''Brizola ao contrário'', esclareceu o oficial.
O coronel afirma que só conhece o treinamento de sua turma, mas supõe que grupos anteriores já tivessem enfrentado o tal Alozirb.
É curioso que Alozirb, o inimigo, fosse um general. O posto indica um exército guerrilheiro, muito numeroso, e não organizações bem mais diminutas.
Mais de dez anos depois de abandonar o projeto da luta armada e sem jamais ter participado de ação guerrilheira, Brizola era o adversário que os jovens PMs eram ensinados a confrontar e matar.
Alozirb mostra o tamanho histórico de Leonel Brizola e a cultura de ódio à qual ele se opunha.
Em 1983, Brizola assumiu o governo e, mesmo com tropeços de gestão, aplicou uma política se segurança pública que considerava que a Polícia Militar deveria zelar pelos cidadãos.
E não tomar favelas e outras comunidades para achacar os pobres, esculachar os pobres, bater nos pobres, torturar os pobres, matar os pobres, sumir com os cadáveres dos pobres.
Muita gente que advoga orientação civilizatória e cidadã para a segurança, como o coronel Ubiratan, ecoa à sua maneira ideias do Brizola.
No livro ''Elite da Tropa'', Luiz Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel revelaram que integrantes do Bope planejaram matar o governador Brizola. O desvario não prosperou.
O velho Briza já era o alvo desde muito antes, no treinamento…
O que o espelho de Alozirb acharia do Brasil em transe de 2015?