Blog do Mario Magalhaes

Despenca a mortalidade infantil. O Brasil melhorou? Viva o povo brasileiro!

Mário Magalhães

blog - enterro anjinho

Enterro de bebê no sertão cearense – Foto Alex Costa/Reprodução ''Diário do Nordeste''

 

A notícia é tão alvissareira que merecia confraternização entre antagonistas, as manchetes em 50 tons, mas manchetes, um Fortal fora de época, uma nova canção do Roberto, dez subidas-e-descidas sem descanso na escadaria da igreja da Penha, a Cora dar um tempo nas maldades, a descoberta de uma letra inédita do Renato Russo, um novo gol impossível do Neymar, uma carraspana épica para celebrar a façanha igualmente épica: em dez anos, a mortalidade infantil no Brasil despencou quase para a metade, atingindo em 2013 a marca recorde de 15 bebês, a cada mil nascidos vivos, mortos até completar um ano.

Ninguém vai mitigar a dor das mães e pais que perderam suas crias, mas há cada vez menos lágrimas.

Não porque a tristeza de cada um diminua. E sim porque os anjinhos são cada vez menos.

Como sabe quem emburaca pelos sertões, ficou mais difícil, eita boa nova, vislumbrar as procissões com pequenos caixões brancos ou às vezes caixinhas improvisadas de papelão para enterrar os brasileiros que não tiveram chance de viver.

O IBGE anunciou nesta semana que a mortalidade infantil, 29,7/mil em 2003, primeiro ano Lula, não passou de 15/mil no ano passado, terceiro ano Dilma (leia reportagem do UOL).

De 2012 para o ano seguinte, a expectativa de vida aumentou e estabeleceu números inéditos.

Para quem considera a vida e o ser humano os critérios essenciais de percepção do mundo, o Brasil melhorou.

E olha que ainda estamos desgraçadamente entre os bambambãs da desigualdade, sempre emplacando o ranking dos dez mais _ou menos_ do planeta.

O abismo entre os mais ricos e os mais pobres é tão obsceno que cenas como a da menina se banhando na água imunda de um bueiro do Rio choca, mas não surpreende.

Mas que o Brasil foi para a frente, isso foi.

Olhar ainda mais para trás ajuda a compreender como progredimos.

Em 1945, perto de 250 bebês, um em cada quatro, morriam em Salvador antes do aniversário de um ano. Na capital da Bahia, e não no interior mais miserável, onde a desnutrição e as doenças associadas à pobreza exterminavam com mais furor.

Vai dizer para uma mãe que perdeu seu filho que o Brasil não melhorou. Que tanto faz a morte de mais ou menos crianças.

Na Constituinte de 1946, em seguida ao fim da ditadura assassina do Estado Novo (1937-1945), não havia uma só mulher eleita entre as centenas de deputados e senadores que formaram a Casa unicameral.

Nenhuma mulher!

Quando o então constituinte Carlos Marighella defendeu o direito ao divórcio, sua proposta perdeu de um montão a um montinho de votos.

Mas na década de 1970 o divórcio seria introduzido.

Também na Constituinte de 1946, a iniciativa de introduzir o 13º salário, batizado como Abono de Natal, também foi trucidada.

Acabou entrando em vigor na alvorada dos anos 1960.

A queda da mortalidade infantil, o crescimento _grande, mas insuficiente_ da representação feminina, o 13º e o divórcio, todas essas novidades tiveram uma característica comum: só existem porque os brasileiros se mobilizaram, foram à luta, choraram para mamar, como ensina a marchinha.

Nada caiu do céu. Nem cairia, na nação onde a elite estendeu a escravidão até quando nenhum país da importância do Brasil ainda a mantinha.

Tudo é conquista de muitas gerações.

O nível mais baixo da morte de crianças em todos os tempos merece ser celebrado.

E também deveria nos inspirar a combater, sem retrocessos, as desigualdades e injustiças que teimam em permanecer.

O Brasil melhorou. Viva o povo brasileiro!

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