Censura: punição a Luxemburgo e ameaça a Fred ferem liberdade de expressão
Mário Magalhães
Desculpem os rubro-negros, mas não tratarei dos 3 a 0 que o Flamengo sapecou no Fluminense.
Perdão, tricolores, porque vou ignorar a injusta expulsão do Fred, determinante para a assimetria entre os times em boa parte do clássico dominical.
Nada há mais encantador no futebol do que o futebol-futebol, mas quando trambiques alheios aos gramados influenciam o que acontece dentro deles, não tem jeito: calar equivale a aceitar que o extra-campo prevaleça sobre o jogo jogado.
A partida do Maracanã começou com uma vergonha constrangedora e uma cena para a história da decência no futebol brasileiro.
A vergonha foi a exclusão do técnico Vanderlei Luxemburgo, suspenso pela dita justiça desportiva por ter criticado a Federação de Futebol do Rio de Janeiro, a famigerada Ferj.
A cena para orgulhar as torcidas mostrou os jogadores das duas equipes perfilados e tapando as bocas, em protesto contra a censura à livre expressão _Luxa foi castigado por manifestar opinião.
Neste Fla-Flu, a democracia uniu os rivais.
É secundário o mérito ou demérito do pronunciamento do treinador do Flamengo _para mim, ele trava o bom combate.
Mas preferia que o antigo lateral-esquerdo tivesse tido a coragem de peitar a cartolagem mais retrógrada já nos tempos da CBF do Ricardo Teixeira, maioral que o técnico bajulava com apetite de famélico.
Agora, é o centroavante Fred quem passa a ser ameaçado de tomar um gancho, e maior que o do Luxemburgo.
É do jogo concordar ou divergir das estocadas do atacante contra a Ferj (fecho com ele) e da proposta de extinguir o campeonato do Rio (discordo).
Adoraria ter visto o Fred batalhando no passado para que no futebol valha resultado obtido com a bola rolando, e não em tapetões.
Embora Luxemburgo e Fred abordem temas relevantes, há uma questão preliminar à discussão sobre suas ideias: a Constituição assegura aos cidadãos a expressão de pensamento.
Não há fundamento moral ou legal para legislação específica, como a do futebol, sobrepujar a Carta suprema.
Imagine se um condomínio resolve estabelecer em regimento a permissão aos moradores para assassinar vizinhos que cantam alto demais. Não pode, porque vigoram leis superiores que se impõem a todos e criminalizam o homicídio.
A cartolagem da Ferj, no século XXI, comporta-se como se estivesse na Idade Média.
Ao menos, julga ter prerrogativas de ditador dos tempos da ditadura mais recente, quando a censura impedia os brasileiros de dizerem o que ia por suas cabeças e corações.
A punição ao Luxemburgo e a ameaça ao Fred são um vexame, o 7 a 1 liberticida.
Impor censura a essa altura do campeonato só é possível porque muita gente prefere silenciar, em vez de enfrentar o obscurantismo.
O Ministério Público vai deixar por isso mesmo?