Blog do Mario Magalhaes

Arquivo : dezembro 2013

Em 2014, como ensina o sábio Odair José, momentos felizes para todos!
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Mário Magalhães

Beijo retratado pelo fotógrafo Robert Doisneau na Paris de 1950: eis um momento feliz

 

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Cavucando na memória da música brasileira, não encontrei receita mais sábia de “felicidade” do que a do Odair José, à qual eu já aderira havia muito tempo: o melhor é esquecer a tal da felicidade e viver, sem cansar, os momentos felizes. Literalmente, “felicidade não existe, o que existe na vida são momentos felizes”.

Escrevi meses atrás sobre isso, no texto que compartilho abaixo.

A canção com o verso-lição é “A noite mais linda do mundo”, que pode ser ouvida clicando aqui.

Nascido neste atribulado 2013, o blog dá uma breve parada e regressa na segunda quinzena de janeiro.

Um 2014 com muitíssimos momentos felizes para todos!

Tim-tim.

*

A tal da felicidade

Três por quatro da alma, a música retrata uma angústia candente, a busca da felicidade. Desbravar o labirinto que desembocaria nesse sentimento supremo às vezes parece impossível. Quando se descobre a saída, logo o destino teima em escapulir por novos e tortuosos caminhos.

“Tristeza não tem fim, felicidade sim”, compôs Vinicius de Moraes, com Tom Jobim. Chico Buarque, em parceria com Francis Hime, polvilhou ceticismo: “Jura que a felicidade/ É mais que uma vontade/ É mais que uma quimera”. Roberto e Erasmo sugeriram, sem convicção: “Não fique triste, o mundo é bom, a felicidade até existe”.

Existe, mas pressupõe perigo, alertou a letra de Nando Reis em melodia de Samuel Rosa: “Ela não passa de um desejo inflamável”. Não é à toa que Belchior traduziu uma sacada de John Lennon, “a felicidade é uma arma quente”.

Tão quente que quem a encontra já cogita perdê-la, feito Renato Russo: “A felicidade mora aqui comigo, até segunda ordem”. Antes, Lupicinio Rodrigues padecera: “Felicidade foi-se embora, e a saudade no meu peito ainda mora”. Como Noel Rosa, em tabelinha com Renê Bittencourt: “Eu fico triste/ Quando vejo alguém contente/ Tenho inveja dessa gente/ Que não sabe o que é sofrer”.

A felicidade não constitui fetiche menor para quem julga ter decifrado seu DNA. “A felicidade mora ao lado, e quem não é tolo pode ver”, poetou Ronaldo Bastos, com acordes de Beto Guedes. Gonzaguinha alardeou, na versão contagiante das Frenéticas: “A tal da felicidade baterá em cada porta”.

O problema é que, se tudo é simples assim, muita gente se tinge de culpa quando não se sente feliz. A obsessão pela felicidade a transforma em miragem. Em vez de desfrutar do contentamento, nós nos atormentamos por ele não ser permanente.

Como se livrar da aflição? Recorrendo ao próprio cancioneiro nacional. Inspirado por uma noite de amor, Odair José pontificou: “Felicidade não existe, o que existe na vida são momentos felizes”.

Trocando em miúdos, seremos mais felizes se não nos enfeitiçarmos pela ideia da felicidade utópica, e sim por experiências felizes, muitas e muitas, mesmo fugazes, sem cansar, mas sem a ilusão da eternidade.

Odair já foi menosprezado como artista “brega”. No balanço sincero da história, eu o cultivo como um gigante do pensamento, do porte de um filósofo alemão, de um existencialista francês.

(Mário Magalhães, “Azul Magazine”, julho de 2013)


2013 consagra impunidade: ninguém paga por tragédia criminosa na boate Kiss
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Mário Magalhães

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Apregoam o fim da impunidade no Brasil, brandindo, numa indisfarçável misturada de alhos com bugalhos, a prisão dos acusados de matar o pedreiro Amarildo, do deputado condenado Natan Donadon, dos punidos do mensalão, do pessoal da máfia do ISS e até do sem-teto manifestante _tudo em 2013.

Mas a maracutaia do cartel no metrô até agora deu em nada.

E o Fluminense, outra vez, disputará no ano que vem uma competição para a qual seus resultados em campo não o habilitam.

Nosso país continua sendo, sim, um recanto de criminosos impunes, e não existe exemplo mais eloquente do que a tragédia criminosa na boate Kiss.

Parece que foi há uma eternidade, mas não tem nem um ano: na madrugada de 27 de janeiro, um incêndio na casa noturna de Santa Maria (RS) provocou a morte de 242 pessoas, jovens na esmagadora maioria.

Não há um só proprietário da boate Kiss em cana.

Nem autoridades públicas que permitiram que um estabelecimento sem condições de segurança funcionasse.

Enquanto não houver punição para o crime na boate Kiss, todo discurso sobre o fim da impunidade estará prejudicado pelo cinismo e pela hipocrisia.


Por que derrubaram Jango (2)
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Mário Magalhães

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Há 50 anos, em 27 de dezembro de 1963, também uma sexta-feira, os jornais noticiaram um comunicado de João Pinheiro Neto, presidente da Supra, a Superintendência de Política Agrária. Pinheiro Neto era o executivo do presidente João Goulart para a divisão de pelo menos uma pequena parte das terras no país do latifúndio.

O Decreto da Supra, marco do que seria o início da reforma agrária, só seria assinado por Jango em 13 de março de 1964, antes de se dirigir para o comício da Central do Brasil.

Novos capitalistas e herdeiros dos senhores feudais não admitiam perder nem um naco de suas propriedades rurais.

Os latifundiários estariam entre os principais agentes da deposição de Goulart.

Em 27 de dezembro de 1963, faltavam 97 dias para o golpe de Estado de 1º de abril de 1964.


Chegou! ‘Crecer a golpes’, livro sobre a América Latina nos últimos 40 anos
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Mário Magalhães

blog - crecer a golpes chegou

 

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Chegaram ontem aqui em casa dois exemplares de ‘Crecer a golpes’, livro lançado neste mês nos Estados Unidos, pela C. A. Press, editora de língua espanhola do Penguin Group.

Pouco mais de um ano depois de sair a biografia “Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo” (Companhia das Letras), tenho livro novo na praça: sou um dos 13 autores de ‘Crecer a golpes’, volume organizado pelo jornalista e escritor argentino Diego Fonseca. Entre os colegas de empreitada estão o cubano Leonardo Padura, o norte-americano Jon Lee Anderson, o nicaraguense Sergio Ramírez e o argentino Martín Caparrós.

A obra reúne crônicas e ensaios inéditos sobre 11 países da América Latina nos últimos 40 anos, além de um artigo sobre os EUA e outro sobre a Espanha no mesmo período. Isto é, desde o golpe de Estado no Chile, em 1973. Por isso o subtítulo é “Crónicas y ensayos de América Latina a cuarenta años de Allende e Pinochet”.

No meu caso, conto um pouco mais, a história do Brasil desde 1964 _o “nosso” golpe antecedeu o chileno em nove anos. Condenso a trajetória do país e minhas memórias acompanhando a seleção brasileira e meu ídolo supremo, Zico. Os triunfos e fracassos do futebol pontuam as aventuras e desventuras nacionais.

Infelizmente, não há por enquanto versão em português. A Amazon oferece a edição original, em castelhano (aqui).


Palavras malditas (6): um verdadeiro
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Mário Magalhães

Na “Tribuna da Imprensa”, em 1986, eu escrevia em máquinas – Foto multtclique.com.br

 

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Quase sempre que um substantivo vem antecedido da expressão “um verdadeiro”, o emprego destas duas palavras é impróprio ou excessivo. Na primeira hipótese, não há verdade, mas falsidade.

“Uma verdadeira multidão” pode significar duas coisas: que não se trata de multidão ou que é multidão. Num caso, “uma verdadeira” engana. No outro, não faz sentido, a não ser que se destine a diferenciar “uma verdadeira multidão” de “uma falsa multidão”. Nonsense.

Viveu “verdadeiro horror” pressupõe a existência de “falso horror”. Como será o horror falso?

Exemplo de excesso é o namoro que se transforma em “um verdadeiro inferno”. Como não se conhece o inferno fake, a não ser na ficção, o namoro era mesmo “um inferno”.

O “quase” do primeiro parágrafo se deve ao fato de que às vezes “um verdadeiro” tem tudo a ver, como em “um verdadeiro amigo”, contraste com falsos amigos.

E, na arte, “um verdadeiro gol de placa” constitui recurso retórico e poético para aclamar o golaço do inesquecível Fio Maravilha. Um achado do Jorge Ben(jor), e não “um verdadeiro” achado.


Eleições de craques divergem sobre Messi. E daí? Ele é disparado o melhor
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Mário Magalhães

blog - messi

Messi comemora gol no Camp Nou; ele ainda sobra na turma – Foto REUTERS/Albert Gea

 

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E a “Gazzetta dello Sport”, quem diria, deixou o Messi fora da seleção do ano (reportagem aqui). A grande sandice do diário italiano não foi excluir o argentino, que padeceu e padece de contusões musculares recorrentes, mas ignorar o Neymar, brilhante na Copa das Confederações e um sucesso em sua arrancada no Barça. Os caras ainda se dizem especialistas em futebol.

Já o “Guardian”, publicação (cada vez mais) digital e (menos) impressa inglesa, elegeu o Messi o melhor do ano, numa relação de dez craques. O Neymar ficou em sexto (aqui). Curioso: o jornal reverencia a recusa do Messi em se exibir feito pavão, mas classifica o sueco Ibrahimovic, contumaz praticante de pavonadas, em terceiro, à frente do francês Ribéry, que comeu a bola na Champions.

Na eleição da Fifa, eu votaria no Ribéry, e não no Messi ou no, por falar em pavonear, Cristiano Ronaldo.

Não que o Ribéry seja melhor que o português. A distância é maior ainda em relação ao rosarino. Mas o atacante mal-encarado foi decisivo para o Bayern no ano que se encerra, embora não tenha o futebol do, por exemplo, Neymar.

A despeito das contusões que castigam o Messi desde a Champions passada, ele continua sendo disparado o melhor jogador do mundo. O problema é que, como testemunhou seu companheiro Piqué, o gênio perdeu a confiança, devido aos músculos cansados. E o Messi precisa estar muito bem fisicamente, como quase sempre esteve, para render como pode, sobretudo esbanjando vigor nas arrancadas.

O Neymar pode e deve chegar um dia à condição de número 1 do planeta. O tempo para essa consagração dependerá da retomada _ou não_ da capacidade de o Messi jogar em altíssimo nível.

O Cristiano Ronaldo é um dos gigantes da nossa época. Porém, no balanço sincero da história, não dá para ele encarar o Messi, um dos melhores de todos os tempos.

Para o bem do futebol, tomara que o Messi volte bem e que chegue no auge para a Copa. Se ele vier, minha segunda torcida será para a Argentina, depois, é claro, do Brasil.


Feliz Natal
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Mário Magalhães

 

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Se as autoridades honrarem a promessa, um velho centro de tortura, mantido pela polícia política gaúcha nos anos 1960, vai mesmo se transformar em memorial em defesa da civilização e dos direitos humanos. Receberá o nome de Ico Lisboa, guerrilheiro morto pela ditadura, como contei aqui.

Nei Lisboa, grande compositor, participou da manifestação da semana passada, no casarão onde funcionavam as câmaras de tortura. Ele é irmão de Luiz Eurico Lisboa, o Ico.

No ato, Nei cantou “A vida inteira”, canção belíssima, dessas capazes de mexer até com o mais insensível dos viventes.

Basta clicar acima para ouvir. É o cartão de Natal do blog.

Feliz Natal!


Há 99 anos, soldados oponentes pararam guerra e confraternizaram no Natal
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Mário Magalhães

Soldados britânicos na I Guerra Mundial – Foto reprodução

 

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Grande história, a que o “El País” publicou para brindar o Natal. Quem a conta é Walter Oppenheimer, de Londres: nas trincheiras do confronto que no futuro viria a ser conhecido como I Guerra Mundial, soldados alemães e britânicos consagraram uma trégua durante o Natal de 1914.

De um lado da trincheira, os combatentes germânicos cantaram o cântico “Noite de paz”. Do outro, os oponentes retrucaram com seus clássicos natalinos, em inglês. Por alguns dias, as armas se calaram. As tropas acabaram, umas contra as outras, confraternizando e se enfrentando não para matar, mas numa cancha de futebol.

A reportagem “O primeiro gol contra o belicismo” pode ser lida clicando aqui.

A seu modo, os soldados, bucha de canhão de quem não se arriscava no front, mostraram que inimigos não eram os povos, mas seus governantes.