Blog do Mario Magalhaes

Pusilânime, governo do Brasil é ingrato com Snowden

Mário Magalhães

O ministro Antonio Patriota quer Edward Snowden longe do Brasil – Foto Leandro Moraes/UOL

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A retórica altiva do governo brasileiro, face à arapongagem eletrônica promovida pelos Estados Unidos, constitui diversionismo destinado a minimizar a decisão de não conceder asilo político a Edward Snowden.

O Planalto denuncia eventual “violação de soberania e de direitos humanos”, nas palavras da presidente Dilma Rousseff, e incidente “gravíssimo”, conforme o ministro Gilberto Carvalho. Promete incomodar o Departamento de Estado em organismos internacionais, buscando restringir a espionagem high-tech.

Em meio ao léxico próprio dos diplomatas, que costumam “externar preocupação”, o chanceler Antonio Patriota reiterou ontem: “Nós não responderemos à solicitação de asilo. Não será concedido”. Isto é, já respondeu, negativamente.

Ninguém sabe com certeza, mas é possível que o ex-funcionário do esquema de monitoramento ilegal de comunicações mundo afora esteja detido em um aeroporto de Moscou, à espera de guarida em país que o acolha.

Há numerosos aspectos ruins na recusa do Itamaraty.

Primeiro, pragmático. Além dos slides sobre o sistema de interceptação organizado pela National Security Agency e pela Central Intelligence Agency, veiculados por “O Globo” em furo de reportagem, sabe-se muito pouco. As imagens indicam atividade intensa no Brasil, à revelia das autoridades locais. Receber o norte-americano Edward Snowden, que revelou a operação, seria importante para esclarecer fatos e mistérios.

Segundo, diplomático. Se, está evidente, Washington bisbilhota vidas alheias em Estado independente, como o Brasil, é preciso responder. Um dos princípios da diplomacia é o da reciprocidade, como tem consciência qualquer calouro do Instituto Rio Branco. Contudo, seria insanidade se aventurar em um contra-ataque tupiniquim de computadores e espiões. Bastaria, serenamente, receber o cidadão que prestou serviços à democracia divulgando o que não queriam que fosse divulgado.

Terceiro, moral. Snowden ajudou ou prejudicou o Brasil? Se prejudicou, colocando a boca no trombone, que Dilma e Patriota digam. Se ajudou, merece ser ajudado, e não vítima de ingratidão.

A despeito de todo o ritual de indignação, o governo de Brasília parece mais preocupado com a viagem iminente de Dilma aos Estados Unidos. Abrigar Snowden não seria romper com os EUA, mas afirmar a determinação do país em proteger sua soberania, dar-se ao respeito.

Diante da espionagem abusiva, entregar Edward Snowden à própria sorte equivale a reeditar a vassalagem de governos passados frente à Casa Branca, por mais virulenta que seja a retórica do Planalto.