Cabral, Alckmin e demais governadores são responsáveis por impedir um novo Edson Luis
Mário Magalhães
( Para seguir o blog no Twitter: @mariomagalhaes_ )
No começo da noite de 28 de março de 1968, a tropa de choque tentou conter no Rio uma passeata que saía do restaurante público do Calabouço. A PM foi rechaçada com pedras e revidou a bala. Um policial militar assassinou o estudante paraense Edson Luis de Lima Souto. O garoto tinha 18 anos, era pobre e seu rosto evocava o de Garrincha quando jovem. Semanas mais tarde, na manifestação da “sexta-feira sangrenta”, três mortos se somaram a Edson Luis. Uma tragédia.
Sim, eu sei que são diferentes os cenários de hoje e de 45 anos atrás. Antes, havia uma ditadura sangrenta, instaurada em 1964 com o golpe de Estado que derrubou o presidente constitucional João Goulart. Agora, as PMs estão subordinadas a governadores legítimos, eleitos por sufrágio universal.
Mas há algumas semelhanças: como no passado, os governantes tentam desmoralizar os protestos contra os aumentos das passagens e outras reivindicações, acusando-os de meras agitações fabricadas por agremiações oposicionistas. E desmerecem os manifestantes como “baderneiros”.
Na ditadura, os agentes públicos disparavam projéteis de chumbo, depois trocado por borracha, que também mata. Na essência, as bombas de gás lacrimogêneo permanecem as mesmas. O “efeito moral” é um eufemismo sádico. Os cassetetes continuam doendo igual.
Hoje como anteontem, a violência de uma minúscula fração dos participantes dos atos não descaracteriza o caráter pacífico das demonstrações.
Na quinta-feira, a Polícia Militar do governador Geraldo Alckmin foi quem atacou os manifestantes em São Paulo, detonando a conflagração, como testemunhou o jornalista Elio Gaspari. Consagrou-se a polícia baderneira.
No domingo, contra manifestantes desarmados e em paz, a PM do governador Sergio Cabral castigou os jovens nas cercanias do Maracanã.
Alckmin é médico, portanto pronunciou juramento prometendo salvar vidas.
Cabral foi militante comunista, no tempo em que ser comunista equivalia a correr de meganha.
As PMs de Rio, São Paulo e outros Estados fizeram feridos nos últimos dias. Inclusive jornalistas. Se jornalista, de fato, não pode apanhar, qualquer manifestante também não.
O governador paulista alegou que os policiais acompanharam a manifestação para proteger os manifestantes. Atingiu o apogeu do farisaísmo.
O governador fluminense afirmou ter identificado “ar político” nas ruas. Evidente, pois ares religiosos é que não haveria.
Uma imagem mostrou um policial em São Paulo quebrando o vidro de um camburão. Queria culpar os “vândalos”?
Igualmente estranho, aqui no Rio, foi a facilidade com que alguns vândalos (sem aspas) picharam o histórico Palácio Tiradentes. Por que não havia PMs por ali?
E não venham com a conversa de direito de ir e vir, porque na sexta-feira produtores rurais de vários Estados interromperam o tráfego nas estradas, gerando quilômetros de retenção. Não se soube de um só agente público reprimindo o ato contra a demarcação de terras indígenas.
Aí, sim, exacerba-se o critério político do aparato de segurança.
Com o clima tão quente, prefeitos como Eduardo Paes e Fernando Haddad já deveriam ter suspenso os reajustes das tarifas de ônibus, tal o perigo de que um massacre policial cause mais vítimas.
As PMs, contudo, submetem-se, no alto da hierarquia, aos governadores. Cabe a eles proibir o emprego de instrumentos que possam produzir ferimentos graves. Mais do que isso, devem determinar que os protestos pacíficos, um direito democrático, não sejam reprimidos. Nem que a PM aceite provocações e, muito menos, provoque os estudantes.
Há estúpidos que não se importariam com a perda de uma vida, para alardear “autoridade”.
E não duvido de que existam fanáticos à espera de um mártir.
Eventuais tragédias daqui a pouco (toc-toc-toc), por todo o país, seriam de responsabilidade dos governadores.