Retrato de Eike no auge (e alguns pitacos para seu ‘obituário’ precoce)
Mário Magalhães
( Para seguir o blog no Twitter: @mariomagalhaes_ )
Eike Batista preferiria que não fosse assim, mas, para sua infelicidade, o grande Gatsby, protagonista do romance clássico de F. Scott Fitzgerald, enganava-se ao supor ser possível repetir o passado. Com a ruína do seu império, o brasileiro que sonhava ser o rico mais rico do mundo tornou-se personagem de ''obituários'' precoces. Ainda que venham a lhe sobrar alguns bilhões de patrimônio, ele não reviverá a quimera de deixar Gates e Buffet comendo poeira nos rankings da fortuna.
Na ascensão, Eike recorreu a cartomante, bruxa, feng shui e horóscopo, como se lê mais abaixo. Mais tarde, talvez os tenha esquecido. Certamente, os astros o abandonaram na queda. Um observador da natureza humana sintetiza o homem X: com alma de garimpeiro, ele apostou tudo no petróleo; em vez de bamburrar, afundou-se no óleo escasso de seus poços.
Houve mais erros relevantes, um deles subestimar o perigo de virar alvo político ao se estabelecer como símbolo de prosperidade nos anos Lula. Outro: considerar que a bênção dos governos petistas, empenhados em consolidar grandes conglomerados nacionais, iria lhe servir eternamente de escudo na disputa com concorrentes que tiveram pretensões contrariadas, como no setor dos portos.
Os anos passarão, e não vão faltar historiadores, sociólogos, economistas e cientistas políticos dispostos a decifrar os enigmas de Eike. No presente, constata-se que de alguma forma ele simbolizou uma política em que se fantasiava eliminar a luta de classes. Seria concebível fazer ao mesmo tempo os pobres menos pobres e os ricos mais ricos, descartando confrontos e amenizando tensões. Mais do que a debacle de Eike, o labirinto do governo Dilma Rousseff decorre dessa política lulista.
Em setembro e outubro de 2009, escalado pela “Folha de S. Paulo”, elaborei um perfil de Eike Batista. Ele ainda galgaria postos na corrida dos endinheirados, criaria novas “empresaX” e tomaria muito dinheiro do BNDES, mas culturalmente já vivia o seu ápice.
Uma curiosidade que não consta do perfil: eu soube do casamento de Eliezer Batista antes do seu próprio filho. À mesa do seu restaurante, Eike contou a novidade. Para seu espanto, eu lhe disse que havia tomado conhecimento dias antes dele. Ocultei a fonte, que agora posso revelar: o ex-governador Rafael de Almeida Magalhães, conselheiro da holding X, que fora testemunha do matrimônio do seu amigo Eliezer em cartório. Figura generosa e ótimo papo, Rafael morreria em 2011.
Outra confidência, ausente da reportagem de 2009: no Mr. Lam, Eike me apresentou à sua superadega fabricada pela Porsche com garrafas magnum das safras mais nobres do champagne francês Veuve Clicquot. Das poucas produzidas, ele arrematara uma unidade. Convidou-me a beber uma garrafa. Por escrúpulos, recusei, pois a camaradagem configuraria conflito de interesses jornalísticos. Nunca provarei uma viuvinha 1955…
O perfil de outubro de 2009 está reproduzido abaixo, sem mudanças em relação ao original, a não ser nos intertítulos. Aparecem como coadjuvantes personagens que viriam a se tornar importantes na história de Eike, como o banqueiro André Esteves. Ganham significado maior informações como a oposição de Eliezer à aventura no petróleo.
Logo no comecinho do texto, Eike, indiretamente, compara-se ao Super-Homem. A kriptonita estava para chegar.
* * *
O mineiro Eike Fuhrken Batista, 52, há tempos não se lembra dos seus sonhos. No último que a memória guardou, ele voava. “Sozinho?”, pergunta o interlocutor. “Sozinho! O Super-Homem não voa?” Ele não esqueceu os sonhos que o embalavam aos 16 anos.
Na escola da Alemanha, onde morava com a família, descobria nos livros a saga de Francisco Pizarro, o espanhol que saqueou o ouro dos incas na América do Sul do século 16. “Aquilo me fascinava, a história de salas cheias de barras de ouro”, conta. “Eu me transferia para o ambiente e parecia que segurava aquele negócio.”
Quando uma cartomante carioca sugeriu-lhe no crepúsculo do século 20 que acorresse a Cusco, a capital do Império Inca, Eike (pronuncia-se “Aique”) voou até o Peru. Em obediência às instruções, deitou-se de barriga para cima em um campo de futebol e mirou o céu por cinco minutos.
“Ela disse que iria reordenar o cosmos, a linha da vida seria reajustada.”
Funcionou?
“Acho que sim, está tudo bem.”
Ainda em Cusco, um guia apresentou-o a uma índia bruxa. Ela pediu que Eike comprasse um saquinho de folhas de coca. A feiticeira soprou-as e pontificou sobre o pai do visitante, saúde e outros assuntos. “Foi interessante”, recorda Eike, no restaurante chinês Mr. Lam, estabelecimento no Jardim Botânico, zona sul do Rio, que ele fundou e no qual investiu R$ 8 milhões.
Abaixo da edificação, mandou cravar uma barra de cobre. A providência destina-se a espantar más energias, aplicando o feng shui. O conhecimento chinês ensina que a disposição de objetos influi no cotidiano das pessoas. No seu escritório, em frente à praia do Flamengo, ele se senta voltado para a porta. “Você apara as energias [ruins] de quem vem de fora.”
Desses desencontros, não guarda rancor de ninguém, assegura. A astrologia contribui para entendê-lo, indica Eike, nascido em 3 de novembro: “Escorpião é muito amigo, leal com quem é leal com ele”.
“O lado vingativo, típico do escorpião, consegui dominar com a idade. Depois dos 30, quem rege mais você é o signo ascendente.” O dele é capricórnio. Porém, permaneceram, afirma, dons escorpianos de “tenacidade e perseverança”.
Ele lapida a sorte com o número 63, rebento do acaso. Em uma competição de lanchas, buscou o 3 e o 33, já ocupados. Sobrou o 63, com o qual definiria até os centavos nos lances de sua empresa OGX em leilões de blocos para exploração de petróleo. Consagrou-se campeão mundial em categoria da motonáutica. Alcançou no mar a velocidade de 270 km/h.
Número 1
Nesse ritmo, tornou-se o brasileiro mais rico e o número 61 do planeta, conforme ranking da revista “Forbes” divulgado em março. Seu patrimônio atingia US$ 7,5 bilhões.
É tanto dinheiro que, se ele se sentasse na gangorra diante do capo das comunicações italiano, Silvio Berlusconi, cada um pesando quanto vale, a balança penderia para Eike _o primeiro-ministro e sua família detinham US$ 6,5 bilhões.
Os cifrões de Eike dariam para bancar sozinho o Bolsa Família neste ano. Dos 60 mais abastados que ele, só 11 são mais jovens. Bill Gates, 53, lidera a corrida, com US$ 40 bi.
A contabilidade da “Forbes” se fundamentou em empresas de capital aberto. Na Bovespa, Eike controla quatro delas, sob as asas da holding EBX _como todas suas companhias, o nome se encerra com um xis, emblema destinado a augurar a multiplicação de riqueza.
O logotipo é um sol, símbolo inca. A mesma imagem, moldada em ouro, Eike ostentava no pescoço no primeiro dos dois encontros com a “Folha”, em entrevista de 4 horas e 20 minutos no seu restaurante.
Lá, ele contou a história do primeiro milhão de dólares, amealhado com compra e venda de ouro do Pará; do primeiro bilhão, após oito minas de ouro no Brasil e no exterior.
Projetou: com suas ações fortalecidas e somando bens ausentes da Bolsa, a fortuna já ultrapassa os US$ 20 bilhões, rumo a coroá-lo o capitalista mais fornido do mundo _a considerar o valor de anteontem do seu quinhão nas companhias de capital aberto (de 54% a 76% de cada uma), Eike detém o equivalente a US$ 24 bilhões em ações na Bovespa.
Na conversa, ele indagou ao repórter: “O que te surpreendeu nesta entrevista? Você me conhecia lendo coisas. O que não bate ou bate?”.
Insistiu: “Deixa eu entrevistar você: o que as pessoas falam de mim por aí? O que eu sou?”
Nos quatro dias seguintes, adquiriu a concessão da Marina da Glória, cartão-postal da cidade; a candidatura do Rio à Olimpíada de 2016 triunfou, após campanha cujo principal patrocinador individual foi Eike, com R$ 23 milhões; e sua companhia mais promissora descobriu indícios de petróleo na bacia de Santos.
Só nessa operação, em sete horas de pregão da Bovespa, o controlador da OGX enriqueceu _em papéis_ cerca de US$ 1,5 bilhão, soma superior às vendas da Renner ou da Goodyear no Brasil em 2008.
Em nome do pai
Eliezer Batista da Silva presidiu a Companhia Vale do Rio Doce no governo Jânio Quadros, de 1961; foi ministro de Minas e Energia em 1962 e 63, na administração João Goulart; no golpe de Estado de 64, afastaram-no do comando da Vale; retomou a chefia da mineradora a partir de 79, no mandato do general João Baptista Figueiredo; em 92, Fernando Collor nomeou-o para a Secretaria de Assuntos Estratégicos.
Aos 85 anos, permanece um azougue intelectual à altura da legenda de estrategista da logística e do desenvolvimento.
Eliezer foi um pai ausente. Inquirido sobre a asma de Eike, o segundo dos sete filhos que teve com a alemã Jutta, minimiza: “Não era muito forte”.
“Eu sofria de asma, de cair da cama e não respirar”, contradiz Eike, ignorando o relato paterno. Ele se curou da doença graças a quem mais o influenciou, a mãe. Na Europa, Jutta obrigava-o a nadar mesmo em dias gélidos.
“Quando eles eram menores, eu vivia viajando, não tinha quase contato”, lamenta Eliezer (a sílaba tônica é a última). Só para o Japão, deslocou-se em 178 missões pela Vale.
“Eike herdou da mãe toda a disciplina germânica, a persistência”, diagnostica Eliezer. “Ela pegava uma criança de três anos, botava para esquiar, jogava colina abaixo. Que mãe brasileira faz uma coisa daquela? Mas se cria gente dura. Modifica o caráter da pessoa.” “Minha mulher foi criada na Juventude Nazista”, confidencia o viúvo de Jutta, morta em 2000.
No Rio, aonde chegou depois de nascer em Governador Valadares (MG) e morar por pouco tempo em Vitória (ES), Eike estudou em colégio germânico. Na mudança para a Europa aos 12 anos, o alemão predominou como idioma doméstico, inclusive de Eliezer.
Quando os pais retornaram para o Brasil, o graduando de engenharia Eike prosseguiu entre a cidade alemã Aachen e a capital belga, Bruxelas.
Com mesada curta _ele se define como classe média alta na juventude_, oferecia seguros residenciais de porta em porta. Desenvolveu um talento de vendedor, o de ouvir: além de alardear as virtudes dos seus produtos, assentia que senhoras segredassem alegrias e tristezas. Bombou.
Em 1979, de volta ao Brasil, embrenhou-se na Amazônia em compra e venda de ouro. Montou mina no meio da selva. Diz que recebeu um tiro pelas costas dado por um garimpeiro de quem cobrava dívida. Socorreram-no em um hospital, e a herança foi uma cicatriz pequena. Tornou-se executivo e mais tarde controlador da mineradora canadense TVX Gold.
Foram duas décadas no ouro, concentrado no exterior. Eike recapitula que, ao sair do Canadá em 2000, seu primeiro US$ 1 bilhão tilintou. Ele se despediu do ouro e redescobriu o Brasil.
Aqui, disseminou-se no mercado um rumor que a “Folha” ouviu de concorrentes de Eike abrigados no anonimato: na década de 1980 e na expansão do grupo X, o pai o teria favorecido. Antes, com informações sigilosas sobre o mapa mineral. Hoje, como integrante dos conselhos das empresas.
Inexiste comprovação da primeira suspeita. Em relação à influência atual de Eliezer, quanto mais se aproxima do coração do negócio, evidencia-se que Eike dá as cartas.
Executivos revelam que, na origem, Eliezer opôs-se à formação da petrolífera OGX e da recém-lançada OSX, que terá estaleiro em Santa Catarina.
Eike se julga injustiçado: “Esse negócio que falam que meu pai me mostrou o mapa da mina. Que o meu pai é aquela pessoa brilhante, um oráculo do saber, e eu sou… É difícil”.
Nada que o impeça de pensar que Eliezer “fez coisas extraordinárias pelo Brasil” e de elegê-lo como ídolo.
O pai, homem de Estado, diz que o filho é vocacionado para a empresa e sempre quis superá-lo. E se sente feliz em saber que Eike conseguiu.
Vale, um sonho
Na privatização da Vale, em 1997, Eike ambicionou um naco. O pai demoveu-o, registra o filho, alegando que pegaria mal por ser parente de quem é.
Agora, o acionista majoritário da mineradora MMX sonha controlar a Vale, a gigante de mais de R$ 200 bilhões.
Um conselheiro de Eike sustenta que o projeto empresarial é deter o timão da Vale. Participação partilhada não faria sentido, pois não promoveria a sinergia com seus negócios de mineração, logística (portos), energia e petróleo.
Medindo as palavras, Eike concede: “Se Steve Jobs falecer, eu vendo as minhas ações da Apple. Há empresas, negócios em que são poucos os criadores da riqueza”.
Traduzindo: uma fatia da Vale, mesmo que menos de 10%, só faria sentido se ele pudesse fermentar o bolo inteiro.
Enfim, explicita: “Só interessa se for em posição de poder direcionar a criação de riqueza. Você tem que poder decidir como será tocada a companhia”.
Frustrou-se a primeira ofensiva, que a “Folha” revelou, pela parte do Bradesco. E aumentou o atrito com o presidente da Vale, Roger Agnelli, indicado pelo banco.
Ao evocar sua incursão pelo ouro no Amapá nos anos 1980, Eike disse que o Bradesco financiou parte da operação. “O curioso é que o banqueiro que ajudou a gente a abrir o capital… adivinha quem era?”. Seria, na verdade, executivo: Agnelli. Rindo animadamente, Eike concluiu, em inglês: “Jesus Christ!”. Vale e Agnelli não quiseram comentar.
André Esteves
Na EBX, desconfiou-se de que o informante sobre as tratativas com o Bradesco a respeito da Vale tenha sido o banqueiro André Esteves. Eike mostrou ao repórter um torpedo que acabara de receber do dono do BTG Pactual.
O banqueiro escreveu: há “inveja dos outros”; “missões impossíveis são certos companheiros de viagem”; “o convívio com pessoas como você alimentam minha vontade de fazer”; “te admiro muito, cara”.
Procurado, Esteves não se pronunciou acerca da mensagem. “Brigar para quê?”, pondera Eike. “André é um cara com cabeça diferenciada, fora da curva. Talvez tenha que medir a ambição um pouquinho.”
Outra hipótese de ingresso na Vale é assumir a participação de fundos de pensão de estatais. Irritado com demissões na mineradora, o presidente Lula dera sinal verde a Eike para abordar o Bradesco. Foi no governo petista, notadamente de 2006 a 2008, quando se lançou na Bolsa, que Eike prolificou seus reais.
Em 2006, doou como pessoa física R$ 4,38 milhões para candidatos apoiadores do governo, incluindo R$ 1 milhão para o próprio Lula e a mesma quantia para Roseana Sarney. O PSDB levou R$ 1 milhão.
Eike jura que sufragou Lula em 2002 e 2006. “Votei numa posição de achar que a gente tinha que exorcizar a esquerda. Estava na hora de chamar a esquerda e ver no que dava”, conta.
No choque com o governo Evo Morales, que em 2006 barrou a construção de uma siderúrgica na Bolívia, Eike contratou _ele diz_ como consultor o ex-ministro José Dirceu. Em Nova York, no mês passado, descobriu nova semelhança com Lula, além do que considera ser uma identidade marcante sua, o nacionalismo: ambos são de escorpião.
Investiu R$ 1 milhão como pessoa física, sem recurso a renúncia fiscal, no filme “Lula, o Filho do Brasil”.
Hábil como o pai, que conviveu com governantes diversos, elogia Dilma Rousseff, José Serra e Aécio Neves.
Aplaude a política do Planalto para o pré-sal. Ressalta que quase todos os seus investimentos se restringem ao país _no entanto vendeu a maior parte da mineradora MMX em 2008 para a Anglo American. Marqueteia: “Com a autopista que o Fernando Henrique e o Lula deixaram para a gente correr, deixa meu Porsche andar. Faremos bonito”.
Estacionado na sala de casa, ele tem uma McLaren esportiva, motor Mercedes que acelera a 334 km/h e com a qual passeia à noite. Mora no Jardim Botânico, na mesma rua da ex-mulher, Luma de Oliveira, e dos filhos adolescentes deles, Thor e Olin. Dedica aos dois atenção e carinho intensos.
‘Marido da Luma’
Conhecido por décadas como “o filho de Eliezer Batista”, virou “o marido da Luma” ao se casar com a modelo em 1991.
Unido na Igreja à socialite Patrícia Leal, abandonou-a dias antes da festa de casamento para ficar com Luma, que conhecera havia pouco. O Vaticano anulou o matrimônio.
Na Sapucaí, Luma desfilou de coleira com o nome de Eike. Para evitar que ela voltasse a posar nua, o marido dispôs-se a cobrir o cachê da “Playboy”.
Diante da negativa, passou a abastecê-la com chocolates, a fim de engordá-la, diminuir a autoestima e mudar a decisão. Novas fotos só foram feitas após a separação.
Ao se divorciar, em 2004, transformou-se na persona Eike Batista, o magnata. “Isso foi consciente. Percebi que, com os meus filhos, eu tinha que ter uma identidade. Que negócio é esse? O Thor dizer que o pai é o ex-marido da Luma de Oliveira? Aí tocou a vaidade.”
Eike se dá bem com a ex e namora a advogada Flávia Sampaio, 23 anos mais jovem. Gostaria de ser pai novamente. Faz tratamento a laser contra manchas no rosto, submeteu-se a plástica para retirar gordura sob os olhos e se prepara para o quarto implante capilar.
Em 2007, Eliezer Batista disse à “Folha” que a união de seu filho com Luma fora um erro. Em voto de confiança no amor, o pai de Eike voltou a se casar discretamente semanas atrás, em cartório do Rio.
O filho só tomou conhecimento dias depois. Recebeu a novidade com bom humor.
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Grupo prevê ‘Cidade X’
O grupo EBX prevê nova concentração urbana, com 300 mil pessoas, a “Cidade X”, em torno do porto do Açu. A LLX constrói a obra em São João da Barra (RJ). O aporte, somado ao em outro porto no RJ, é de US$ 2,34 bi. Projeta-se um polo industrial no lugar, e Eike pode estrear no setor imobiliário.
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R$ 9 milhões para filmes
Eike Batista não vai ao cinema há mais de um ano. Mas isso não o impediu de investir R$ 9 milhões nas biografias do pai, Eliezer, de Lula, de Tancredo e do futebolista Heleno de Freitas. E em produções de Cacá Diegues (“Cinco Vezes Favela”) e Arnaldo Jabor (“A Suprema Felicidade”).
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Acertos bilionários ocultam um vasto número de fracassos
Assim como é ilusória qualquer veleidade mística do escritor Paulo Coelho no uso de roupas pretas _viajante frequente, ele evita que a sujeira apareça_, as camisetas da mesma cor habituais em Eike Batista têm propósito pragmático: o médico indicou-as para, sob a camisa, protegê-lo de gripes.
Ele cumpriu a ordem, e a saúde melhorou. Essa disciplina, disseminada na atividade empresarial, contrasta com a imagem de aventureiro que céticos no seu futuro lhe atribuem. Um deles, sob a condição de se manter anônimo, provoca: você entregaria o seu FGTS para um negócio do Eike?
A sucessão de acertos que alçou o bilionário ao topo dos ricos brasileiros ofusca vasto inventário de fracassos: empresas de jipes, cosméticos, correio e outras.
Deu-se bem no atacado, as grandes apostas, e mal no varejo. A depender do ângulo, a fotografia do grupo X sai em branco ou preto. Levantamento da Economática mostra que em geral as ações de suas empresas se valorizaram, desde o lançamento, mais que o Ibovespa.
Na contramão, a consultoria identificou três empresas de Eike entre as dez com maior Ebitda negativo entre 254 da Bolsa. O palavrão Ebitda é a sigla inglesa para lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação.
O resultado decorre do fato de que a receita das empresas é pequena ou nula. A OGX valia R$ 49,8 bilhões no dia 2, mas ainda não produziu uma gota de óleo. As ações se tonificam porque há expectativa de que se encontre petróleo _na bacia de Campos, confirmou-se.
A despeito do glamour da fortuna, trata-se de investimento de risco agudo. Em novembro, a OGX valia apenas o que tinha em caixa. O passe de Eike não representava um centavo. Cada ação chegou a custar R$ 254, mas a empresa manteve os investimentos. Anteontem, fechou a R$ 1.690.
Eis o modelo de negócios: começar do zero, a partir de uma ideia; investir do próprio bolso na largada, recrutando especialistas de empresas vitoriosas; captar dinheiro no mercado, especialmente na Bolsa; desenvolver o projeto até a produção ou vendê-lo antes.
É comum ouvir de concorrentes nos segmentos de mineração, petróleo e gás _seus antagonistas_ que ele vende vento ou sonhos.
No ano passado, contudo, a mineradora Anglo American topou pagar US$ 5,5 bilhões pela fração majoritária da MMX, bom negócio para os acionistas, entre os quais Eike é o maior.
Seus negócios se concentram em recursos minerais e infraestrutura. A riqueza se multiplicou em um cenário favorável: alta liquidez mundial (dinheiro sobrando); disparada das cotações dos metais; e mercado de capitais mais forte.
Em caixa, o grupo informa ter US$ 9 bilhões. De 2009 a 2012, o investimento previsto é de US$ 10,2 bilhões.
Para a OGX, Eike buscou um ex-presidente da Petrobras, Francisco Gros, hoje afastado por doença. Da estatal, levou 60 técnicos e executivos.
Os bônus por desempenho, pagos em ações do próprio Eike, bateram, para uma pessoa, em mais de US$ 80 milhões na venda de parte da MMX.
Alguns executivos, cansados, têm deixado o grupo. De acordo com Eike, seus resultados corresponderam ao bônus de US$ 40 milhões nos últimos anos _para cada um. “Já engordei muito gato, muito Garfield.”
São proverbiais suas exigências. Ele preconiza um “corridor management”, a gestão com cobranças até no corredor. Telefona de madrugada. “A fila aqui anda de Porsche.”
Antecipa que investirá em tecnologia da informação. Critica o que julga aversão do empresário brasileiro a risco e o encanto por negócios com garantia do Estado.
Para o Ministério Público Federal, Eike Batista está longe de encarnar um empresário exemplar. Há acusações de crime ambiental e corrupção.
No Rio, a Procuradoria da República move processo devido ao que seria devastação da natureza nas obras do porto do Açu, no norte fluminense.
No ano passado, a Polícia Federal fez operação de busca e apreensão na casa do empresário. Motivo: no Amapá, ele foi apontado pela PF como “mentor intelectual” de fraude na licitação de ferrovia de complexo minerador.
Em Mato Grosso do Sul, o Ibama aplicou multa de R$ 29,4 milhões por alegado emprego, em siderúrgica, de carvão vegetal fruto de desmatamento irregular. Logo, Eike doou R$ 11,4 milhões para preservação do Pantanal, Lençóis Maranhenses e Fernando de Noronha.
Ele nega as acusações, que aguardam decisão judicial definitiva. Diplomático, enaltece o papel do Ministério Público.
No Rio, onde depende de licenças do Estado para tocar dois portos em construção, destina R$ 28 milhões para a despoluição da lagoa Rodrigo de Freitas, em torno da qual costuma correr acompanhado por seguranças.
Emprestou avião para o governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes viajarem a Copenhague para a escolha de 2016. A concessão da Marina da Glória, aquisição de Eike, é emitida pela Prefeitura do Rio.
Negócios seus como o navio de passeio Pink Fleet estão longe de se pagar. “Adoro o conceito americano de você ter que devolver para a sociedade.”
Quando cria um projeto, diz que é um “MPI – Mata Paulista de Inveja”. Exemplifica com o Mr. Lam. “Como a cultura dos paulistas é sempre fazer as coisas muito benfeitas, eu quis começar a fazer coisas no Rio com o padrão paulista.”
Na semana passada, suas ações se valorizaram na Bolsa de Valores. Do país onde há 40 milhões de trabalhadores vivendo com até um salário mínimo mensal, periga sair o homem mais rico do mundo.