Nos 50 anos do golpe, só antigos opositores da ditadura vão disputar eleição presidencial
Mário Magalhães
( Para seguir o blog no Twitter: mariomagalhaes_ )
No ano em que o golpe de Estado de 1964 completará meio século, as eleições presidenciais do ano que vem terão monopólio de antigos opositores da ditadura que vigorou por 21 anos.
Todos os candidatos mais badalados até agora combateram, com maior ou menor intensidade, o regime instaurado com a derrubada do governo constitucional do presidente João Goulart. São eles:
Dilma Rousseff (PT): nos tempos da ditadura, a presidente que deve buscar a reeleição militou na Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop), nos Comandos de Libertação Nacional (Colina, agrupamento armado), na Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares (VAR-Palmares) e no PDT. Foi presa política e torturada.
Lula (PT) – Alternativa do Partido dos Trabalhadores para 2014, o ex-presidente se tornou figura pública nacional como líder metalúrgico, a partir das greves operárias do ABC, no final da década de 1970. Foi preso devido à militância sindical e política. Fundou o PT.
Marina Silva (Rede Sustentabilidade) – Caso consiga tornar viáveis seu projeto de partido e sua candidatura, a ex-ministra concorrerá pela segunda vez ao Planalto. Durante o regime encerrado em 1985, ela militou no Partido Revolucionário Comunista (PRC, mesma sigla de José Genoíno e Tarso Genro) e no PT.
Aécio Neves (PSDB) – O então jovem Aécio foi fiel acompanhante do avô oposicionista, Tancredo Neves. Recentemente, o senador tucano chamou a ditadura de “Revolução”, como fazem veteranos partidários dos governos militares, mas voltou atrás.
Eduardo Campos (PSB) – É neto de Miguel Arraes, governador de Pernambuco cassado pelo golpe de 1964, preso e exilado. Como Aécio, combateu a ditadura ao lado do avô, que regressou ao Brasil com a anistia de 1979.
José Serra (PSDB ou MD) – O ex-governador de São Paulo é uma opção pouco provável a Aécio Neves no PSDB, mas pode trocar de agremiação pelo MD, novo partido do antigo comunista Roberto Freire. Quando ocorreu a deposição de Jango, Serra presidia a União Nacional dos Estudantes (UNE) e integrava a organização de esquerda Ação Popular. Partiu para o exílio, voltou em 1977 e se incorporou à oposição em atividade no país.
Luciana Genro (PSOL) – A ex-deputada federal começou a militância ainda na adolescência, na Convergência Socialista, corrente trotsquista do PT que mais tarde seria a semente do PSTU.
Chico Alencar (PSOL) – Outro nome do PSOL para o pleito de 2014. Professor de história no ensino fundamental e médio e membro das redes católicas de esquerda, Chico foi um opositor ativo da ditadura, concentrando a militância no movimento de associações de moradores, até ingressar no PT.
José Maria de Almeida (PSTU) – Se o habitual candidato do PSTU vier a disputar a Presidência novamente, será outro velho opositor no páreo. Metalúrgico e sindicalista no ABC, foi preso com Lula na virada da década de 1970 para a de 80. Era um dos dirigentes da Convergência Socialista, tendência que passou muitos anos no PT e mais tarde deu origem ao PSTU.
Não está descartado que algum candidato nanico em 2014 tenha sido adepto da ditadura ou que a evoque positivamente. Seria a exceção confirmando a regra.
O fenômeno de candidatos antiditadura vem se consolidando. Em 1985, José Sarney, que atravessara quase todo o período pós-1964 como governista, herdou o cargo de presidente com a morte do oposicionista Tancredo Neves, que vencera a eleição no Colégio Eleitoral. No primeiro pleito direto em quase três décadas, Fernando Collor, antigo partidário da ditadura, levou em 1989. Foi o ultimo presidente desse espectro político.
Seu vice, Itamar Franco, herdou a cadeira de presidente depois do impeachment de Collor em 1992. Itamar fora parlamentar do velho MDB. Em 1994 e 98, Fernando Henrique Cardoso, outro opositor da ditadura, venceu as eleições. Sobrevieram os triunfos de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002 e 2006, e mais tarde o de Dilma, em 2010.
O fenômeno permite algumas conclusões. Ao contrário do que alardeiam veteranos correligionários da ditadura, inexiste em segmentos amplos da sociedade brasileira sentimento nostálgico em relação àqueles tempos. Esse sentimento sobrevive em guetos. Caso contrário, haveria algum candidato disposto a capitalizar a “saudade” pela era de repressão política. Candidatos saudosos da ditadura tentam cargos parlamentares, e não majoritários, porque têm consciência de não ter chances de sucesso.
Lição principal: o balanço que os brasileiros fazem dos 21 anos de ditadura é negativo. A ditadura fez mal ao Brasil, como se lembram os mais velhos e descobrem os mais novos. As viúvas da ditadura são como torcedores de certos clubes de futebol, que fazem muito barulho, mas são poucos.