O Flamengo e a síndrome de seleção: rir pra não chorar
Mário Magalhães
No domingo à tarde, o Flamengo chutou uma única vez no gol do Inter, sem perigo. O colorado somou 19 finalizações, marcou quatro vezes e só não ampliou porque desacelerou, como a Alemanha nos 7 a 1 contra o Brasil.
Horas antes dos 4 a 0, eu recebera um e-mail do pai, vascaíno, com o assunto ''Enfim, uma boa notícia''. A mensagem vinha com uma foto do Mick Jagger, o inglês de pés gélidos, vestido com o manto sagrado e anunciando: ''Vou permanecer no Brasil até o fim do Campeonato Brasileiro pra torcer agora pro meu Mengão''.
À noite, um irmão gremista enviou o torpedo: ''Vou mandar umas joelheiras de presente pra essa turma aí, porque de quatro vão machucar os joelhinhos''.
Para o torcedor do Vasco, que padece com o clube na segundona, não respondi. Para o do Grêmio, não resisti ao comentário de que ele estava, digamos, deliciando-se com o banquete alheio (as palavras não foram bem essas…).
O sábado já havia sido de piadas, nas festas julinas na escola das crianças e no prédio. Mas quem as contava eram os próprios rubro-negros, últimos colocados no Brasileirão. ''Gostou da nossa nova contratação, o Lahm? Lahm… terna!''.
Quem mais coleciona anedotas são os alvos da maledicência. Ninguém é tão sacaneado hoje como um torcedor do Flamengo.
Não lembro se foi no terceiro ou quarto gol dos alemães que o pessoal nas redondezas começou a gritar ''Mengo!'' nas janelas, brincando com a camisa vermelha e preta dos europeus. Aqui em casa, começamos a rir. Melhor do que chorar, certo?
Só assim para encarar os fiascos sucessivos do Flamengo.
Uma rubro-negra recém-entrada na adolescência veio me contar, assim que o vexame no Beira-Rio se encerrou: ''Sabe quem viu o Flamengo liderando a tabela? O Felipe Massa, quando o carro dele capotou e ele ficou de cabeça pra baixo''.
Ontem, o Amaral deve ter achado que não havia ninguém atrás dele, pois deixou o Juan cruzar livremente para o He-Man abrir o placar.
No segundo gol, o Mugni falhou, mas o Chicão fez um pênalti inacreditável, que ainda lhe custou a expulsão. Inacreditável porque ele já havia afastado a bola, na dividida.
Na saída para o intervalo, o André Santos disse na Globo: '' A nossa equipe estava bem''. Como pode estar bem um time que não ameaça o adversário num esporte em que vence quem faz gols?
No terceiro, a jogada dos donos da casa começou com o André Santos perdendo a pelota.
Mas o lateral-esquerdo não é culpado pelos horrores a que temos assistido em campo _a agressão que sofreu é covarde e criminosa.
E sim quem o contrata, essa cartolagem que se tem como genial, por ser originária do ''mercado'' _o financeiro, não o da bola.
E quem o escala. A propósito, depois de ter voltado de suas férias extemporâneas na Disney, o que o Ney Franco fez em um mês de treinos?
Ele é culpado por não ter definido o time, por treinar mal (o que é este bando?) e pela escalação suicida (insistir em Chicão e André Santos, para limitar a dois os exemplos).
Quem contratou o Ney Franco, ofendendo o Jayme de Almeida na saída? A tal cartolagem do ''mercado''.
Também têm culpa os bajuladores que defendem esses cartolas como o suprassumo da eficiência.
A falta de dinheiro é uma falácia. O Flamengo ostenta uma das mais caras folhas de pagamento do país _além da maior dívida entre as agremiações de futebol, como se viu ontem num ranking publicado pela ''Folha''.
Por que os aduladores estão em silêncio? Cadê os microfones para condenar até jornalista que revela salário de jogador, como no caso do Carlos Eduardo de lamentável memória?
Esses baba-ovos de dirigentes são um estorvo, e não trunfo do Flamengo.
O que resta à torcida é ir ao Maracanã para incentivar o time a não cair.
Até agora, com ingressos a preço abusivo, decisão dos cartolas do ''mercado'', foi difícil.
Pelo menos nisso essa gente terá de ceder, por uma questão de sobrevivência.