Dilma erra demais, parece zonza e fornece munição ao golpismo
Mário Magalhães
Foram pífias as declarações de Dilma Rousseff, nesta segunda-feira, ao tratar do panelaço da véspera, promovido por cidadãos que não haviam votado nela em outubro e continuam, como é seu direito, esperneando contra o governo.
Indagada sobre o impeachment a ser reivindicado em protestos programados para o domingo, a presidente constitucional tinha duas opções: calar, de modo a não dar corda ao movimento, ou repudiar a conspiração com palavras à altura do que se propõe: trata-se de golpismo, promoção de golpe de Estado, uma aberração ocorrida pela última vez há 51 anos e cujo conteúdo é desprezar a legitimidade da manifestação soberana dos brasileiros nas urnas.
Em vez disso, Dilma falou em tom leve sobre ''ruptura democrática'' e ''terceiro turno''.
Ao não pronunciar os substantivos golpe e golpismo ela se recusou a chamar as coisas pelo nome.
Levantou a bola para os adversários cortarem, ao dizer: ''Eu acho que há que caracterizar razões para o impeachment''.
Por que não proclamar que, como não há razões para o impeachment (inexistem indícios sobre o envolvimento presidencial em falcatruas), sugeri-lo equivale a estimular golpe de Estado?
Os rivais mais moderados repetiram as expressões da presidente e acrescentaram o ''ainda'' e o ''por enquanto'', duas tiradas que traem torcida e preferências (ninguém escreve ''ainda'' não há provas de que Aécio Neves e Antonio Anastasia operaram juntos em jogadas obscuras).
O discurso televisivo de um quarto de hora na TV, anteontem à noite, já constituíra erro de Dilma. Erro, não. Erros muitos.
O maior foi, 48 horas depois da divulgação da lista de políticos a investigar na operação Lava Jato, conforme os critérios do procurador-geral da República, ir à televisão praticamente sem tocar no assunto, a não ser em uma ou duas frases enviesadas sobre corrupção.
A presidente parece zonza, alheia ao mundo real e capturada pelas fantasias palacianas. Com a temperatura política altíssima no país, ela ofereceu uma ocasião favorável _o domingo à noite, com as famílias de classe média para cima em casa_ para que ocorresse o bate-panela.
Depois de sumir por semanas, Dilma reapareceu nos últimos dias. Mas dar as caras na TV uma semana antes das manifestações que pedem o impeachment é de uma ingenuidade pueril. Fornece munição aos seus inimigos. A tendência, agora, é o comparecimento de muito mais gente.
O conteúdo do que a presidente falou feriu o bom senso. Ao sustentar que a política econômica implementada em seu segundo mandato não ataca direitos dos trabalhadores, ela negou a realidade e confrontou os sindicalistas e militantes de movimentos sociais que preparam atos na sexta-feira, contra o arrocho _mas em defesa da democracia e a favor da soberania do sufrágio popular.
Enquanto Dilma discursava, a UFRJ decidia adiar a volta às aulas porque não tem dinheiro nem para limpar as instalações universitárias. Na tela, papo. Na realidade, consequências do mal denominado ''ajuste'', proposto por Aécio na campanha eleitoral e adotado por Dilma.
O erro maior, na raiz dos demais, foi trocar o seu programa de candidata pelo do rival do segundo turno. Dilma submete-se a chantagens várias, descaracterizando o que havia de positivo em sua gestão (basta observar o aumento do imposto de renda, castigando os assalariados).
Mesmo com estratégia duvidosa, é incrível o acúmulo de erros táticos.
O que explica Mangabeira Unger no governo? Talento de administrador? Seria novidade. Ampliação da base no Congresso? Idem. O reforço de um formulador de talento? Fala sério.
Enquanto confronta raposas na Câmara e no Senado, a presidente, como já fizera no primeiro mandato, cerca-se de auxiliares com autoridade política no máximo regional.
Está brincando com fogo. Mais precisamente, com golpistas.
Hoje estamos no 69º dia do governo Dilma Reloaded. O bebê lembra o jovem Benjamin Button.