Blog do Mario Magalhaes

O escritor e o zumbido, por Paulo Scott (ou o silêncio partiu para sempre)

Mário Magalhães

Paulo Scott venceu a categoria de melhor romance com o livro "Habitante Irreal"

O escritor Paulo Scott – Foto Adriano Vizoni/Folhapress

 

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Topei com a coluna do Paulo Scott, no Blog da Companhia, e a pergunta se abrigou na minha cabeça como o zumbido nos ouvidos do poeta, contista e romancista: se, como o Paulo Scott, eu tivesse há oito anos, como ele escreve, ''um apito soando ininterruptamente dentro da cabeça'', será que eu aguentaria?

O zumbido é uma disfunção que veio para ficar, assim como o silêncio _silêncio-silêncio, sepulcral_ se foi para sempre.

O Paulo Scott aprendeu a conviver com o barulho intruso. Abaixo, seu texto:

* * *

A festa e a passagem

Por Paulo Scott

Na primeira vez que passei o carnaval no Rio de Janeiro, já sob a dinâmica deste ressurgimento dos blocos de rua — fenômeno que vem num crescendo espantoso desde o início dos anos dois mil —, ouvi de um casal de amigos cariocas que o bom da festa é a chance de ficar em silêncio e apenas sorrir, sorrir sem parar; lembro-me dela ter dito que no sorrir silencioso estava o segredo da desintoxicação existencial que só o carnaval propicia. Não me lembro de ter chegado perto de bloco de carnaval de rua ou de qualquer outra modalidade de carnaval naquele ano, lembro sim de passar o feriado encerrado nas sessões das salas de cinema de Botafogo, aqueles ambientes escuros e refrigerados onde se você tiver sorte de contar com assistentes civilizados poderá apreciar o que justamente o cinema tem de melhor (algo que a lógica da televisão, dos produtos para a televisão, por exemplo, jamais nos entregará): o silêncio, preciosos momentos de silêncio.

Há mais de oito anos sofro de uma condição física anômala chamada Tinittus, uma disfunção conhecida como zumbido constante nos ouvidos; é como se houvesse um apito soando ininterruptamente dentro da sua cabeça. Quando os sintomas surgiram e se intensificaram, busquei o melhor aconselhamento médico imaginável, consultas, exames, tratamentos, até chegar o dia em que, percebendo que o zumbido tinha vindo para ficar, eu simplesmente me resignei — embora baixo, há um percentual de pessoas afetadas por essa condição que se desestabilizam psicologicamente de maneira grave, principalmente quando se trata de um detalhe bem particular na rotina de todos nós, que é: conseguir dormir. Eu me dei conta de que o melhor a fazer era ignorar a orquestra de cigarras que vieram morar dentro da minha capacidade de ouvir e tocar a vida. Não houve drama.

Para ler a íntegra, basta clicar aqui.