Brava gente: estátua de ditador é derrubada, e ponte Médici mudará de nome
Mário Magalhães
Faz quatro décadas, mas eu nunca me esqueci do nome da guria e da cidade.
Convivi fugazmente com ela nas ''reuniões dançantes'' _assim os convescotes infanto-juvenis eram chamados em Porto Alegre_ que meus primos promoviam e frequentavam.
A Kika não morava na terra que adotou o Erico e o Falcão. Como eu, passava alguns dias de férias por lá. A Kika era de Taquari.
Nunca fui a Taquari, nem voltei a ver a Kika, que também deve estar virando cinquentona.
Nas tais ''reuniões'', a gente dançava junto baladas do Johnny Rivers.
Aquele tempo ficou para trás, e eu vim a saber que Taquari (RS) era o município natal de Arthur da Costa e Silva, o ditador que comandou o Brasil de 1967 a 1969.
O marechal era conhecido como prócer da linha-dura do Exército e por sua proverbial ignorância.
Em sua administração, a ditadura baixou o Ato Institucional número 5, que sufocou ainda mais as liberdades e incentivou as atrocidades contra oposicionistas. Num exemplo, expandiu a tortura.
Em 1976, com o déspota já morto, bajuladores de tiranias colocaram em praça pública uma estátua do Costa e Silva. Lá em Taquari.
Pois nesta terça-feira, dia da graça de 16 de dezembro de 2014, a prefeitura mandou retirar o monumento do local onde estava e recolhê-lo a um museu dedicado à memória do velho ditador. Afirmou que, com a divulgação do relatório da Comissão Nacional da Verdade, constituiria absurdo celebrar um notório promotor de violações dos direitos humanos.
As viúvas da ditadura, poucas, mas barulhentas, chiaram.
A prefeitura respondeu argumentando que ''não havia razão para manter uma homenagem no maior ponto turístico da cidade, espaço de demonstrações culturais, justamente a quem promoveu um período nebuloso na história do país. Cidadãos de Taquari, inclusive, sofreram as mazelas daquele período'' (leia aqui a íntegra da nota).
Na véspera, a Câmara Municipal de Volta Redonda (RJ) havia tomado decisão com idêntico conteúdo: por unanimidade, aprovou projeto de lei trocando o nome da ponte Presidente Médici para ponte Dom Waldyr Calheiros. Só falta a sanção do prefeito (mais informações aqui).
O governo do ditador Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) foi o mais truculento e homicida na quadra sombria que vigorou a partir do golpe de Estado de 1964.
Dom Waldyr Calheiros foi um bispo de coragem que enfrentou a ditadura e amparou os pobres.
A Prefeitura de Taquari e a Câmara de Volta Redonda deveriam inspirar os brasileiros de todos os cantos, brava gente, a imitarem seus gestos.
A Alemanha acabou com os logradouros batizados o nome de Hitler; a Itália, com o de Mussolini; e a Argentina, com o de Videla.
Para quem acha que o Brasil é caranguejo, as duas boas novas mostram que, apesar dos pesares, não andamos para trás.
O que será que a Kika está achando de tudo isso?