Blog do Mario Magalhaes

Arquivo : abril 2015

17 heróis: policiais se negam a bater em professor, são presos e dão lição
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Mário Magalhães

Assim a PM trata os professores no Paraná - Foto Joka Madruga/Futura Press/Estadão Conteúdo

Assim a PM trata os professores no Paraná – Foto Joka Madruga/Futura Press/Estadão Conteúdo

 

Quem disse que os porteiros de Auschwitz não tinham escolha?

Que os médicos de salas de tortura não poderiam se recusar a estar ali?

Que soldados não têm chance de recorrer a objeções de consciência para não massacrar os mais fracos?

Que taxista carece do direito de se negar a rodar com o taxímetro adulterado pelo dono da frota?

Que funcionário de empresa privada e funcionário de companhia pública devem fingir que não veem assaltos ao patrimônio público?

Que jornalistas não têm como se rebelar contra a manipulação inescrupulosa de informações?

Sim, é possível dizer não.

Eis a lição dos pelo menos 17 policiais militares do Paraná que ontem disseram não à ordem de atacar milhares de professores que protestavam contra a iminente retirada de direitos seus pela Assembleia Legislativa.

A Polícia Militar informou que esses policiais foram presos por se recusar a participar do “cerco” contra os mestres em greve.

“Cerco” é eufemismo. Não se tratava de cercar, bem sabiam os 17.

A PM avançou contra os professores empregando cão pitbull. Um dos cachorros mordeu um cinegrafista da Band.

Quais são os valores de uma corporação que lança pitbull contra professor e jornalista?

Atiraram com bala de borracha mirando a cabeça.

Bala de borracha pode matar, ferir gravemente, deixar sequelas.

Um chefe mandou bater com o cassetete por baixo, para evitar imagens.

Os professores só queriam assistir à sessão da Assembleia que tornaria ainda mais difícil a vida dos trabalhadores da educação.

Os PMs jogaram bombas de gás que afetaram até crianças em uma creche vizinha.

Saber que há creche ao lado e lançar gás configura selvageria imoral.

É mais digna a retirada do que maltratar criança.

Os 17 do Paraná disseram não a tudo isso.

Pobre do país que precisa de heróis é uma boa tirada, mas circunscrita a circunstâncias.

Miserável é a nação que ergue monumentos para heróis de fancaria.

Como disse noutra quadra um grande cronista, o povo urina nos heróis de pedestal.

Os 17 PMs honraram a promessa de proteger os cidadãos.

E periga serem os mais atingidos pela truculência do governo Beto Richa.

A quarta-feira sangrenta deixou centenas de professores feridos em Curitiba.

Mas também legou a lição de 17 policiais que são heróis brasileiros.

P.S. 1: o post acima foi baseado em reportagem do “Estadão Conteúdo”. Tal reportagem foi reproduzida ou noticiada pelo UOL, “Veja”, “Gazeta do Povo” e outros portais e publicações. De acordo com o “Estadão Conteúdo”, a origem do relato sobre a prisão de policiais que se recusaram a participar do “cerco” aos professores foi a própria Polícia Militar do Paraná. Nesta quarta-feira, uma porta-voz da PM afirmou que não procede a informação sobre prisão de policiais. E que nenhum deles teria se negado a participar da operação contra os manifestantes. Quando houver mais informações sobre as versões da PM e o que realmente ocorreu, o blog voltará ao assunto (quinta-feira, 30/04/2015, às 16h04).

P.S.2: os fatos indicam que os policiais heróis no Paraná não passaram de sonho de um dia de outono. O “Estadão Conteúdo” havia divulgado que a informação sobre a prisão de 17 PMs, por se recusarem a participar de “cerco” contra os professores na quarta-feira, tinha como fonte o comando da Polícia Militar do Estado do Paraná. Mas a PM negou. E não surgiu até agora qualquer relato específico sobre policial que tenha dito não à pancadaria contra os professores em Curitiba. Mais informações estão no post recém-publicado pelo blog (leia-o aqui). Seria jornalisticamente errado e intelectualmente desonesto apagar o post acima. A opinião do blog é verdadeira. A notícia, ao que parece, é que não era (sexta-feira, 01/05/2015, às 10h52).

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Messi imita Zico ao ensaiar reinvenção como craque supremo
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Mário Magalhães

Museu do Barcelona, no Camp Nou, em 2014

Museu do Barcelona, 2014: para o seu clube, Messi é o melhor da história

 

Qualquer pessoa que entenda minimamente de futebol sabe que o Zico jogou muito mais do que o Messi.

E do que o Pelé, o Maradona, o Di Stéfano e outros bambambãs.

Mas não é essa a discussão, recuso-me a debater o óbvio, a condição do eterno craque rubro-negro como o melhor do planeta em todos os tempos.

A questão é outra, a partir da observação do Messi, o número 1 da atualidade, nesta temporada que se aproxima do fim.

Antes mesmo de completar os 28 anos, que chegam em junho, o argentino está jogando diferente, mais atrás. Lembra o Zico no fim de carreira.

Com os joelhos detonados, o Galinho uniu o talento à inteligência para se reinventar em campo.

Ele exercia a função então denominada ponta-de-lança. Bem denominada: era um pouco meia ofensivo, um pouco atacante, ciscava livremente entre o meio e a frente, mais no ataque.

Acumulava gol em cima de gol. Consagrou-se como o artilheiro insuperável do Maracanã.

Debilitado fisicamente, o Zico passou, sobretudo no segundo tempo, a ficar mais plantado no meio do campo e na intermediária ofensiva, lançando seus companheiros com a generosidade de um Papai Noel de ano inteiro.

A virada do Messi lembra a do Zico.

Havia uma necessidade dele e do Barcelona na mudança.

Recapitulando, o auge do Messi foi com o Guardiola como técnico. Com o catalão, o baixote passou a jogar no meio do ataque, com liberdade, principalmente pela direita, conspirando com o Xavi e o Daniel Alves. Cansou de levar perigo e marcar carregando a bola da direita para o centro, antes de chutar com a canhota.

Só que a nova posição ficou manjada, e os oponentes aprenderam a marcá-lo com mais eficiência.

Ao mesmo tempo em que o Xavi e o Iniesta envelheciam e se tornavam mais lentos. Mas com os treinadores Tito e Tata (não é desenho animado) Messi continuou no meio, com as ações dificultadas.

Agora, com o Luis Henrique, voltou a ter a posição base na direita no ataque. As antigas receitas para anulá-lo caducaram, e ele surpreende de novo.

Não deixa de ser ironia, porque o Luis Henrique tem provado ser um técnico limitado, que no entanto se beneficia de um tremendo elenco e de uma baita cultura futebolística.

A outra necessidade de mexer o lugar do Messi em campo, ainda que sem aprisioná-lo num canto, é o fato de o novo contratado Suárez render mais no centro do ataque.

Pela esquerda, há outro craque, o Neymar.

Juntos, os três formam o melhor ataque do mundo.

E o melhor do Barça na história, 102 gols na temporada. Ontem, nos 6 a 0 sobre o Getafe, o Messi e o Suárez acumularam mais dois, e o Neymar, um.

O Messi fez gol de pênalti, com cavadinha (sua primeira); com bola em movimento; deu passe para gol; iniciou jogada de gol. Espetacular!

É provável que sua média de gols venha a decair, e que a de assistências aumente.

Hoje, no Barcelona, ninguém faz tantos gols como ele.

E ninguém dá tantos passes para gol.

Melhor só o Zico.

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É hipocrisia condenar execução na Indonésia e defender pena de morte aqui
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Mário Magalhães

Assim mataram Rodrigo – Reprodução da “Folha de S. Paulo”

 

Decidam logo, uma coisa ou outra.

Não dá para se horrorizar com o fuzilamento do brasileiro Rodrigo Gularte na Indonésia e ao mesmo tempo pregar a introdução da pena de morte no Brasil.

O castigo capital para Gularte, condenado por tráfico de drogas, constitui medida primitiva, intolerante e intolerável.

É irreversível. Acabou.

Com ele, outros sete homens foram mortos ontem diante do pelotão de atiradores.

“Daqui irei para o céu”, disse Rodrigo horas antes de se despedir da vida, aos 42 anos.

E irão para os panteão dos hipócritas os que denunciam a barbárie contra o brasileiro, mas bradam pela adoção da pena de morte aqui.

P.S.: hoje a pena de morte só é prevista no Brasil por crimes em caso de “guerra declarada”. Mesmo essa hipótese pouco provável deveria ser abolida da Constituição.

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A morte da torturada e o torturador feliz com nova decisão da Justiça
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Mário Magalhães

A ex-presa política Inês Etienne Romeu antes de depor na Comissão da Verdade, no Arquivo Nacional, no Rio

Inês Etienne Romeu, em 2014 – Foto Daniel Marenco/Folhapress

Coronel Ustra - Foto Sérgio Lima/Folhapress

Coronel Ustra – Foto Sérgio Lima/Folhapress

 

Se o escritor Gabriel García Márquez viveu para contar, como resume o título de suas memórias, a guerrilheira Inês Etienne Romeu sobreviveu para contar.

Contou o que viu e viveu na Casa da Morte, antro clandestino de tortura e execução de oposicionistas que a ditadura manteve em Petrópolis ao menos na primeira metade da década de 1970.

Aos 72 anos, Inês morreu ontem, cansada de tantas batalhas. De acordo com parentes, partiu enquanto dormia.

Ela sobreviveu à Casa da Morte e, depois da anistia, foi responsável pela revelação da existência daquele aparelho dedicado ao sadismo e a horrores, síntese da tortura adotada como política de Estado.

Presa em 1971 pelo delegado Fleury e sua turma, acabou na Casa da Morte, de onde saiu para cumprir pena até 1979.

Sem sua coragem e perseverança, o Brasil desconheceria um dos endereços mais sombrios do nosso século 20.

Em 1989, Inês narrou a Fábio Konder Comparato seu calvário de 96 dias na Casa da Morte. De acordo com o jurista, conforme destacou o relatório da Comissão Nacional da Verdade, a antiga presa política lhe falou:

“Professor, eu não quero um tostão de indenização. Esse dinheiro de indenização vem do povo, e a grande vítima é o povo. […] O que eu quero é que a Justiça do meu país reconheça oficialmente que eu fui sequestrada, mantida em cárcere privado, estuprada três vezes por agentes públicos federais pagos com o dinheiro do povo brasileiro”.

Coincidência cruel, no mesmo dia em que Inês partiu tomou-se conhecimento de notícia alvissareira para o ex-chefe do maior campo de concentração, tortura e extermínio mantido pela ditadura. O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra recebeu boa nova do Supremo Tribunal Federal.

Na semana passada, decisão provisória da ministra Rosa Weber suspendeu ação penal que tramita em São Paulo contra o oficial do Exército e dois cupinchas seus, um deles figurinha fácil em protestos de rua recentes.

Ustra foi acusado pelo Ministério Público Federal como um dos autores do sequestro do militante Edgar de Aquino Duarte, desaparecido em 1971.

Como o cidadão sequestrado continua sumido, o crime de sequestro permanece, está em curso. Por isso, Ustra e os dois policiais civis não estão amparados pela Lei de Anistia de 1979, interpretam os procuradores da República que ingressaram com a ação.

“Rosa Weber considerou que o tema é objeto de dois processos que estão pendentes de julgamento pelo plenário do tribunal”, informa reportagem de Márcio Falcão (leia aqui).

Inês Etienne Romeu, mulher valente, só queria justiça.

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A primeira sessão de cinema: Paris, Padura e uma projeção histórica
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Mário Magalhães

 

O filmete de menos de um minuto que pode ser assistido clicando na imagem acima é historicamente um filmão, uma das sequências pioneiras do cinema, produção dos irmãos Lumière.

Louis o filmou em 1895, em Lyon. Intitula-se “A saída da fábrica Lumière em Lyon”.

No mesmo ano, ele e o irmão Auguste o exibiram em Paris, no evento considerado a primeira sessão paga de cinema.

Outro dia o jornalista e escritor cubano Leonardo Padura visitou o local da filmagem, como ele conta aqui.

Na capital francesa, uma exposição celebra os 120 anos da façanha, como informa Rachel Donadio.

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‘Madame Bovary’: três frases inesquecíveis
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Mário Magalhães

Primeira edição em livro: 1857

 

Por conta de umas questões paralelas, reli “Madame Bovary”.

Mais de um século e meio depois do lançamento em formato de folhetim, o romance de Gustave Flaubert permanece vigoroso como o bovarismo.

Entre um montão de frases célebres, selecionei três, numa edição de 2002 da Nova Cultural (a identidade do tradutor é controversa, por isso não menciono seu nome).

Ei-las:

“Todo tabelião traz em si os despojos de um poeta.”

“Um pedido pecuniário, de todas as borrascas que podem cair sobre o amor, é a mais fria, e a mais devastadora.”

“Foi culpa da fatalidade!” (Charles Bovary, um dos mais mansos personagens da literatura, a um antigo amante de sua mulher)

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Campeonato do Rio já tem o melhor técnico: Renê Simões, do Botafogo
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Mário Magalhães

O treinador Renê Simões – Foto Vitor Silva / SSPress

 

O Botafogo mosqueou nos acréscimos e perdeu ontem para o Vasco, gol de Rafael Silva, no primeiro jogo da decisão do Campeonato Estadual do Rio.

O campeão só sai no domingo, mas o alvinegro já tem um título simbólico, o de melhor técnico da competição.

Antes da partida de ontem, o time do treinador Renê Simões havia marcado em todos os confrontos.

Para quem acha que isso não tem nada de especial, basta comparar com o Flamengo, que em seus três derradeiros jogos no campeonato foi incapaz de anotar um mísero golzinho.

No clássico contra o Vasco, o Botafogo enfiou duas bolas na trave, poderia ter colhido resultado melhor.

Havia sido campeão da Taça Guanabara, a fase de pontos corridos, antes do mata-mata.

Isso tudo quer dizer que os botafoguenses têm a melhor equipe carioca?

Não.

Mas Renê montou um time capaz de jogar de igual para igual com os rivais.

O que distingue seu trabalho é que, ao contrário dos colegas de Flamengo, Vasco e Fluminense, o treineiro do Botafogo conta com um elenco de segunda divisão.

Não se trata de interpretação, mas de fato: o clube foi rebaixado e disputará a série B do Campeonato Brasileiro.

Além de todas as limitações, sobrevieram problemas como a nova suspensão de Jóbson, jogador doente que precisa mais de ajuda que de castigo.

A não ser que Renê Simões cometa um gesto tresloucado na finalíssima, tipo escalar o atacante Bill como goleiro, ele merece o reconhecimento como melhor técnico do campeonato.

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Taxistas de aeroporto intimidam passageiros para evitar corrida tabelada
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Mário Magalhães

Aeroporto Santos Dumont, terça-feira, 21 de abril de 2015: falta o alerta "cuidado com a garfada"

Aeroporto Santos Dumont, abril de 2015: falta o alerta “cuidado com a garfada”

 

Esta é uma daquelas batalhas perdidas, mas voltemos à picaretagem atávica no esquema de táxis do aeroporto Santos Dumont, aqui no Rio.

Terça-feira, quase seis da tarde, saída da sala de esteiras de bagagem, setor de desembarque.

Numerosos motoristas assediam _abordar é outra coisa, menos agressiva_ os recém-chegados, para que estes não embarquem nos táxis autorizados, comuns ou especiais, nos quais se supõe existir mais segurança.

Volta e meia, o Departamento de Transportes Rodoviários do Estado do Rio de Janeiro faz uma operação no Santos Dumont, apreende alguns táxis piratas, solta fogos de artifício em autopromoção, e depois tudo continua como dantes. Em janeiro, foi assim.

Na fila dos táxis comuns, um taxista de camisa verde circula perguntando “quem vai para a Barra?”.

Ele age mancomunado com os poucos funcionários da cooperativa de taxistas que organizam a fila.

Na prática, está recusando trechos mais curtos e exigindo um de dezenas de quilômetros, para a zona oeste, ainda mais lucrativo em dia de bandeira 2, pois é 21 de abril.

Em dezembro de 2013, o prefeito Eduardo Paes baixou decreto fixando em R$ 625 a multa para motorista de praça que recusa corrida.

Outra medida, do Código Disciplinar do Sistema de Táxis, limitada às aparências.

O taxista de camisa verde acrescenta: “No taxímetro!”.

Bem ao lado vê-se o painel reproduzido no alto deste post: resolução de janeiro da Secretaria Municipal de Transportes determina que “ficam pré-estabelecidas as tarifas abaixo descriminadas”.

Entre elas, o trajeto Santos Dumont-Barra da Tijuca, mais de R$ 100, com bandeira 1 ou 2.

Quando os passageiros se aproximam da calçada podem ver que à direita há táxis que estacionam depois de passar por fora da fila. São os que aguardam corridas mais caras.

Porque, na fila, os funcionários da cooperativa vão indagando, passageiro por passageiro, qual é o destino.

Em seguida, informam que o preço será “o do taxímetro”.

Um ou outro passageiro sabedor da armação aponta para o painel, e a funcionária que coordena a fila reage em tom intimidatório, respondendo que estão trabalhando no taxímetro.

Ao menos um passageiro avisa que pagará de acordo a resolução oficial, e a chefe da fila, com ares de dedo-dura, alerta irritadíssima um motorista sobre o viajante que exigiu pagar segundo a tabela.

Os funcionários da cooperativa trabalham para os taxistas.

O curioso é que em janeiro houve reajuste dos valores.

Por que a insistência em fugir do que está previsto legalmente?

Será que, no taxímetro, o percurso ganha alguns quilômetros?

Ou os números do taxímetro não batem com os da tabela, em relação à qual não houve chiadeira em relação aos preços?

No ano que vem, o Rio abrigará a Olimpíada. Não faltará turista na fila de táxis do Santos Dumont.

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